Mais de 70% dos municípios goianos tiveram redução da taxa de gravidez na adolescência
Cidades que registraram aumento estão, em sua maioria, no interior do estado
Os números de caso de gravidez na adolescência caíram em 75,51% dos municípios goiano na série histórica que vai de 2008 a 2017. O índice é motivo para se comemorar neste 8 de março, Dia da Mulher, uma vez que, segundo a docente dos curso de graduação e mestrado em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (Puc GO), Denise Neves, a redução significa mais investimentos em políticas públicas voltadas à elas.
Os dados cedidos pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), por meio do sistema de Sinasc/ConectaSUS, e analisados pelo Mais Goiás, mostram que, em 2017, 12.884 crianças vivas nasceram de mães adolescentes em faixa etária entre 10 e 19 anos. Nove anos antes, esse o número foi de 18.035.
Goiás seguiu a tendência nacional. No Brasil, entre 2004 e 2015, a gravidez de adolescentes caiu em 17%, segundo o Ministério da Saúde. Para levantar os números goianos, a SES considerou 245 das 246 cidades, uma vez que em um dos municípios não há realização de partos e as gestantes são encaminhadas para localidades próximas. Denise considera que as políticas públicas de conscientização e prevenção da gravidez influenciaram a queda.
Contudo, há outros fatores há serem levados em conta quando se fala na redução dos números de gravidez na adolescência. “A questão da escolaridade, do trabalho da família, o índice de emprego, o acesso ao sistema de saúde em geral, tudo isso impacta. É preciso levar em conta também que 98% das adolescentes grávidas tem conhecimento de métodos contraceptivos, mas não fazem uso“, explica Denise.
Uma das adolescentes que entrou para as estatísticas goianas foi Talita Pereira da Silva, estudante de 20 anos que foi mãe aos 16. A jovem conta que sua primeira reação ao descobrir a gestação foi negativa, uma vez que ainda cursava o ensino médio.
Denise explica que essa apreensão é comum. A docente conta que, em suas pesquisas para sua tese de mestrado sobre mães adolescentes, descobriu que as meninas que estudavam quando engravidaram ficaram mais preocupadas sobre o futuro. Esse medo era menor quando a jovem havia cursado apenas o ensino fundamental, por exemplo. Essa descoberta mostra que a escolaridade é fator importante de impacto na gravidez de 10 a 19 anos.
Talita cria seu filho com a ajuda do pai da criança que tinha 19 anos quando a moça engravidou. Já a situação de Joanice Gabriela Elias, cuidadora de idosos de 23 anos, também mãe aos 16, é diferente. O pai da filha nunca ajudou financeira e emocionalmente, e quem amparou a jovem gestante foi a mãe. “Para quem tem apoio da família já é difícil, imagino para quem não tem”, desabafa.
O que une as histórias de Talita e Joanice é o caráter inesperado da gestação. Elas fazem parte dos 95%, segundo Denise, das adolescentes grávidas que não planejaram ter filhos. Para a docente, os números obtidos na pesquisa para a tese de mestrado mostram que a ingenuidade das jovens também é fator significante nos números, uma vez que, pela inexperiência, as moças nunca imaginam que a gestão inesperada pode acontecer.
Denise acredita que a redução no número de gravidez na adolescência reflete também uma mudança na sociedade. E por isso, neste dia 8, há motivos para comemorar, apesar do número estar longe do ideal. A professora ressalta que o número de jovens gestantes reflete a sociedade patriarcal e machista em que ainda vivemos, mas que aos poucos as pessoas estão se tornando mais conscientes.
Interior
Apesar das razões para comemorar a redução, é preciso manter o alerta no que diz respeito às cidades do interior. Dos 45 municípios em que o número que adolescentes grávidas aumentou e nos 15 em que permaneceu igual entre 2008 e 2017, apenas oito no primeiro caso e um, no segundo, estão na região metropolitana de Goiânia.
A maioria das cidades que registrou elevação no número de gravidez dos 10 aos 19 anos está no interior. Denise acredita que esses locais, por estarem afastados da capital e dos grandes centros comerciais, podem estar deficitários no que diz respeito às políticas públicas voltadas para a mulher. Além disso, Denise lembra que o conservadorismo nas cidades do interior ainda é grande.
“Outro fator que pode estar relacionado é a presença de algum incentivo externo em relação à economia, por exemplo, o lugar que tem usinas atrai população masculina, que realiza o trabalho pesado. Quando essa população masculina vai para essa região, em geral, há maior índice de gravidez em geral e na adolescência. Nesses locais aumenta também o índice de prostituição“, argumenta a professora.
Saúde
A gravidez na adolescência precisa ser debatida também por estar relacionada à saúde. A ginecologista e obstetra do Hospital Materno Infantil (HMI), Maria Elaine Assis, explica que essas gestações são consideradas parte da política de saúde pública, no Brasil, uma vez que pode acarretar complicações obstétricas, com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psico-sociais e econômicos.
Durante a gravidez, Tatiana precisou parar de estudar pois não aguentava os enjôos ao usar o transporte público para ir estudar. Além do problema enfrentado pela jovem, casos de anemia materna, doença hipertensiva específica da gravidez, desproporção céfalo-pélvica e infecção urinária são mais comuns nas mães adolescentes, conforme explica Elaine.
A médica ressalta ainda outros problemas e enfermidades. “Prematuridade, placenta prévia, baixo peso ao nascer, sofrimento fetal agudo intra-parto, complicações no parto, lesões o canal de parto e hemorragias, e puerpério, endometrite, infecções, deiscência de incisões, dificuldade para amamentar, entre outros. No entanto, alguns autores sustentam a ideia de que, a gravidez pode ser bem tolerada pelas adolescentes, desde que elas recebam assistência pré-natal adequada”, diz a ginecologista.
Quando as jovens não tem outra alternativa a não ser o sistema público de saúde, no entanto, a assistência fica comprometida. Joanice conta que fez seu pré-natal com um médico e o parto com outro, por causa da disponibilidade da unidade de saúde que frequenta. A cuidadora de idosos reclama que a equipe que trouxe o filho ao mundo não respeitou a orientação do ginecologista anterior que desaconselhou o parto normal.
A jovem explica que a insistência da equipe em induzir o parto normal foi fonte de sofrimento. “Eu senti dor até não conseguir mais e eles viram que teriam que fazer a cesárea. Isso me atrapalhou muito, por ser jovem eu não tinha experiência e o médico orientou minha mãe que deveríamos evitar o parto normal, mas no dia da neném nascer eles não respeitaram “, conclui.
*Amanda Sales é integrante do programa de estágio do convênio entre Ciee e Mais Goiás, sob orientação de Thaís Lobo