Jovens denunciam vereador por lesão corporal em abordagem policial, em Goiânia
O eletricista Matheus Sampaio (19) registrou boletim de ocorrência de lesão corporal contra o vereador…
O eletricista Matheus Sampaio (19) registrou boletim de ocorrência de lesão corporal contra o vereador e policial militar Sargento Novandir (PTN) na noite de domingo (18). De acordo com o documento, o jovem e um amigo identificado apenas como Valmi (31) teriam sido agredidos em uma abordagem policial liderada pelo político por volta das 23h de sábado (17), no Setor Santa Genoveva, ocasião em que Matheus afirma ter recebido, de Novandir, uma coronhada na cabeça. Segundo o registro, “amigos do sargento” teriam derrubado e agredido Valmi com diversos chutes na cabeça. Câmeras de segurança flagraram o episódio. O vereador nega tanto a agressão como a suposta amizade com outros três homens que aparecem no vídeo.
De acordo com a mãe de Matheus, os jovens estavam caminhando pela rua enquanto Valmi falava com a mãe ao celular quando foram abordados pelo policial e outros três homens. O sargento confirma a informação, mas reforça que ele era o único policial declarado no local e que não pediu auxílio dos homens “desconhecidos” que aparecem no vídeo. Segundo ele, podem ser pessoas que estavam em uma festa de aniversário junto com ele, quando uma vítima de furto acusou Matheus e Valmi de ter quebrado o vidro de seu carro e furtado itens no interior do veículo.
Nas filmagens, é possível ver Matheus, de camisa branca e bermuda vermelha caminhando pouco a frente de Valmi, também de camisa clara e falando ao celular, quando três homens atravessam a rua e abordam a dupla. O Sargento Novandir, segundo confirmação dele próprio, é o homem que aparece de calça jeans e camisa vermelha, apontando uma pistola para Matheus. Enquanto isso, dois homens abordam Valmi, que é obrigado a se deitar na calçada.
Matheus tenta passar por cima de uma corrente quando recebe um golpe do policial. Dominado, o rapaz é deitado no chão. Simultaneamente, outro homem se junta à dupla que abordava Valmi. Um deles desfere chute no rosto do rapaz, que estava deitado.
De acordo com Ana Paula Sampaio, mãe de Matheus, que também aparece no vídeo tentando socorrer o rapaz, ao final da abordagem Valmi estava com a boca ensanguentada e precisou receber 20 pontos em uma unidade hospitalar para suturar o ferimento. Matheus apresentava marcas vermelhas no rosto e gotículas de sangue por causa da suposta coronhada.
“Estamos com muito medo de represálias. Eles não querem nem falar com a imprensa sobre o assunto. Hoje eles apareceram na TV como bandidos, mas não é verdade. Nada justifica a agressão que receberam do policial. Ainda bem que temos as filmagens. Está incriminando os meninos pra tirar o corpinho fora como vereador. Tô com muito medo por ele ser peixe grande e eu ser uma coitada mais meus filhos”.
O sargento nega qualquer agressão. “Fiz apenas uma movimentação rápida para impedir que ele evadisse. A arma estava na minha mão direita. Troquei ela para a mão esquerda e fiz o movimento com a mão direita, sem arma, em direção ao rapaz. Estava com uma pistola ponto 40, se eu tivesse dado a coronhada, teria feito um estrago. Quem tem treinamento policial sabe que coronhada é coisa de quem não sabe manejar uma arma, pelo risco de disparo e de queda do armamento. Está tudo nas filmagens”.
O Mais Goiás entrou em contato com a Polícia Militar para saber quais serão os procedimentos para apuração do comportamento do vereador e policial Sargento Novandir. Por e-mail, a corporação afirmou que a entidade a ser procurada é a Câmara Municipal de Goiânia, já que o Novandir é vereador. Na Câmara, o Mais Goiás não conseguiu contato com o diretor de comunicação, identificado apenas como Marcelo. O portal aguarda manifestação das duas instituições sobre o ocorrido.
Coronhada e espancamento
Segundo a mãe de Matheus, Ana Paula, os rapazes foram agredidos por Novandir e por um grupo de pessoas que o acompanhava. Segundo ela, pelo menos um deles, além do sargento, era policial e todos estavam armados.
De acordo com Ana, o filho estava com o amigo caminhoneiro Valmi, que tinha chegado de Salinas (MG) para descarregar pequi na Ceasa. Após descarregar o caminhão, como não tinha carga para ele voltar para a cidade mineira, jantou na casa da família de Matheus. “Nos conhecemos há muito tempo, lá de Minas. Ele guardou o caminhão e suas roupas e saiu de casa para ligar para a mãe dele. Matheus só estava acompanhando”.
Enquanto caminhavam pelas imediações da residência, eles avistaram um Astra preto, que estava com a chave do veículo presa ao bagageiro. “Estava acontecendo uma festa de criança em um salão nas proximidades. Eles pegaram a chave e levaram até lá na esperança de encontrar o dono do veículo para devolver as chaves. Foi o que fizeram. Chegaram lá, periram para o DJ anunciar e entregaram as chaves nas mãos de Novandir, que, inclusive agradeceu eles”.
