Em Goiás, expedição de medidas protetivas sobe 5% em 2018
O número de medidas protetivas expedidas subiu 5,65% em 2018, segundo o Tribunal de Justiça…
O número de medidas protetivas expedidas subiu 5,65% em 2018, segundo o Tribunal de Justiça do Estado (TJGO). No ano passado, foram concedidos 6.675 documentos contra 6.318 expedidas em 2017. Quantidade também é maior que o registrado em 2016, quando foram realizadas 6.138 medidas protetivas para mulheres vítimas de algum tipo de violência doméstica. Nos dois primeiros meses deste ano foram protocoladas 2.858 pedidos na Justiça.
Para a medida protetiva ser expedida, o juiz tem, por lei, até 48 horas para tomar a decisão. Porém, em alguns casos, a urgência impera e a celeridade diante o resultado ganha força. Em alguns municípios do estado a decisão é imediata. De acordo com o juiz da área da Mulher, Vitor Umbelino Soares Júnior, em Rio Verde, onde atua, o pedido para autorização de uma medida é realizada após envio, por parte da delegacia especializada no atendimento à mulher, ao sistema eletrônico do tribunal.
“Eu costume dizer que essas medidas salvam vidas. Quando temos o acesso ao pedido logo decidimos, no mesmo dia. Em Goiânia, eu tenho um breve conhecimento que não é nesse formato, mas que a agilidade na decisão é a mesma. A prioridade é absoluta e [os juízes] param o que estão fazendo para analisar o caso”, explica.
As medidas protetivas de urgência são uma forma de dar proteção à vítima durante o trâmite de julgamento do, até aqui, suposto agressor. Elas estão respaldadas pela Lei Maria da Penha, promulgada em 7 de agosto de 2006.
“Dentre algumas determinações judiciais estão a distância mínima da denunciante, afastamento do lar, proibição de entrar em contato com a vítima por qualquer meio de comunicação. Em determinados casos também ocorre a suspensão do porte de arma, suspensão de direito de ver os filhos e até mesmo a restituição de bens que o mesmo possa ter danificado”, conta.
Além disso, uma das vantagens é que, diferente o processo criminal, o pedido da medida protetiva não necessita do término das investigações da Polícia Civil tampouco pela denúncia ofertada pelo Ministério Público. Ela é um processo autônimo.
Aumento nos números
O magistrado conta que não há um fato exclusivo como determinante para o crescimento da expedição de medidas. Porém, sabe-se que o número de processos criminais aumentam no mesmo ritmo. Uma das hipóteses levantada pelo juiz é o fato das mulheres estarem adquirindo mais conhecimento sobre os seus direitos.
“Infelizmente ainda estamos em uma sociedade que privilegia o machismo, a cultura patriarcal e a ideia que o homem é o chefe da casa. Muitas mulheres ainda temem pelo fato de dependerem economicamente do marido e isso cria um ciclo de dependência emocional. Em contramão, muitas mulheres tomaram coragem com a veiculação na mídia. Essa violência acontecia há tempos, mas não era noticiada”, destaca.
Apesar disso, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 40% das mulheres não denunciam a violência que sofrem. Vitor explica que os crimes de injúria, calúnia, difamação e ameaça têm o prazo de seis meses para a representação de denúncia na delegacia. Para os crimes mais graves, como lesão corporal e a tentativa de feminicídio, não há um prazo final para se fazer a denúncia.
Em Goiás, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP), no ano passado foram registrados 26.059 casos de ameça, 607 de estupros, 1.783 ocorrências de estupros de vulnerável e 4.345 casos de lesão corporal. Com exceção do último, todos os outros crimes sofreram aumento em relação a 2017.
O juiz destaca que as investigações de violência podem ser iniciadas imediatamente, sem a formulação da denúncia por parte da vítima. Isso é possível graças a violência à mulher ser considerada uma ação civil pública incondicionada. Com isso, a delegacia tem autonomia para apurar assim que toma conhecimento dos fatos.
“Quebramos muito o paradigma de ‘em briga de marido e mulher não mete à colher’. Se alguém tem o conhecimento de algum tipo de violência deve denunciar. Às vezes nos deparamos com casos de mulheres que faltam com a verdade perante ao juiz, mas isso têm diminuído. Por isso que é muito importante o trabalho de psicólogos e uma equipe multidisciplinar para extrair informações mais importantes de modo que ela se sinta acolhida”, afirma.
Sensação de impunidade
Apesar das medidas, várias mulheres destacam que não se sentem mais protegidas com decisões tomadas no juizado. Vitor argumenta que muitas decisões devem analisar os dois lados. “Não podemos determinar medidas que que restrinja liberdade do outro. Não podemos avançar ao que a lei não permite. A decisão de prisão do suposto agressor é quando o caso é de extremíssima gravidade. Quando o conjunto probatório aponta um risco para a vítima”, aponta.
