Justiça revisa decisão que culpava mulher vítima de violência doméstica em Pontalina
Defensoria Pública destacou que o fato de a vítima ter reatado o relacionamento não eximia o agressor da intenção de agredir
O Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) reformou uma decisão de primeiro grau sobre caso de violência doméstica, em Pontalina, que culpava a vítima. Na decisão de 1º grau, o juízo atribuiu as agressões sofridas por ela reatar o relacionamento com o ex-companheiro.
A primeira decisão, inclusive, desconsiderou que o filho da vítima, de 5 anos, chegou a presenciar uma das agressões, o que motivou a separação. “Durante todo o relacionamento, seis anos, brigavam e voltavam novamente. Precisam mais de um acompanhamento psicológico do que do auxílio do Poder Judiciário, já que nenhuma das partes envolvidas possuem discernimento para colocar fim na relação tóxica”, diz trecho da sentença.
Já a defensora pública Tatiana Bronzato, coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa e Promoção dos Direitos da Mulher (Nudem), destacou, em sua apelação, que o fato de a vítima ter reatado o relacionamento não exime o agressor da intenção de agredir.
“É sabido que o chamado ciclo da violência é uma constante nos relacionamentos abusivos. Após a agressão, o autor da violência promete mudanças. Nesta fase, na tentativa de superar o abuso, o agressor usa da gentileza, de presentes para alimentar esperanças e pedir desculpas pelas agressões, onde as partes costumam se reconciliar e reatar o relacionamento”, explicou Bronzato.
Inclusive, ela destacou que a reconciliação entre vítima e agressor não implica fim do risco, mas a chance de nova escalada de violência. Para ela, a decisão do primeiro grau “perpetuava estereótipos de gênero, ignorando as dinâmicas estruturais de violência contra a mulher”. Com base no recurso apresentado, a decisão foi reformada, reconhecendo a culpa do ex-companheiro pelas agressões.
“Em tema de crime de gênero, a palavra da vítima, confluente com as demais provas dos autos da ação penal, demonstrando a lesão por ela sofrida, resultado das agressões do processado, ex-companheiro, serve de fundamento para o resultado condenatório da imputação”, entendeu o relator Hamilton Gomes Carneiro, juiz substituto em 2º grau. O caso foi revelado pela DPE-GO no último dia 5 de dezembro, mas a identidade da vítima não foi divulgada para preservá-la.
Em depoimento, a mulher disse que, quando buscou a Justiça, não esperava que se sentiria tão mal. “No dia da audiência de instrução, foi péssimo, porque justamente onde eu esperava ser acolhida, onde esperava imparcialidade na busca por direitos, fui recebida com descaso, sendo novamente revitimizada.”
Após a nova decisão, contudo, ela afirmou que se sente “aliviada em saber que a Justiça reconheceu o caso e que, na verdade, não era a minha culpa”.