Liberdade "vigiada"

Habeas Corpus do MP pode promover a soltura de 1.513 detidos provisoriamente na CPP

Segundo o MP, medida é necessária para atender a lei, evitar rebeliões e óbitos, além de prevenir danos à estrutura da penitenciária. Beneficiados deverão ser monitorados, mas ainda não há tornozeleiras suficientes para atendê-los  

Com até três anos de detenção cumpridos na Casa de Prisão Provisória (CPP), mais de 1.513 encarcerados mantidos irregularmente podem ser beneficiados com habeas corpus (HC) coletivo impetrado pelo Ministério Público estadual (MP-GO) na quinta-feira (4). A intensão é fazer com que a penitenciária, que atualmente tem 3,1 mil internos, conforme expõe o órgão, se atenha à lotação máxima de 1.460 determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011, a qual – segundo promotor – nunca foi cumprida pelo Estado de Goiás. O pedido, protocolado na 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), pode ser apreciado nesta sexta-feira (5).

Caso tenham suas prisões suspensas, reeducandos precisarão utilizar tornozeleira eletrônica. Porém, nessa semana, o Mais Goiás, alertou para o risco de suspensão do serviço de monitoramento por atrasos do Estado em pagamentos à Spacecom, empresa responsável. Marcelo Celestino, promotor que assina o HC, reforça, entretanto, que o problema está parcialmente resolvido.

Para ele, final de governo é uma “situação complicada”. “O problema aconteceu por uma falta de atenção, por parte da empresa, sobre o que estava no contrato. Exigiam cinco pagamentos atrasados, mas quando fomos conferir, constatamos apenas um, o qual foi quitado ontem. O assunto será plenamente resolvido em uma reunião na Secretaria da Fazenda (Sefaz), na próxima semana para alinhar tudo”. Em nota,  a empresa admitiu que, caso não haja acordo sobre o cronograma e atrasos de pagamento “se reserva o direito de suspender o serviço nos termos da legislação”.

Tornozeleiras

Outra possibilidade, todavia, é de que não haja equipamentos suficientes para cada um dos eventuais liberados. De acordo com a Spacecom, há cerca de 4 mil unidades, todas atualmente ativas. Celestino reforça que, caso o pedido seja deferido, o Estado terá que fazer um contrato emergencial para aluguel de mais tornozeleiras.

“Isso é necessário, o correto é simplesmente a revogação da prisão deles, que hoje é ilegal. A  lei determina que prisão cautelar é excepcionalíssima, a regra é ocorrer após a condenação. Então não podemos ter prisões que não cumpram os requisitos da legislação. Tem que ter cautela grande para não transformar exceção em regra”, defende o promotor.

Beneficiados com HC deverão ser monitorados com tornozeleiras eletrônicas; atualmente não há equipamentos suficientes para suprir a demanda (Foto Alfredo Matos/Ascom Susipe/Fotos Públicas)

A medida, entretanto, pode ser alvo de críticas da sociedade. Marcelo afirma saber que a medida pode ser recebida de forma negativa pelo público e adianta sua argumentação. “O correto é simplesmente a revogação, porque as prisões são ilegais. Pelo menos 50% desses 1,5 mil, quando condenados, vão receber penas de até oito anos e como já cumpriram parte, deverão ser beneficiados com o Regime Semiaberto. Assim, de qualquer forma, são pessoas que retornariam à sociedade”.

“Preveníveis”

A manutenção dos detentos no encarceramento pode resultar em duas outras situações “preveníveis”, segundo Marcelo. “A CPP está em uma situação de superlotação, está com mais que o dobro de presos que conseguiria manter. Não há estrutura, celas estão superlotadas, condição ideal para ocorrência de rebeliões e homicídios, além de depredação do prédio, o que causaria prejuízo aos cofres públicos”.

Segundo ele, caso nada seja feito, o número irá apenas aumentar, já que semanalmente chegam mais detidos do que saem. “Essa quantidade sempre está crescendo e grande parte já está lá há muito tempo aguardando decisão para os crimes cometidos. A Constituição Federal estabelece que a prisão provisória deve ter prazo razoável e entendimento do STF é de que a razoabilidade é de, no máximo, um ano de reclusão. Muitos estão lá para além desse tempo, até por três anos”.

Uma alternativa à soltura poderia ocorrer, segundo ele, caso Goiás tivesse mais centros de detenção. “Em todos esses anos, o estado nunca fez nenhuma adaptação para possibilitar isso. Estão em andamento projetos para construção de novos presídios e ampliação da CPP, mas ainda depende de aprovação na Assembleia Legislativa. Em razão das eleições, entretanto, não há quórum para votação. Então, certamente é uma questão que ficará para o ano que vem. Enquanto isso, pode ter certeza que, se 50% dos presos da CPP estão nessa situação, as demais unidades também estão nesse patamar”.

A redação aguarda manifestação do Estado de Goiás sobre os apontamentos realizados pelo promotor.