Dia Internacional da Mulher

Em Goiás, homens que cometeram violência doméstica participam de grupos reflexivos

Trabalho é realizado com a presença de uma equipe multidisciplinar e o autor passa por dez sessões para repensar sobre a violência contra a mulher

Como uma determinação da Lei Maria da Penha, homologada em agosto de 2006, os Juizados de Violência Doméstica e Familiar devem encaminhar os autores de violência para grupos reflexivos. Em Goiânia, esses grupos são supervisionados pelo Centro de Referência Estadual de Igualdade (Crei) e são realizados desde agosto de 2015. Os encontros contam com equipes multidisciplinares formadas por advogados, psicólogos e assistentes sociais e acontecem quinzenalmente no Fórum Criminal, localizado no Jardim Goiás.

De acordo com o coordenador e assessor jurídico da Secretaria Cidadã, José Geraldo Veloso Magalhães, os encontros têm a duração de 1h45 e são tratadas diversas temáticas com o intuito de levar os participantes à reflexão sobre o ato de violência. “Eles são beneficiados de um projeto que visa uma ressocialização. Nesses encontros são tratados temas que englobam a origem da violência, convivência entre pais e filhos, o uso abusivo de álcool e orientações sobre a Lei Maria da Penha”, destaca.

José Geraldo explica que, em determinados casos, os autores são obrigados a participar desses grupos. Ele explica que há três formas de encaminhar os homens de forma compulsória a esses encontros: como uma das medidas protetivas, que é requerida perante o juiz; como uma das medidas diversas da prisão na audiência de custódia; e a terceira se dá após a condenação como forma alternativa para o cumprimento da pena. “Isso é importante para que o reeducando rompa os ciclos de violência. É importante para desestabilizar essa cultura do machismo que, infelizmente, ainda é muito comum no nosso país”, relata.

Participação

O coordenador também explica que existe a necessidade de entrevista para apontar a necessidade de participação desses encontros. “É como uma triagem. São anotados pontos como sócio-econômico, escolaridade, participação sobre a renda da casa, históricos de álcool e drogas, avaliação psicológica e relatos de infrações”, conta. José também destaca sobre a quantidade de encontros que acontecem para cada participantes. “Cada participante integra dez sessões, sendo que, os profissionais da equipe, realizam até três atendimentos individuais. Cada um cumpre o ciclo de quinze dias entre uma consulta e outra”, explica.

Após isso, José ressalta que a cada três meses são realizadas entrevistas com as vítimas para saber se ela percebeu alguma mudança no comportamento do autor. “Muitas (vítimas) não querem se separar do marido. Algumas relatam que queriam que o homem apenas mudassem o comportamento. É importante destacar que realizamos esse trabalho apenas com pessoas que praticaram algum tipo de violência física sem graves consequências, psicológica ou verbal. Pois esses, ainda no âmbito jurídico, podem rever esses comportamentos e estarem dispostos a mudarem.”

Desde a sua criação na capital, os grupos já atenderam mais de 400 homens e que o índice de reincidência dos autores é de 0,25% . “Contamos com apenas três casos de pessoas que voltaram a agredir de alguma forma a sua familiar. Além de Goiânia, os encontros já acontecem em Alexânia, Aparecida de Goiânia, Anápolis, Mineiros, Ipameri e Campo Alegre e outras dez cidades já estão em fase de implantação, pois existe toda uma estrutura para receber esse trabalho”, conta.

Exceções 

José explica que o trabalho não é realizado com autores de estupros e feminicídios. De acordo com o coordenador, essas pessoas já ultrapassam um limite psicológico de ajuda, que não é conciliada com o objetivo do grupo. “O objetivo é a ressocialização, mas uma pessoa que mata ou estupra uma mulher necessita de uma conotação psíquica mais aprofundada. Um autor de feminicídio, por exemplo, já passou por todas as etapas da violência: xingou, agrediu, violentou, até o ponto de matar”, aponta.

Se caso haja uma reincidência, todo o trâmite é iniciado novamente. E se por ventura, após as reuniões, as vítimas quiserem retirar a denúncia do participante também é possível. “Se o promotor e o juiz se convencerem que a vítima está indo fazer essa suspensão de forma espontânea e não pressionada pelo companheiro, a denúncia é retirada. Mas isso só acontece em questão de violência doméstica. Em caso de lesão corporal, o entendimento sobre esse pedido fica a cargo do Ministério Público”, destaca.

Participação

A voluntariedade é mais um ponto positivo desse projeto. A psicóloga Thayssa Moraia, de 35 anos, é uma delas. Ela explica que cada grupo tem a sua metodologia diferente, mas que ambos buscam o mesmo objetivo: trabalhar o respeito e a igualdade entre homens e mulheres. “No grupo o qual eu faço parte, realizamos o encontro com duas psicólogas, uma musicoterapeuta e duas estagiárias de psicologia. Buscamos trazer a construção da paz dentro do ambiente familiar”, conta

Além disso, todo o trabalho deve ser voltado para o participante pensar sobre a sua relação com o familiar do sexo feminino. “Já passaram pela gente pessoas que agrediram esposas, filhas, irmãs e até a própria mãe. A construção do respeito é base de tudo e para isso utilizamos procedimentos psicológicos, dinâmicas e músicas calmas e relaxantes. Isso auxilia bastante e mostra, logo de imediato, uma mudança de comportamento no participante”, conta.

A voluntária também relata que é importante que a população saiba que qualquer pessoa, mesma que não esteja cumprindo pena, pode participar, desde que passe pela entrevista. “É com extremo respeito que realizamos esse trabalho aqui. Não estamos passando a mão por cima da cabeça de ninguém. Eles têm o direito de terem uma segunda chance e é isso que proporcionamos. Tanto que qualquer homem pode participar dos encontros, desde que marque o horário pelo telefone (62) 3018-8142”, encerra.