Aniversário de Goiânia

“Goiânia era pequena e hoje é um mundo”, diz Bariani Ortencio

Escritor, que é um dos nomes mais importantes da literatura goiana, conta curiosidades dos primeiros anos de vida da capital

Estantes e paredes que guardam a história de Goiânia. Está é a casa do escritor Bariani Ortencio, localizada em plena Rua 82, Praça Cívica. O acervo ainda mais complexo e completo sobre a Capital está nas palavras do paulista, de coração goianiense, que decidiu escrever sobre a cidade para registrar tudo o que fosse possível sobre a folclore e história local.

Waldomiro Bariani Ortencio nasceu em Igarapava, São Paulo, e veio para Goiânia quando tinha 15 anos, em 1938. A viagem de caminhão com a família durou oito dias. Chegou na cidade em pleno dia de jogo de futebol entre Atlético e Anápolis. Faltava o goleiro para o time goianiense e Bariani se ofereceu para jogar na posição. A partida foi apitada pelo então prefeito de Goiânia, Venerando de Freitas Borges.

O escritor, na verdade, era para ter se chamado Cristino. Nasceu no dia 24 de julho, dia de Santa Cristina. A mãe queria registrá-lo com o nome da santa, como de era costume na época, mas na cidade em que moravam o padre desviava dinheiro das ofertas da igreja. Por isso, outro nome foi escolhido, Waldomiro.

No cartório, mais um erro comum da época: a data de nascimento registrada nos documentos do escritor é a do pai, 24 de outubro. “Perguntaram para ele ‘data de nascimento?’, e ele disse a dele em vez da minha”, conta.

Literatura

Aos 94 anos, o ex-goleiro do Atlético já publicou 50 livros e tem mais oito prontos, três deles serão lançados ainda neste ano. Segundo Bariani, a transição entre jogador de futebol e escritor foi natural. “Escrever é um dom. Eu sempre gostei de ler desde criança. Quem não lê, não escreve. A história dos escritores são os livros. Nos inspiramos no que que lemos e escrevemos nossas próprias palavras”, afirma.

Para Bariani, registrar a história de Goiânia no papel tem sido uma tarefa difícil. Os desafios trazidos pelas novas tecnologias e o desinteresse de parte da população pelos livros atingiram um dos principais nomes da literatura de Goiás. “É uma profissão triste. Ninguém mais compra livros. Eu escrevo por prazer, não para vender livros. O que eu quero é registrar a história desta região”, afirma o escritor.

Nas estantes de duas grandes salas em sua casa, Bariani guarda mais de 500 livros sobre Goiânia e Goiás, também de outros autores. Além disso, tem acervo de cadernos culturais de jornais goianienses. Nas paredes, fotos de pescarias, prêmios de literatura e encontro com importantes personalidades nacionais e mundiais.

Bariani Ortencio veio para Goiânia em 1938 (Foto: Fernando Leite)

Os primeiros anos na Capital

Bariani conta que quando chegou à Goiânia, o centro da cidade tinha apenas a Praça Cívica, o Grande Hotel, o Liceu e algumas casas na Rua 20. “O restante era tudo canteiro de obras. Meu pai chegou a ganhar dois lotes para construir a serralheria da nossa família, mas minha mãe não quis. Então, fomos para Campinas”, conta o escritor. A Serralheria Bariani é considerada a primeira indústria de Goiânia.

Município planejado para 50 mil habitantes, Bariani explica que a intenção de Pedro Ludovico Teixeira era construir uma cidade cultural no centro do Brasil. Por isso, contratou o engenheiro e arquiteto Attilio Corrêa Lima para planejar as principais construções. Formado na França, Lima trouxe para a cidade os traços da Art Déco.

Curiosidades

Como cidade planejada, Goiânia foi formada por pessoas de fora. Bariani conta que nos primeiros anos, a Capital não tinha boa fama. Na verdade, nem mesmo o Estado de Goiás era bem visto pelo restante do Brasil. “Falavam que bandidos matavam em São Paulo ou Minas Gerais e fugiam para cá. Exatamente para evitar este tipo de comentário, o doutor Pedro não deixou que nenhuma rua naquela época se chamasse ‘38’, por causa do calibre da arma”, conta.

Outra curiosidade quanto as ruas da cidade, é a Avenida 24 de Outubro, em Campinas. “Muitos pensam que o nome é por causa do aniversário de Goiânia, mas isso não é verdade. A homenagem é à Revolução de 1930, que deu fim à República Velha. Na época, Getúlio Vargas assumiu o Governo Provisório e foi um dos maiores apoiadores da construção de Goiânia”, conta o escritor.

Bariani morou 30 anos em Campinas e já vive no Centro de Goiânia há 48 anos anos. Sobre as mudanças na Capital ao longo dos anos, o escritor afirma que, para quem esteve sempre no mesmo local, é difícil perceber mudanças, porque elas acontecem diante dos seus olhos. “De uma coisa eu sei, Goiânia era pequena e hoje é um mundo”, conclui.