DISPUTA

Faculdade usa “fake news” para protelar formação antecipada de alunos de medicina

O Centro Universitário Alfredo Nasser (Unifan), de propriedade do deputado federal por Goiás, Prof. Alcides,…

O Centro Universitário Alfredo Nasser (Unifan), de propriedade do deputado federal por Goiás, Prof. Alcides, do PP, se vê em meio a um imbróglio jurídico após se tornar alvo de uma ação movida por um grupo de alunos de medicina do último período. Embasados num dispositivo federal, estudantes exigem a colação de grau antecipada para atuação no sistema de saúde contra a pandemia. A instituição, situada em Aparecida de Goiânia, é acusada de descumprir decisões judiciais e até de usar fake news para tentar contornar a situação.

A polêmica tem origem ainda em abril deste ano, quando o governo federal expediu a Medida Provisória (MP) 934/2020, mais tarde convertida na Lei nº 14.040, que autoriza as instituições de ensino a promoverem a formatura dos alunos de medicina dos últimos períodos, desde que cumpridos 75% da carga horária do internato.

Assim, um grupo de 11 alunos do 12º período, que pagam à Unifan o equivalente a R$ 7,5 mil de mensalidade, se reuniu com os gestores da graduação e obteve uma resposta negativa quanto à colação de grau antecipada. Foi então que, em julho, os alunos decidiram acionar a instituição na Justiça, assim como seu reitor, Prof. Alcides, exigindo o cumprimento da lei.

O Ministério Público Federal (MPF), através da procuradora Mariane Guimarães de Mello, chegou a se manifestar em favor dos estudantes, através de um parecer, alegando que “não se mostra razoável inferir que os impetrantes não estão aptos para o exercício da profissão em razão da pendência de somente 2 estágios rotativos (internatos)”. “Ângulo diverso, a antecipação da conclusão do curso de Medicina, ao que parece lógico, não resultará em prejuízos ao sistema de saúde ou em danos irreparáveis aos seus usuários”, defende o órgão.

No dia 25 de agosto, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região expediu decisão favorável aos já quase médicos. Todavia, a Unifan decidiu que não cumpriria a ordem judicial de antecipar a formatura.

Multa diária e desobediência judicial

Diante do descumprimento da ordem judicial, a advogada dos estudantes, Mariana Martins, conta que entrou com um recurso para a aplicação de multa contra o centro universitário, pedido esse acatado pela Justiça, que também, posteriormente, aumentou ou valor da punição monetária.

“A Unifan vem se negando deliberadamente a cumprir a decisão judicial e, por conta disso, ela está pagando multa. Começou com uma multa de mil reais, ela não cumpriu, o juiz aumentou a multa para 2 mil e eles continuam não cumprindo”, relatou Mariana.

Segundo a advogada, o cartório já certificou a instituição de que findou o prazo para a aceitação da decisão, mas “não houve qualquer manifestação deles”. A partir de agora, conforme a advogada, o reitor da faculdade, Prof. Alcides, pode, inclusive, responder criminalmente pelo descumprimento de uma ordem judicial.

“A última determinação do juiz é que se eles não cumprissem [a decisão], o Professor Alcides seria processado judicialmente por desobediência judicial. Além de ser uma faculdade, essa é uma postura que não se espera de uma instituição de ensino séria, também tem o reitor, que é um deputado federal que deveria estar preocupado com a saúde pública, mas não está. O interesse deles é unicamente econômico”, desabafou Mariana.

Uso de fake news 

No dia 30 de julho, antes da decisão judicial que determinou que Unifan autorizasse a formatura antecipada dos alunos de medicina, representantes do grupo discente se reuniram com o diretor acadêmico da Unifan, Professor Carlos Alberto Vicchiatti e com o vice-diretor da instituição, Professor José Carlos Barbosa.

No encontro, a faculdade reiterou a negativa diante do pedido dos estudantes e usou como argumento uma portaria que teria sido expedida pelo Ministério da Educação (MEC) que recomenda que concursos da área médica que “não devem admitir a inscrição para seus processos seletivos de candidatos que não tenham completado sua formação médica”. O problema, é que segundo o próprio MEC, em uma nota de desagravo, a tal portaria não existia.

Ata de reunião com alunos de medicina

Ata de reunião com alunos de medicinaNa nota de esclarecimento e desagravo expedida no dia 10 de julho, o ministério afirma que a Nota Técnica de nº 3/2020 “com supostas recomendações quanto aos processos seletivos dos Programas de Residência Médica (PRMs) face a candidatos formados por antecipação de colação de grau” é falsa. O órgão ainda repudiou, na nota, “a reprodução de documento fraudulento que visa levar a sociedade ao erro”.

De acordo com a advogada Mariana Martins, o episódio evidenciou a intenção da instituição de ignorar o cumprimento dos direitos dos estudantes. “Os alunos só começaram a perceber a malícia deles depois que nós passamos a orientá-los. Eles começaram a gravar pedir ata de reunião, porque até então era tudo feito de boca”, conta.

Negação de cargo

Mariana também revela a dificuldade que enfrentou para que os representantes da Unifan fossem intimados após a expedição da decisão judicial. Segundo a advogada, “pela lei, qualquer pessoa responsável da faculdade pode receber intimações”. Porém, segundo ela o diretor acadêmico da Unifan, Professor Carlos Vicchiatti, chegou a negar seu cargo para não ser intimado.

