Incêndios florestais em Goiás aumentam 16% em comparação com ano passado
O Corpo de Bombeiros de Goiás registrou um aumento de 16% no número de incêndios…
O Corpo de Bombeiros de Goiás registrou um aumento de 16% no número de incêndios florestais durante o primeiro semestre de 2021 em comparação ao ano passado. Segundo os dados divulgados na última segunda-feira (5), de janeiro à junho deste ano os militares atenderam 2.502 queimadas em vegetações e culturas agrícolas em toda a extensão do território goiano. O número é superior aos primeiros seis meses de 2020, em que a marca registrada foi de 2.156 incêndios.
De acordo com os bombeiros, durante o ano passado, foram atendidas 10.311 ocorrências de queimadas no Cerrado, número bateu um recorde histórico. Porém, caso os índices continuem subindo, o recorde de 2020 será superado com tranquilidade neste ano. O avanço dos incêndios no Cerrado geram preocupação entre a corporação e aos órgãos de proteção ambiental.
Segundo o tenente Gabriel Lins, grande parte das queimadas acontecem por conta da ação. “O maior perigo dessa época do ano é a umidade baixa, a temperatura elevada e a velocidade do vento. Esses são três fatores que contribuem muito para o aumento dos nossos chamados em incêndios em vegetações. Porém, nós temos dados estatísticos de que 98% dos incêndios que acontecem é justamente por ação humana”.
Problema pode ser maior
Outro motivo de alerta, é que os dados apresentados pelos bombeiros não levam em consideração a quantidade de queimadas que são combatidas por outros brigadistas, como o Ibama, ICMBIO e a Semad. Em outras palavras, se apenas os bombeiros atenderam tantos casos neste primeiro semestre, quantas outras queimadas ocorreram sem que a corporação fique sabendo? A reportagem procurou todos os órgãos mencionados, a fim de descobrir se o número de incêndios florestais registrados por eles também aumentou durante esse primeiro semestre do ano.
Em resposta, a Semad-GO (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás) informou que no primeiro semestre de 2020 foram registrados quatro incêndios na vegetação do Cerrado, todos em parques estaduais. O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, localizado no nordeste do Estado de Goiás, foi uma das zonas mais afetadas pelas chamas na época, com cerca de 79 mil hectares atingidos pelas queimadas. Em 2021, foram pelo menos três incêndios até o momento.
De acordo com o órgão, Goiás possui 24 Unidades de Conservação, sendo 13 pertencentes ao grupo de proteção integral (12 Parques Estaduais e 1 Estação Ecológica) e 11 Áreas de Proteção Ambiental (APA’s). Entre as mais famosas estão Floresta do Araguaia, a Chapada dos Veadeiros e o Parque Estadual dos Pirineus. Outros órgão, como o Ibama e o ICMBIO ainda não informaram a quantidade de ocorrências deste tipo que atenderam.
Um incêndio de grandes proporções atingiu o Parque Nacional das Emas, na região Sudoeste de Goiás, desde aproximadamente às 18h da última sexta-feira (9), já em julho. De acordo com o Corpo de Bombeiros, o tempo seco e os fortes ventos que atingem a região têm dificultado o combate às chamas. Estima-se que até o momento, o fogo já consumiu aproximadamente 15 mil hectares de vegetação.
Muita chama e pouca chuva
Ainda segundo as estatísticas divulgadas pelos bombeiros, a partir de março a quantidade de queimadas florestais aumentam descontroladamente em Goiás. Para se ter uma noção, em março de 2021 os bombeiros atenderam 136 incêndios no Cerrado, em maio o número já era de 818 ocorrências e em junho atingiu a marca de 1.119 atendimentos.
O professor e doutor em Ecologia Nelson Silva Pinto, explica que as queimadas naturais geralmente ocorrem durante este período seco do ano, com o acúmulo de biomassa seca, baixa umidade e alta temperatura. As queimadas espontâneas são consideradas benéficas para a germinação de sementes e para a ciclagem de nutrientes do solo. Porém, as queimadas naturais tendem a ser menos intensas e duradouras quando comparadas com o que observamos em situações de incêndio florestal.
