PENITÉNCIARIA

Familiares denunciam tortura de presos na cadeia de Inhumas

“Eu deixei ele a noite inteira aí e vim embora. Hoje cedo, na hora que…

“Eu deixei ele a noite inteira aí e vim embora. Hoje cedo, na hora que foram arrancar ele de lá, estava todo entrevado. Bom que agora ele aprende, e nunca mais pede para sair”. A mensagem que circulou em um grupo de WhatsApp junto com a foto de um detento caído no chão amordaçado, e com os braços algemados entre as pernas, segundo denúncias, teria sido repassada por um Vigilante Penitenciário Temporário (VPT), no grupo de whatsapp de servidores que trabalham na Unidade Prisional de Inhumas. Familiares de detentos afirmam que a ordem para amarrar igual porco, e isolar em uma cela qualquer preso que alegue estar passando mal no final de semana, foi dada pelo diretor da cadeia, Warley Toledo.

A foto que seria de um detento em situação desumana, o print com ordens para não levar nenhum preso para unidade de saúde no final de semana, e áudios comprometedores, supostamente enviados no grupo de whatsapp dos servidores da cadeia de Inhumas, foram encaminhados para a redação do Mais Goiás por parentes de presos, que, temendo represálias, não se identificaram.

Policiais foram ameaçados para não encaminhar detidos a unidades de saúde

Em uma das mensagens, uma pessoa que seria o diretor da unidade prisional dá ordens expressas para que nenhum detento que alegue estar passando mal durante os plantões do final de semana seja atendido.

“Preso não sai para UPA em final de semana. Se o preso insistir saiba que ele está considerando que o seu plantão é o mais mocorongo e relaxado. Se qualquer equipe tomar esse tipo de procedimento novamente, eu vou tomar providências para que isso sirva de exemplo pra todas as equipes. Se perceberem que o preso está simulando os sintomas retirem o preso e o deixem algemado pelos pés e mãos dentro do banheiro por um tempo e depois o retornem para a cela”, teria escrito o diretor, em um grupo do qual fazem parte, além dos policiais penais e VPTs, também um enfermeiro, que trabalha no plantão dos finais de semana.

Diretor se revoltou após enfermeiro de plantão prestar atendimento a um detendo epilético

A revolta de Warley Toledo, segundo os familiares dos detentos, teria sido provocada depois que um condenado por homicídio, que é epilético, e sempre apresenta problemas de saúde, foi socorrido e levado para a UPA pelo enfermeiro que estava de plantão. O fato teria ocorrido no início deste ano, mas, de acordo com as denúncias, a determinação continua sendo cumprida à risca.

No áudio, enviado no mesmo grupo, junto com a foto do detento algemado no chão, um VPT, que segundo denúncias é o braço direito do diretor, reclama que o mesmo detento deu trabalho de novo durante a noite de um determinado sábado, e que como ele havia pago para que um colega ficasse no seu plantão, um policial penal foi até sua casa para buscá-lo depois que o diretor ligou para a unidade, e perguntou por ele.

“Eu tinha pagado (sic) o Michael prá tirar pra mim, daí os caras ligam pro Warley. A ordem é pra amarrar igual porco, e se ele gritar, amordaçar a boca dele. Eu voltei pra essa cadeia possuído, ele dormiu a noite inteira desse jeito aí, com as mãos algemadas e os pés para trás”, relata a pessoa que de acordo com parentes de presos seria um VPT. Este mesmo detento, conforme as conversas printadas, já teria passado mal em outros finais de semana, mas, segundo o diretor, sempre inventava isso para tentar fugir.

Abusos teriam começado após restrições impostas pela pandemia

A ordem para que nenhum preso fosse socorrido caso passasse mal nos finais de semana, ainda conforme a denúncia encaminhada para a redação do Mais Goiás, teria sido dada no início da pandemia da Covid 19, em março do ano passado. Desde aquela época, também, presos estariam sendo oprimidos para não relatar nenhum tipo de abuso aos familiares e advogados.

Como as visitas de familiares foram canceladas desde então, detentos que porventura se encontravam com advogados, relatam os familiares, eram previamente orientados pelo diretor da cadeia e por outros agentes sobre o que falar, sob o risco de sofrerem penalidades internas. Os encontros entre os presos e advogados, ainda de acordo com a denúncia, eram sempre acompanhados de perto por Warley Toledo.

Os prints enviados para a redação não possuem data, mas, de acordo com as denúncias, a foto e o áudio teriam sido repassados em janeiro deste ano. “Só resolvemos denunciar porque a tortura ficou tão normal, e a certeza da impunidade é tão grande, que os servidores sequer se preocuparam em produzir as provas contra eles mesmos e espalhar em grupos de whatsapp”, relatou um dos denunciantes.

DGAP se pronuncia

Em nota, a Diretoria Geral de Administração Penitenciária (DGAP) informou que “medidas cautelares emitidas pela Comarca de Inhumas autorizaram  a busca e apreensão na residência dos envolvidos e na unidade prisional e permite a quebra de sigilo de dados eletrônicos e telefônicos dos servidores envolvidos na investigação”. Além disso, afirmou que fornecerá todas as informações solicitadas pelas autoridades policiais. O caso está sob investigação da Polícia Civil.