Na sequência, segundo Ana, os rapazes caminhavam de volta para a residência, enquanto Valmi ainda falava com a mãe ao telefone. Foi quando, ambos foram abordados por quatro pessoas, todas armadas. “Primeiro vieram três e depois outro chegou por trás. É o que espanca o Valmi com chutes no rosto, ele levou 20 pontos na boca”.
Abordado por Novandir, Matheus, segundo a mãe, levou uma coronhada na cabeça e foi jogado no chão. “Ele não tentou fugir, tentou me chamar. Disse ao policial ‘deixa eu chamar minha mãe, quando tentou saltar a corrente para me chamar. Como Novandir não deixou, ele me gritou. ele tentou saltar a corrente para me chamar, foi quando levou a coronhada. Como ele não deixou, ele gritou. Foi o momento que ele levou a coronhada”.
Ana ainda afirma que, ao ser agredido, o filho revela que tudo estava sendo filmado por câmeras do circuito de segurança da residência onde mora. “‘Tem várias câmeras, tão gravando’. Ele disse isso e foi a hora em que eles deram uma recuada, senão tinham acertado eles com mais força”.
Ato seguinte, Ana revela ter ouvido os gritos de Matheus e foi com a filha para socorrer o rapaz. Foi quando um homem, identificado apenas como Paulinho, teria apontado uma arma para as mulheres. “Apontou a arma pra mim e para a minha filha. O proprietário do imóvel saiu para ajudar e falou para ele não atirar. ‘Faz isso não, cara’, ele falou. Senão, acredito, que tinha atirado na gente”.
Depois da confusão, Ana afirmou que chamaria a polícia, quando Novandir e os outros homens voltaram para a festa. “Foram embora e logo depois a viatura chegou. Quando eu disse de quem se tratava, o PM chamou outra viatura, com o superior dele. Lá eles constataram que não houve nenhum roubo por parte do Matheus e do Valmi. Eles não tem passagem pela polícia e nem tinha nenhum registro de ocorrência para justificar a abordagem. Eles são trabalhadores”.
Segunda versão
De acordo com Sargento Novandir, o caso ocorreu de sábado para domingo, quando ele estava com familiares na festa de aniversário do filho de um amigo. Foi quando, segundo ele, uma pessoa entrou na festa pedindo socorro, dizendo que havia acabado de ser vítima de um furto. “De acordo com a vítima, dois homens teriam quebrado um dos vidros do veículo e roubaram pertences que estavam no interior do carro. Ele apontou para dois homens que andava na rua e eu consegui visualizá-los”.
O vereador afirmou ter visto o carro com o vidro quebrado, mas não se lembra da cor ou do modelo do veículo. O vereador nega também ter tido contato com Matheus e Valmi na festa em que estava. “Da mesma maneira que cabe acusar, cabe também ser acusado. Em momento algum tive contato com eles na festa. Em momento algum alguém foi entregar alguma chave pra mim. O carro em questão nem é meu, eu estava em um Spacefox vermelho”, comenta.
Os homens avistados pelo vereador/policial eram Matheus e Valmi. O sargento então afirmou ter ido em direção a eles, se identifiquei como policial e solicitado que parassem. “Não obedeceram. O que estava na frente, Matheus, tentou evadir. Verbalizei que era policial e pedi que colocasse a mão na cabeça. Ele disse que estava indo embora e eu retruquei dizendo que ele não sairia dali enquanto a abordagem não fosse realizada. Quando vi ele saltando a corrente, tive que fazer um movimento rápido para que ele não evadisse. Passei minha arma da mão direita para a mão esquerda e com a mão direita agarrei o rapaz. Não foi uma pancada, em momento nenhum agredi ele”.
Confira vídeo em que jovens aparecem encontrando chave do Astra preto:
Segundo Novandir, as outras três pessoas que aparecem juntas dele no vídeo não são amigas. “São pessoas que vieram em direção aos dois [Matheus e Valmi. Um deles era a vitima do furto e outro, fui informado depois de que, era um segurança. Acho que todos estavam na festa. Se os outros estavam armados eu não posso confirmar. As pessoas que abordaram Valmi estavam na festa. Depois eu soube que quem agrediu Valmi com chutes tinha sido o rapaz vítima de furto”.
Quando a mãe e a irmã de Matheus e outras pessoas saíram para socorrer o rapaz, Novandir afirma ter tido receio de que a situação, que já estava acalorada, culminasse em “vias de fato” e, segundo ele, foi preferível apartar a situação, momento que ele e os demais homens que o acompanhavam deixaram o local. “Liguei para o 190 para que uma viatura viesse fazer o procedimento. Não teve como conter os homens que tinham vindo da festa porque os familiares e eles quase entraram em vias de fato. Foi melhor apartar para não piorar ainda mais a ocorrência”.