Justiça libera PMs acusados de forjar confronto em Goiânia de participar de reconstituição
Magistrado considerou os princípios da vedação à autoincriminação e da presunção de inocência
O juiz Antonio Fernandes de Oliveira permitiu que os seis policiais militares do Comando de Operações de Divisas (COD), acusados de forjar um confronto durante uma abordagem ocorrida em abril no Setor Jaó, em Goiânia, não participassem de uma reconstituição do crime. A simulação estava marcada para às 8h desta sexta-feira (7), no local da ocorrência, e o despacho foi proferido na quinta (6).
“Considerando a manifestação defensiva (…) e em respeito aos princípios da vedação à autoincriminação (nemo tenetur se detegere) e da presunção de inocência, observo que fica a critério da Defesa o comparecimento dos investigados à reprodução simulada, agendada para o dia 07/06/2024, não sendo impositivas suas participações”, escreveu.
Na peça, a defesa dos policiais pediu a dispensa da presença, alegando que os “supostos autores de ilícito penal não podem ser compelidos a participar da reprodução simulada do fato delituoso, sob pena de caracterização de injusto constrangimento”. Segundo os advogados, os investigados podem “consentir com a ordem para participar da reconstituição criminal ou optar por se recusar, visando salvaguardar seu direito de não produzir evidências que possam ser usadas contra si mesmo”.
E completa: “A adesão à reconstituição do crime deve ser voluntária, de acordo com a compreensão doutrinária e jurisprudencial. Não considerar o consentimento dos recorrentes a participarem da reconstituição não apenas viola o direito ao silêncio e a não autoincriminação, mas também contraria os princípios essenciais que regem o processo penal democrático.”
O proprio juiz Antônio tinha decidido pela reconstituição com a presença dos PMs na última terça-feira (4). Na ocasião, ele também negou pedido do Ministério Público (MPGO) para prender preventivamente os acusados, que foram soltos no último domingo (2). Na decisão, contudo, ele determinou aos acusados:
- Suspensão do exercício da atividade policial, ostensivamente;
- Suspensão do direito ao porte de arma de fogo;
- Proibição de manter contato, por qualquer meio, com qualquer testemunha do
caso e/ou com familiares das vítimas, devendo delas permanecer distantes. - Comparecimento em juízo a cada 30 (trinta) dias, entre os dias 01 e 10 de cada mês, para informar seu endereço e justificar suas atividades laborais;
- Proibição de ausentar-se da Comarca e região metropolitana, por período superior a 15 (quinze) dias, sem a prévia autorização deste juízo;
- Recolhimento domiciliar noturno, entre as 20:00 horas às 06:00 horas, todos os
dias; - Monitoração, por uso de tornozeleira eletrônica.
Registro em vídeo e ocorrência
Quatro policiais militares (PMs) do COD foram presos em 6 de abril como suspeitos de forjarem um confronto em ocorrência registrada no Setor Jaó, em Goiânia, no começo daquele mês – outros dois, posteriormente. Na ocasião, os agentes afirmaram que a morte de suspeitos foi uma reação ao serem atacados com tiros, mas um vídeo, gravado pelo celular de um dos mortos, mostrou que a ação se tratou de uma execução, visto que as vítimas estavam desarmadas.
Segundo a ocorrência registrada pela PM, Júnior José Aquino Leite, de 40 anos, e Marines Pereira Gonçalves, de 42 anos, que morreram na ação do COD, foram denunciados por um foragido da Justiça. De acordo com a denúncia, a dupla o havia procurado em uma chácara em Petrolina, na região metropolitana de Goiânia.
Ao não encontrá-lo, Júnior e Marines foram até a casa do foragido da justiça, em Trindade, invadiram o imóvel e furtaram diversos aparelhos. A ocorrência diz ainda que o denunciante afirmou que os dois estariam se passando por policiais civis e extorquindo pessoas com antecedentes criminais na zona rural de cidades próximas à capital.
Abordagem e confronto forjado
Procurados pelo Serviço de Inteligência do COD, os dois suspeitos, que estavam em um carro modelo HB20, teriam sido vistos trafegando pelo Setor Jaó. Nas proximidades do Centro de Treinamento do Vila Nova, eles foram abordados por uma equipe fardada, composta por um tenente, dois sargentos, e um soldado.
Os policiais relataram que, quando abordado, o suspeito que estava no volante do carro desceu e usou uma pistola para atirar contra a equipe, que revidou. Um tenente e dois sargentos, então, efetuaram nove tiros de fuzil e outros nove de carabina contra a dupla. O soldado que estava com a equipe e que dirigia a viatura não efetuou nenhum disparo.
Um dos abordados morreu na hora e o outro foi socorrido ainda com vida, mas não resistiu. Durante o registro da ocorrência, os PMs entregaram uma pistola e um revólver para a equipe da Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH) e afirmaram que as armas haviam sido usadas por eles contra a equipe.
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