Fiel atacado em igreja mórmon permanece internado no Huapa; outros 3 já receberam alta
Apenas um dos quatro homens esfaqueados na manhã de domingo (2) dentro da Igreja Jesus…
Apenas um dos quatro homens esfaqueados na manhã de domingo (2) dentro da Igreja Jesus Cristo Dos Últimos Dias, em Aparecida de Goiânia, permanece hospitalizado. Alvo de vários golpes, Wilson Alves Batista, 40, passou por cirurgia e permanece em observação no Hospital Estadual de Urgências daquele município (Huapa). De acordo com o último boletim médico, emitido nesta manhã, o estado de saúde do fiel é bom, porém, não há previsão de alta.
Os outros três internados, cujos nomes não foram revelados, já foram liberados. Os quatro foram encaminhados à unidade pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. O responsável, confesso, do atentado – dominado pelos próprios religiosos no interior da capela – terminou preso em flagrante e continua detido no 1° Distrito Policial (DP) de Aparecida, onde aguarda audiência de custódia.
De acordo com o delegado plantonista destacado para iniciar as apurações no domingo, Vicente César Stabile, o caso deverá ser repassado, ainda nesta segunda-feira (3), ao 3° DP da cidade. As vítimas, que deixaram o local do crime feridas, ainda não foram ouvidas. “Como ele foi preso em flagrante e elas precisavam de atendimento, não havia necessidade de colher os depoimentos naquele instante. Enquanto isso, a audiência de custódia dele deverá ser na terça (4) ou na quarta (5)”.
Versões
O caso é considerado complexo e, até o momento, o detido apresentou duas versões. “Para nós, disse que queria ser batizado lá, já tinha ido algumas vezes, mesmo sem ter sido convidado. Como não recebeu atenção, ficou com ódio e foi pra lá com a intenção de matar todo mundo”.
Fiéis, porém, afirmaram à corporação que Uilker “viu que a religião não gostava de carecas e negros e, como está ficando careca, ficou com raiva e medo” e resolveu atacar. Agora, de acordo com Vicente, é provável que o próximo delegado requeira uma avaliação psicológica de Uilker. “No momento da prisão, o suspeito não estava falando coisa com coisa. Não sabemos ainda se é ou não fingimento.
Ainda no domingo, o Mais Goiás, noticiou que Uilker havia divulgado suas intenções no Facebook. Veja publicação abaixo:
Momentos de horror
O presidente regional da congregação, Murilo Ribeiro Leite, que estava na capela durante as agressões, falou com o Mais Goiás. Ainda sem saber explicar a motivação para o crime, ele revela parte dos momentos de horror vividos pelos fiéis. “Foi terrível. Felizmente não ocorreu uma tragédia. Ele chegou pelo portão da frente, que estava destrancado, os trancou com cadeados por dentro e abriu a porta da igreja. Lá, com duas facas grandes e afiadas, gritou que iria matar todo mundo e partiu pra cima do recepcionista”.
Segundo ele, além dos hospitalizados, outros cinco religiosos se feriram na tentativa de dominar homem. “Naquele prédio funcionam duas unidades nossas, naquela hora, estavam cerca de 240 pessoas, 30 delas eram crianças. Podemos chamar muitos irmãos de heróis, pois se feriram para desarmar e conter o agressor. Em determinado momento, ele caiu e bateu a cabeça, foi quando desmaiou e conseguimos imobilizá-lo até a chegada da polícia. Foi aí que vi pessoas caídas, com cortes no peito, costas, pescoço, mãos, rosto… uma cena horrorosa”.
Sobre as declarações raciais feitas por Uilker o presidente afirma que “aquilo não tem nada a ver com nossa doutrina. Nessa congregação, a maioria esmagadora é de afrodescendentes. Não sei o que deu na cabeça dele. Deve ser um delírio, não sei como explicar”.
Depois do atentado, Murilo reforça que líderes mórmons se deslocaram de São Paulo para Aparecida de Goiânia, para prestar solidariedade e apoio financeiro aos feridos e traumatizados. “Oferecemos hospital, serviço psicológico e tudo o que temos para apoiá-los. Também faremos reuniões para aprimorar a segurança do local. Sabemos que é difícil ocorrer uma coisa dessas novamente, mas precisamos estar preparados”.
Visão teológica
De acordo com o professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e pós-doutor em educação escolar e religião, Raimundo Márcio Mota de Castro, a questão racial trazida à tona pelo detido não encontra raízes práticas na religião mórmon. “Digo por empiria. Existem missionários negros e, de modo geral, é uma igreja muito pacífica, nunca tivemos notícias de problemas sociais envolvendo fieis desse segmento”.
Porém, o estudioso ressalta que “radicalidades” tem acontecido em todas as religiões, principalmente nas minoritárias. “Tem situações no Brasil em que templos umbandistas são incendiados, imagens católicas são quebradas…Há um movimento muito forte de radicalização, principalmente, de igrejas cristãs. Precisamos refletir profundamente sobre isso”.
Para ele, é cada vez mais é possível encontrar discursos de líderes que reforçam as diferenças entre as crenças e destacam que a salvação é para um grupo específico. “Quando se faz isso, se dá subsídio para que alguns pensem que o correto é eliminar minorias, acabar com aqueles que manifestam fé de uma forma diferente”.
Assim, os motivos para ocorrência de violência em ambientes religiosos podem, explica o teólogo, surgir de “desafetos teológicos” encontrados em quaisquer segmentações. “Pessoas podem não compreender bem o que se ensina, tomam suas próprias convicções e acabam cometendo atrocidades baseadas em discordâncias religiosas”.
Em razão dessa possibilidade, Raimundo considera ser necessária a retomada de um “ensino religioso pluralista”, inclusive nas escolas públicas. “Há necessidade de um ensino religioso voltado para a pluralidade das religiões, ao contrário do que tem sido feito. Esses espaços têm sido utilizados – estudei isso na minha tese de doutorado – de forma confessional, ou seja, professores ligados a determinadas religiões transmitem apenas elementos de sua doutrina. A sala de aula é diversa, têm pessoas de diversa religiões e até sem crença em divindades, então todos precisam ser contemplados e respeitados”.