“Acontece porque temos o efeito climático associado, que afeta o regime de chuvas e, consequentemente, vai afetar as probabilidades de ocorrência de incêndios. De tempos em tempos observamos também o acúmulo de biomassa, o que aumenta probabilidade e intensidade de incêndios. Mas, não podemos excluir o efeito de causa humana. Esse é um ponto muito sério e que tem afetado negativamente o Cerrado há muito tempo”, explica Nelson.
As ações humanas fazem com que fogo criminoso se alastre por regiões cada vez mais extensas, ocasionando, muitas vezes, o esgotamento das terras, erosão e o extermínio de espécies nativas. O especialista reforça que sem ação o Cerrado corre o risco de atingir prejuízos irreversíveis.
“Estamos chegando a um ponto irreversível e isso é muito sério. Infelizmente, sem a participação de toda a população, fica difícil combater os incêndios. Temos um grande avanço de atividades de origem humana, muitas vezes de forma descontrolada e uma grande degradação ambiental. Isso levará a um ponto sem retorno se não agirmos no ponto de vista de conservação ambiental. Medidas como aceiros e aceiros verdes (que funcionariam como barreiras), roçagem sem uso de fogo e pastoreio racional Voisin, entre outras, podem ajudar”, diz o ecologista.
Crise hídrica e outros problemas
Com cada vez mais queimadas e menos chuvas, as consequências vão além do prejuízo ambiental e atingem também a população de todo o Brasil. Recentemente o Sistema Nacional de Meteorologia (SNM) emitiu um alerta de emergência hídrica associada à escassez de chuvas para Goiás e outros quatro estados do país, durante o período de junho a setembro. Na manhã desta quarta-feira (7), o Governador Ronaldo Caiado pediu consciência por parte da população, durante uma visita à cidade de Anápolis.
“Estamos tendo sérias dificuldades. A seca está baixando todos nossos reservatórios. Vamos ter consciência para que não não haja desperdício de água. É [um problema] previsto no Brasil todo. É um momento de muita preocupação. Todos estão vendo o preço da energia. A seca desse ano é uma das maiores”, afirmou o governador.
Os especialistas explicam que as queimadas e a crise hídrica estão interligados pois, com os incêndios acaba sendo existindo uma grande quantidade de partículas liberadas que afetam negativamente a formação de nuvens de chuva. Dessa forma, há uma diminuição da pluviosidade, que afeta negativamente os reservatórios. Porém, segundo Nelson, os problemas não se resumem apenas à falta de água.
“Podemos enumerar várias coisas que muitas vezes nem percebemos, mas atingem o nosso dia-a-dia por conta das queimadas no Cerrado, como a intoxicação da população local com gases tóxicos e particulados, aumento do efeito estufa, chuva ácida, diminuição da biomassa e madeira (que pode gerar prejuízo econômico), impactos sobre o solo (o que diminui a fertilidade e produtividade) e por fim, eutrofização e contaminação das águas”, afirma Nelson.
Investimentos
Ao Mais Goiás, os bombeiros afirmaram que vêm apostando em atividades educativas para conscientizar a população e evitar a utilização de fogo para a limpeza de lotes baldios nas cidades e manejo de pastagens nas zonas rurais. Além do uso de drones para monitorar possíveis focos de incêndio. “A mudança cultural em relação ao uso do fogo é fundamental para reduzirmos tais estatísticas”, afirmou em nota.
A Semad informou que investiu de mais de R$ 4,4 milhões em aquisição de equipamentos, como motosserras, luvas, rádios comunicadores e drones. Além de ter ampliado o quantidade de brigadas de combate a incêndios, conseguindo acolher até 31 brigadistas. Além disso, em parceria com outros órgão, realizou queimas controladas, treinamentos e o desenvolvimento de Boletins e Mapas de Risco.
Em respostas aos investimentos, o mês de junho de 2021 registrou queda de 5,4% nos índices de incêndios na região do Cerrado, em comparação ao mesmo mês em 2020, segundo os bombeiros. Mesmo com a diminuição durante o sexto mês, o resultado ainda parece tímido se comparado aos dados totais do semestre e à previsão de especialistas.
O Sistema Nacional de Meteorologia (SNM), por exemplo, prevê uma estiagem mais severa em 2021 do que em anos anteriores. “A expectativa é unir forças para conseguir um maior poder de resposta aos incêndios, diminuindo sua quantidade e amplitude”, reforçam os militares.