“Nosso interesse é salvar o Hugo”, afirma auditora sobre termo de interdição
Segundo ela, falta de medicamentos e insumos básicos está sobrecarregando a equipe do hospital, deixando pacientes com atendimento aquém do esperado e aumentando riscos biológicos e de infecção na unidade
Falta de remédios, salários atrasados, profissionais sobrecarregados e pacientes desassistidos. Esta tem sido a realidade do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) há meses. No entanto, o desabastecimento da farmácia tem provocado um colapso no atendimento, o qual pode ser percebido nos últimos 90 dias. Esta é a constatação da auditora fiscal do trabalho, coordenadora da Saúde da Superintendência do Ministério do Trabalho em Goiás, Jacqueline Carrijo, responsável por lavrar termo de interdição de paralização de atividade na tarde de segunda-feira (90). Agora, Estado e Gerir, Organização Social (OS) responsável pelo Hugo, devem apresentar, até a tarde de quarta-feira (26), um plano estratégico de emergência para limitação e manutenção do atendimento. Por enquanto, a unidade continua funcionando.
“Vamos ajudar a elaborar. Esse plano é assunto novo pra eles [Gerir e SES], precisam de ajuda. Da nossa parte estamos cooperando ao máximo com equipes técnicas, porque o interesse é de salvar o Hugo”, ressalta Jacqueline.
Segundo ela, o mencionado termo não concede prazo para regularizar a situação, mas determina para a referida data a apresentação de um plano de contingenciamento. “Equipes definirão, de forma clara, objetiva, técnica e responsável, quais pacientes continuarão atendendo; e até quando, com esse público, conseguem manter a normalidade no serviço, de acordo com a disponibilidade da farmácia, da qual também quero um relatório. Infelizmente, o hospital tem que se concentrar em quem consegue atender. Assim, conseguirão garantir os atos médico, da farmácia, da enfermagem. Porque ontem, antes de receber R$ 2 milhões para compra de medicamentos, o Hugo estava um caos”.
A determinação foi feita na tarde de segunda-feira, quando Jacqueline se reuniu com a Gerir e com o titular da Secretaria de Estado da Saúde (SES), Leonardo Vilela. Também estiveram presentes o procurador-geral de Justiça, Benedito Torres; o presidente do Centro de Atendimento Operacional da Saúde, do Ministério Público, (CAO Saúde/MP), Eduardo Prego; e fiscais do Conselho Regional de Farmácia (CRF).
“Essa situação vem se arrastando há meses, mas se tornou crítica nos últimos 90 dias. Por isso, lavramos termo de interdição de paralização de atividade: desabastecimento da farmácia. Não tem como o Hugo continuar de portas abertas recebendo todo mundo. É preciso limitar o atendimento para pacientes que fazem realmente o perfil do hospital, para que seja possível manter a unidade funcionando. Como tratar pessoas sem luva, gazes, seringas, dipirona, equipo?”, questiona.
O problema é causado por falta de dinheiro. Segundo a auditora, o Estado não está fazendo repasses para a administração da unidade. “O secretário disse ontem que não estão havendo repasses da Secretaria da Fazenda (Sefaz). Para nós, entretanto, tem que ser feita uma previsão, tem que ser feito repasse, porque não existe milagre, existe pagamento. Despesas tem que ser pagas para continuidade e segurança do serviço. Não adianta receber todo mundo e não dar garantia de atendimento. À tarde, a farmácia recebeu R$ 2 milhões, quantia que só é suficiente para manter estoque de medicamentos durante 15 dias”.
Segundo ela, porém, Leonardo Vilela não deu garantias de que conseguirá fazer os repasses requeridos e necessários. “Então, vamos manter o termo de interdição. Vão nos apresentar o plano de emergência, mas a partir de então só poderão atender pacientes do perfil da unidade. Isso quer dizer que pessoas do interior, entre outras que aparecem com problemas diversos, e que hoje recebem atendimento no Hugo, não poderão mais ser recebidas, infelizmente”.
Com o plano entregue, o a superintendência do irá acompanhar a execução do plano tal como foi entregue. Para Jacqueline, o esforço “heroico” da equipe de saúde já estava se tornando insustentável, por falta de itens de primeira necessidade. “Medicamentos estavam sendo substituídos, contra o protocolo, e médicos ligavam para a farmácia para saber o que poderiam receitar a seus pacientes, porque tudo estava zerado. Então, vamos acompanhar. Terá que ser como estiver escrito, para que não haja risco de acidentes ocupacionais e infecções, porque, quando se trabalha em situação crítica como essa, riscos biológicos, da unidade, e mentais, dos profissionais, aumentam. Muitos enfrentam depressão e ansiedade. Imagine ter que salvar vidas nessas condições”.
“Situação crítica”
De acordo com a presidente do Sindicato dos Trabalhadores(as) do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde/GO), Flaviana Alves, ainda falta dipirona e gazes, mas o estoque de soro e luvas foi resposto. “No entanto, não tem mais antibiótico. Outro medicamento importante em falta é a Ranitidina, um protetor gástrico receitado a quase todos os pacientes. Isso é básico”.
Além disso, faltam profissionais. Enquanto o correto seria ter um máximo de sete pacientes para cada técnico de enfermagem, profissionais estão tendo que atender uma média de 11. “Não tem como atender bem. Tem que dar remédio, banho, trocar leito, isso demora. A maioria é paciente operado, com sonda. Então não tem jeito de se levar ao banheiro, tem que fazer tudo no próprio leito e quem está fazendo isso são os acompanhantes, porque não há funcionários suficientes para a demanda”.
Além disso, na segunda-feira (24), 30% dos maqueiros estavam de braços cruzados. “Eles estão com salários em dias, mas a empresa que os contrata não recebe direito há cinco meses. São situações muito graves que ficamos preocupados de o Estado não se movimentar para resolver”.
Respostas
O Estado respondeu em nota por meio da SES. “Nessa segunda-feira, 24/09, foram repassados R$ 2 milhões. Novos recursos serão repassados, de acordo com cronograma da SEFAZ. A unidade continua funcionando, e novas informações serão apresentadas nessa quarta-feira, 26/09, após definição do plano de contingência”. Procurada, a Gerir ainda não se manifestou sobre o assunto.