Em determinados casos, o juiz determina que o acusado utilize tornozeleira eletrônica e que a vítima receba o chamado “botão antipânico”. Esse botão avisa, com vibração e alertas sonoros, a mulher sobre a proximidade do agressor. “A central de monitoramento entra em contato e, caso ele não atenda ou não tenha uma justifica plausível, ele é detido em flagrante”, conta.
Vitor é categórico ao falar que os juízes estão tendo mais cuidado em colocar um suposto agressor em liberdade, quando os autos indicam um crime mais grave. Segundo ele, se há uma reincidência, principalmente com um desfecho mais grave, isso é “a falência do sistema jurídico”.
“Por isso é dever do juiz de analisar com cuidado e ter a clara percepção que aquele momento não é o mais adequado para ocorrer a liberação na audiência de custódia. Às vezes é necessário a prisão na fase inicial do processo até que a vítima seja ouvida, por exemplo”, explica.
Semana da Justiça Pela Paz em Casa
Para dar mais celeridade em audiências de casos que envolvem violência à mulher, o TJGO realiza um mutirão para que esses casos sejam julgados. Chamado de Semana da Justiça Pela Paz em Casa, o evento ocorre em todo o Estado e em outras unidades federativas do país.
Também atuando com um dos coordenadores da semana, Vitor destaca que o mutirão é realizado três vezes ao ano. Em março, visando o Dia Internacional da Mulher, em agosto, pelo aniversário da Lei Maria da Penha, e em novembro, pela luta contra a eliminação de violência contra à mulher.
“Serão analisados mais de cinco mil processos e realizaremos mais de mil audiência no Estado. Isso tudo é visando dar maior agilidade e até mesmo adiantar as fases de um processo penal. Isso também ajuda bastante na diminuição da sensação de impunidade”, ressalta.
Patrulha Maria da Penha
Para ajudar no cumprimento das medidas protetivas, a Polícia Militar (PM) conta com a Patrulha Maria da Penha. O projeto existe há quatro anos e está presente em 24 municípios goianos. Segundo a tenente-coronel Michella Rodrigues, o trabalho consta em visitas nas casas de vítimas para a realização de um trabalho preventivo.
“Vamos à casa da vítima e, se necessário, realizamos o acompanhamento até o trabalho da mesma. Muitas mulheres agradecem e até se encorajam a levar o processo até o final pois muitas têm medo de denunciar pelo fato do agressor estar perto”, destaca.
As visitas ocorrem esporadicamente, sem consentimento da vítima. O tempo de visita é determinado pelo vigor da medida protetiva. Segundo Michella, são realizadas 3 mil visitas por ano. O efetivo policial em Goiânia conta com 16 policiais. No total, 80 policiais fazem parte do programa no restante do Estado.
Incluído na Lei Maria da Penha no ano passado, o descumprimento da medida pedida ocasiona na prisão em flagrante do suposto agressor. Mesmo com a forte atuação, Michella destaca que 40% dos homens se tornam reincidentes nas agressões. A patrulha também registra ocorrências de violência contra à mulher e a mesma pode ser acionada pelo telefone: (062) 99930-9778.
Mulher Mais Segura
Em Goiânia, outra corporação que realiza esse trabalho é a Guarda Civil Metropolitana (GCM). O projeto, intitulado Mulher Mais Segura, existe há quatro meses e auxilia no deferimentos de medidas protetivas expedidas pelo 1° e 2° Juizado de Violência Doméstico e Familiar contra a Mulher.
Segundo a GCM Flávia Serqueira, durante esse tempo, foram 110 medidas protetivas sob responsabilidade do programas e 361 atendimentos/visitas realizados. Ela explica que o documento chega por email e, posteriormente, é realizado o primeiro contato com a vítima.
“Posteriormente, realizamos as visitas em horários esporádicos, confeccionamos um relatório e ele é anexado no processo criminal. É assim que o Tribunal sabe se está havendo ou não o cumprimento da medida”, destaca.
A quantidade de visitas é determinada pela gravidade do caso, mas adianta que varia de uma vez por semana e até diariamente. Atualmente, duas equipe por plantão que é formada por mulheres. Flávia destaca a importância do trabalho em levar uma forma de saída da mulher daquele ambiente violente e até mesmo a busca de respaldo multidisciplinar. Caso precise, a mulher pode entrar em contato pelo número 153.
“Sempre tem uma visão de repressão quando fala da CGM e o programa trabalha na prevenção. Por isso, realizamos palestras em escolas para divulgar a cultura de paz e o combate da violência doméstica. Acreditamos que tudo se inicia na infância para chegar à agressão no ambiente familiar. O programa também ajudou a quebrar paradigmas e tabus em diversas instituições e levado a acreditar mais sobre a valorização da mulher”, conta.