”Essa intimação que eu tentei falar com ele foi informando a faculdade a primeira vez da decisão judicial que tinha deferido o direito dos alunos. Os alunos me passaram o contato dele e ele negou que era o diretor acadêmico. Mas eu provei que na ata de uma reunião [com os alunos] ele assina como diretor acadêmico”, revela Mariana.

Conforme explica a advogada, desde então os representantes da Unifan, incluindo o Professor Alcides, ignoram as intimações da Justiça. “Desde então eles ignoram [as intimações]. Nem o Carlos, nem o Alcides e nem o Janderson, o advogado da faculdade, nos atendem ou respondem nossas mensagens. Inclusive, a oficial de Justiça falou que eles não leem as mensagens e nem os e-mails pra poder impedir que sejam feitas as intimações”, contou.

O que diz a faculdade

A reportagem do Mais Goiás entrou em contato com a Unifan e seus representantes na sexta-feira (2), e na segunda-feira (5). Por telefone, o departamento jurídico da instituição disse que não pode se manifestar enquanto não houver resposta por parte do juiz de um recurso interposto pela faculdade.

Já a assessoria de comunicação mencionou que os alunos seriam prejudicados caso colassem grau antecipadamente, uma vez que não concluíram o estágio em Pediatria e Ginecologia. Ambos os argumentos foram rebatidos pela defesa dos alunos, que alegou que os estudantes já cumpriram mais de 75% da grade, conforme proposto pelo MEC.

Além disso, conforme a advogada Mariana Martins, o recurso interposto pela instituição, Embargos de Declaração, “não possui efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso”.

Tanto a assessoria de comunicação quanto o departamento jurídico afirmaram que enviariam, na manhã desta terça-feira (6) uma nota com esclarecimentos de todos os pontos levantados pela reportagem. Entretanto, até o fechamento desta matéria, o material não havia foi enviado.

O Professor Alcides, reitor da Unifan, disse que não iria se manifestar. O espaço permanece aberto e esta matéria deve ser atualizada tão logo receba o posicionamento da faculdade.

Atualização: Após a publicação desta matéria, o departamento jurídico da Unifan enviou ao Mais Goiás uma nota em que esclarece pontos quanto ao caso em questão.

Conforme o texto, a faculdade “está aguardando decisão final do Tribunal Regional Federal para saber se este irá ou não modificar” a decisão já expedida pela Justiça. A nota menciona ainda o recurso Embargos de Declaração proposto pela instituição que, segundo o documento, aguarda a resposta do Judiciário para tomar alguma decisão.

Veja a nota na íntegra:

“Alguns discentes do Curso de Medicina impetraram Mandado de Segurança visando Colar Grau (formar-se) antecipadamente alegando que cumpriram a carga horária exigida pelo MEC, o juiz de primeiro grau negou os pedidos liminares dos discentes e requereu informações. Insatisfeitos, os discentes opuseram agravo de instrumento contra a decisão judicial, neste agravo em decisão monocrática o relator deferiu a liminar para que a Instituição de Ensino antecipasse a colação de grau dos impetrantes, mas colocou a seguinte ressalva: se a Escola, no indeferimento de antecipação, demonstrar sua inconveniência por relevantes motivos substanciais (prejuízo significativo para a formação do aluno, objetivamente demonstrado), sua decisão será mantida.

Desta feita, a UNIFAN opôs Embargos de Declaração com Pedido de Reconsideração, explicando porque a formação antecipada trará prejuízo acadêmico para os impetrantes, futuros médicos, que apesar de terem cumprido a carga horária mínima exigida, não cumpriram o plano de curso da Instituição, assim não concluíram a Prática Médica em Ginecologia-obstetrícia e Pediatria, que são grandes áreas do Internato, determinadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do MEC para o curso de Medicina; demonstrando ainda que os prejuízos serão para toda a sociedade, que terão médicos sem a devida formação. Somente a título de exemplo da importância do conteúdo que falta ser ministrado, citamos apenas duas atividades que estão no plano de ensino: 1. Realizar Atendimento ao pré-natal de alto risco; 2. Realizar Atendimento ambulatorial e acompanhamento cirúrgico em Cirurgia Ginecológica. Nos autos consta o plano de ensino completo.

Todavia os Embargos de Declaração foram opostos pela Instituição de Ensino em 28/08/2020, mas até o momento não foram analisados pelo Tribunal Regional Federal – TRF, a Instituição de Ensino já entrou em contato com a assessoria do desembargador do TRF pedindo urgência, mas até o momento não tivemos retorno.  Enquanto isso os discentes estão requerendo cumprimento da medida liminar ao juiz de primeiro grau, alegando que a Instituição esta descumprindo ordem judicial e pedindo aplicação de sanções, o que vem sendo deferido pelo juiz e agravado pela Instituição de Ensino, ou seja, também aguardando decisão do TRF.

Em redes sociais foi citado sobre uma ata de reunião contendo fake news, informamos que a citada ata não consta no processo, pois se tratou de equívoco, devendo ser desconsiderada, pois já foi invalidada, por isso não foi e nem será utilizada em nenhum processo.

Por fim, a Instituição de Ensino esta aguardando decisão final do Tribunal Regional Federal para saber se este irá ou não modificar a Liminar deferida, uma vez que cumprida a liminar, os discentes estarão aptos a exercer atividades médicas mesmo sem o conhecimento necessário, ou seja, será irreversível, e a UNIFAN não pode assumir esse encargo sozinha, pois como dito alhures, o desembargador deixou a ressalva de que pode mudar sua decisão; bem como porque o prejuízo não será apenas para os discentes mas para toda sociedade, pois estamos falando de médicos, que cuidará do nosso bem mais precioso, a VIDA.”