Estar na linha de frente é ato de amor
Doze de maio. Dia Internacional da Enfermagem. Em meio a uma pandemia, que conta com…
Doze de maio. Dia Internacional da Enfermagem. Em meio a uma pandemia, que conta com mais de 168 mil infectados e 11.519 mortos no Brasil (dados do Ministério da Saúde do dia 11/4), a data é marcada, principalmente, pelo medo. A técnica em enfermagem Maura Inês dos Santos esteve entre os profissionais do Hospital de Urgência de Goiânia (Hugo) contaminados pelo novo coronavírus (Covid-19). Após 18 dias afastada, ela retorna ao trabalho nesta quarta-feira (13), mas o temor continua.
Também técnica em enfermagem, Marlene Soares França não se infectou, mas chegou a se afastar por 25 dias por suspeita de contágio. No segmento de vacinação e testes rápidos, ele também se diz preocupada e com medo. Porém, sobre estar na linha de frente, ela garante ser um ato de amor: “A gente faz com muito amor, apesar da preocupação. Estamos na luta.”
Maura
“Mesmo já tendo passado por isso, o medo continua. Não temos a segurança que não vamos passar de novo”, revela a técnica em enfermagem, Maura dos Santos. Segundo ela, alguns colegas precisam, inclusive passar por psiquiatras, tamanho o abalo emocional. “A gente se sente culpada de ter se contaminado. A volta ao trabalho é difícil.”
Vale destacar que, conforme o Sindicato dos Servidores da Saúde de Goiás (Sindsaúde-GO), 160 profissionais da enfermagem do Hugo estavam afastados no dia 6 de maio. “Para a presidente do Sindsaúde, Flaviana Alves, o número de afastamentos é muito preocupante e evidencia a necessidade imediata de mais rigor quanto às condições de trabalho e no uso dos equipamentos de proteção individual (EPIs) e coletivos (EPCs)”, informa texto do site do Sindsaúde.
Problemas
Segundo Maura, a rotina na unidade de saúde teve uma melhora no último dia 23, quando houve reforço de equipamentos. Ela lembra que, antes, não havia EPIs corretos. Por isso, conta a técnica em enfermagem, os profissionais utilizam o mesmo conjunto de roupas por 12h e que o ideal seria a troca após 6h. “A lavanderia não fornece.”
Sobre a gravidade do problema, ela diz que a situação real é pior do que se fala. “O Hugo não está preparado. O que fez foi uma reserva técnica em uma ala do hospital. A UTI está lotada e hoje tem pacientes na enfermaria, entubados. E os acompanhantes entram e saem, e o vírus circula.”
Inclusive, de acordo com Maura, os técnicos têm cuidado de 15 a 20 pacientes, sendo a maioria em situação grave. O ideal, ela informa, seriam de dois a três, ou seis a oito, no caso de semicríticos. Perguntada do remanejamento de casos para o hospital de campanha, ela afirma que “se testou positivo no Hugo, fica no Hugo. Somente casos específicos vão para o HCamp”. Ela explica que aquela unidade já recebe pacientes de UPAs e outros lugares.
Marlene
Serviço essencial, os enfermeiros têm contato direto com pacientes infectados – além de não pararem os demais serviços, destinados a outras enfermidades. Apesar de atuar com testes rápidos e vacinação, a técnica em enfermagem Marlene Soares França não chegou a se contaminar. “Eu não me contaminei, mas cheguei a me afastar por 25 dias após uma crise de sinusite e suspeita. Fiquei isolada, mas o teste deu negativo”, informou ao ressaltar que a preocupação permanece.
Marlene, que atua na Unidade Ville de France (Estratégia e Saúde da Família) e em uma UTI neonatal, cita que no último sábado (9) participou de uma realização de inquérito sorológico em toda Goiânia. “Trabalhamos com os agentes de endemia. Foram sorteadas as residências, a fim de ver quem tinha anticorpos”, destaca a pesquisa por amostragem.
Linha de frente
Questionada sobre como é estar na linha de frente, Marlene não titubeia: “A gente faz com muito amor, apesar da preocupação. Estamos na luta.” A técnica afirma que a preocupação se amplia, porque a população afrouxou o isolamento nos últimos dias.
“E o mês de maio é seco e frio. Então, os casos devem aumentar”, expõe e recomenda: “Quem puder, fique em casa.” Ainda assim, Marlene se diz otimista. “Eu preciso ser. Às vezes ficamos angustiados. Já cheguei a sonhar com essa situação”, revela.
Sobre se sentir amparada, ela diz que pelo município, sim. Sobre o Estado, ela afirma que um conhecido testou positivo no Hospital Materno Infantil (HMI) e não foram disponibilizados testes para as pessoas próximas. A situação ocorreu perto do momento em que ela estava sob suspeita.
SES-GO
Por meio de nota, a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO) informou que, no cenário da pandemia de Covid-19, os profissionais da saúde, em específico, os enfermeiros, têm desempenhado um papel muito importante no cuidado do atendimento, na gerência da assistência e na luta pela vida. “O atendimento aos casos de Covid-19 pode provocar um efeito emocional que, por vezes, os fazem se sentir sobrecarregados, sob pressão, ansiosos, com medo, e até mesmo em pânico.” Sobre isso, a pasta afirma que tomou a iniciativa de “cuidar de quem cuida”, por meio do atendimento via telefone, na Central de Orientações (Cori).
“A Cori desenvolve atividades de apoio emocional específicas aos profissionais de saúde que sofrem as consequências por atuarem diretamente na prevenção, atendimento à população e assistência aos casos da Covid-19.” Inclusive, este apoio é previsto nos protocolos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Comitê Permanente Interagências para a Saúde Mental e Apoio em Situações de Emergência Humanitária (IAS), conforme a pasta. A secretaria cita, ainda, o programa “GGDP ao seu lado”, que oferece apoio psicossocial aos servidores da SES-GO, além de orientação para as chefias visando o manejo de suas equipes.
HMI
Sobre a denúncia de não fornecimento de testes aos profissionais que tiveram contato com um infectado, o Hospital Estadual Materno-Infantil Dr. Jurandir do Nascimento (HMI), informa “os colaboradores que tiveram contato com alguém que foi infectado são observados de perto para ver se vão desenvolver sintomas, visto que o HMI disponibiliza todos os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) de protocolos de segurança necessários, determinados pela OMS e pela Anvisa, que protegem os profissionais de infecção”.
Segundo a unidade, os colaboradores da unidade têm recebido todas as orientações no intuito de prevenir a Covid-19 e que todas as determinações legais estão sendo cumpridas. Além disso, reforça que os testes rápidos, disponibilizados pela SES-GO, só podem ser realizados mediante alguns critérios, como a realização a partir do oitavo dia do início dos sintomas de síndrome respiratória. “Cada caso é verificado de maneira bem detalhada. Se o colaborador tiver dentro da determinação, o hospital realiza o teste.”
Por fim, o HMI informa que os profissionais que apresentam sintomas gripais ou suspeitos de estarem infectados pela Covid-19 são afastados e acompanhados pelo Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (Sesmt) e Núcleo Epidemiológico da unidade.
Hugo
O Hugo também foi procurado para se manifestar sobre os relatos de sua servidora, mas até o fechamento da matéria não houve retorno. O espaço permanece aberto.