MP denuncia 14 por organização criminosa; grupo venceu licitações em 178 cidades goianas
Grupo de grande porte teria criado empresas menores para se aproveitar de facilidades da lei na hora de concorrer a licitações
O Ministério Público de Goiás (MP-GO) denunciou 14 pessoas por organização criminosa com objetivo de fraudes em licitações, falsidades ideológicas, corrupção e peculato, na última quarta (10). A ação fez parte da Operação Fator R, deflagrada inicialmente em 26 de outubro.
Segundo o órgão, o grupo atuou em 178 municípios no Estado e mais 49 no Mato Grosso. Ainda segundo a apuração do MP, as ações fraudulentas ocorriam por meio de pequenas empresas falsas que simulavam concorrência em licitação e conseguiam vantagens destinadas aquelas que realmente se enquadravam nesses benefícios. Cinco estão presos e dois em prisão domiciliar.
A investigação ocorre desde 2018, mas as duas empresas que se desmembravam atuariam há cerca de dez anos. Para realizar a fraude, o grupo criou cinco instituições pequenas com sede em Goiás e duas no Mato Grosso, segundo informações do promotor Sandro Halfeld Barros, coordenador da operação. Todas no ramo de pneus. O objetivo era aproveitar-se de facilidades que a lei concede a pequenas empresas em certames públicos.
“A Constituição tem seus objetivos fundamentais e um deles é reduzir as desigualdades. Para isso, traz mecanismos como a lei do Simples, que dá ao pequeno e microempresário a chance de concorrer com o grande no mercado. Vantagens trabalhistas, tributárias e previdenciárias”, disse o promotor em coletiva no mês passado.
Ao descobrir que as empresas eram, na prática, parte de uma única sede, o MP-GO verificou um cenário de possível organização criminosa empresarial. “Vimos fortes indícios que pequenas empresas eram, na verdade, uma grande empresa. Era o poder do grande empresário, que consegue melhores preços, com as vantagens do pequeno.”
Ainda segundo o MP, o grupo criminoso recebeu, em dez anos, cerca de R$ 71.675.380,53 em contratos firmados com a quase totalidade dos municípios goianos.
Esquema de fraude em licitação
O esquema, segundo o Ministério Público de Goiás (MP-GO), é conhecido como Falso Simples. A ação desta terça-feira (26) cumpriu 36 mandados de busca e apreensão e sete mandados de prisão preventiva em Goiás e Mato Grosso – as sete pessoas foram presas, segundo Sandro, a fim de parar a atuação criminosa, que ainda estaria em atividade.
Em Goiânia, os mandados ocorreram na sede da Comurg, na Vila Boa, e no Setor Bueno. Inclusive, sobre os locais do poder público onde houve o cumprimento de mandado, o promotor reforça que o objeto de investigação é a grande empresa que criou as pequenas instituições para fraudar as licitações. “O poder público, nessa primeira fase, é a vítima.”
Somente entre os municípios goianos, são cerca de R$ 71 milhões que resultaram dessas fraudes. Ele comentou sobre a possibilidade de as pequenas prefeituras cancelarem os contratos que resultaram de fraude. “Cada município tem sua realidade. Mas é possível a contratação emergencial para que a cidade não fique desguarnecida e para que as fraudes não prevaleçam”.
Organização criminosa
A investigação aponta uma possível organização criminosa empresarial estruturada. Ele, contudo, não cita nomes, uma vez que a lei de abuso de autoridade impede a exposição.
Mas revela a existência de: um líder; braço direito para administrar efetivamente as empresas; pessoas que dão nome para criação das empresas, núcleo contábil e jurídico (para não deixar as pequenas empresas ultrapassarem o valor e saírem do Simples); e pessoas que efetivamente vão aos processos licitatórios com empresas A, B, C e fazem toda a logística.
Serviços aparentemente ocorreram, apesar da fraude em licitação
Sobre os R$ 71 milhões apurados – que, segundo o MP, é um valor conservador, ou seja, tem relação apenas com os 178 municípios de Goiás –, o promotor diz os que serviços ocorreram. “Contudo, não podemos admitir o enriquecimento ilícito por meio de fraude.”
De acordo com ele, o Ministério Público possui mecanismos para buscar a restituição da sociedade. “As prefeituras, até então, não tinham ciência disso. Uma decisão, agora, autoriza o MP a compartilhar as informações com os municípios para tomarem as devidas providências.”
Segundo Sandro, o próximo passo é oficiar as prefeituras que, percebendo a fraude, não tem outra escolha a não ser anularem os contratos. “Cada município tem sua realidade. Mas é possível a contratação emergencial para que a cidade não fique desguarnecida e para que as fraudes não prevaleçam.”
Prefeitura de Goiânia sobre a na Comurg
À época, a Prefeitura de Goiânia informou, por meio de nota, que está à disposição para colaborar com as investigações. Ressalta ainda que as informações iniciais apontam para suposto esquema ilícito, que teria acontecido em gestões anteriores.
“Não existe investigação contra servidores públicos ou por crime de improbidade administrativa. Apenas foram coletados documentos para subsidiar a investigação contra um grupo empresarial”, diz a nota.
A prefeitura ainda informa que o Executivo municipal se mantém à disposição da Justiça para quaisquer esclarecimentos e fará acompanhamento do caso para a adoção de todas medidas cabíveis, caso sejam identificadas.
Em nota, a Comurg disse que está colaborando e à inteira disposição do MP para esclarecimentos sobre a ação a respeito de processos licitatórios provenientes de contratações realizadas em gestões anteriores. “Informamos que a Companhia não é alvo da investigação e que é de interesse da Comurg que tudo seja esclarecido”, diz o texto.