Justiça

Mesmo após decisão do STF, candidatos tatuados ainda sofrem com restrições em concursos

Edital de 2016 da Polícia Militar de Goiás listava a existência de tatuagens como uma das "alterações incapacitantes e fatores de contraindicação para admissão"

Em agosto de 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, por 7 votos a 1, que editais de concurso público não podem barrar candidatos por serem tatuados. A decisão vale, inclusive, para as forças armadas, a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros. Entretanto, segundo apurado pela BBC Brasil, a medida continua a ser desrespeitada.

A decisão da Suprema Corte teve como base o pedido de Henrique Lopes Carvalho da Silveira, que tentava se tornar bombeiro militar. Em 2008, após passar pelas primeiras etapas do concurso público, em São Paulo, foi desclassificado em avaliação médica porque uma tatuagem, próxima ao tornozelo, ficaria visível quando usasse o uniforme de treinamento físico.

Os ministros do STF, ao analisarem o caso, entenderam que as tatuagens só podem ser restringidas em casos excepcionais, se violarem valores constitucionais ou incitarem à violência. Esse entendimento deve valer a todos os processos semelhantes que tramitam no País.

Apesar disso, como aponta matéria da BBC Brasil, editais para concurso público da Marinha, bombeiros e polícias militares de mais de dez Estados continuam a vetar candidatos por terem alguma tatuagem aparente ou impõem restrições genéricas além das elencadas pelos ministros do Supremo na decisão de 2016.

Caso goiano

Entre 2016 e 2017, editais de cinco Estados para a Polícia Militar apontaram tatuagens visíveis como fator impeditivo para integração. São eles: Goiás, Acre, Paraná, Amapá e Pará. No caso goiano, um edital de 6 de setembro de 2016 para a Polícia Militar listava a existência de tatuagens como uma das “alterações incapacitantes e fatores de contraindicação para admissão”.

Em fevereiro deste ano, a 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), em decisão unânime, manteve sentença da comarca de Goiânia determinando a anulação do ato administrativo de um concurso anterior, que impedia Maycon Idmir Eicke Batista Dutra de assumir o cargo de soldado da Polícia Militar de Goiás. Ele foi considerado inapto, na 3ª fase do concurso, por ter uma tatuagem que mostra uma nota musical na panturrilha da perna direita.

Foi relator o juiz substituto em segundo grau Marcus da Costa Ferreira. Segundo consta dos autos, Maycon Idmir fez o concurso da PMGO em 2012, para o cargo de soldado. Ele passou em todas etapas previstas no edital, nas provas objetiva e discursiva, testes de avaliação física e psicológico, porém, ao realizar o exame de saúde foi reprovado, sob o argumento de ter uma tatuagem na perna direita

O relator, contudo, ponderou que não pode conter, no edital do concurso público, exigências arbitrárias e injustificadas, que nada contribuem para a busca do interesse público. Porém, ressaltou que o edital do certame da PMGO prevê apenas que “tatuagens que afetam a honra pessoal, o pudor policial militar como as que apresentam símbolos ou inscrições alusivas a ideologias terroristas ou extremistas, contrárias as instituições democráticas sejam excluídos do certame”.

Marcus da Costa ressaltou, no entanto, que a tatuagem na panturrilha da perna direita de Maycon não faz alusões ofensivas àquelas previstas no edital e que esta pode ser coberta pelas vestimentas do candidato, o que não inviabiliza ou dificulta o exercício da profissão de soldado. Com isso, conforme sustenta o magistrado, a decisão de primeiro grau não merece ser reformada.

O Mais Goiás questionou a Polícia Militar de Goiás e a Secretaria de Estado de Gestão e Planejamento (Segplan) sobre os motivos da proibição de tatuagens e se tais restrições continuam sendo aplicadas, mas não recebeu retorno até o momento da publicação deste texto.