Novas imagens mostram um policial militar se ajoelhando no pescoço de um motoboy que estava sendo rendido na tarde de ontem, na Avenida Rebouças, área central de São Paulo. Enquanto o PM se ajoelhava no pescoço do rapaz, outros motoboys diziam: “Vai matar o cara!” e “ajoelhando no pescoço do cara!”.
As novas imagens foram obtidas pelo UOL e gravadas por um motoboy. É possível ouvir o homem que estava sendo abordado gritar “não consigo respirar” várias vezes.
A mesma frase se tornou emblemática depois da morte do segurança negro George Floyd, que desencadeou uma série de protestos antirracistas em diversos países. Floyd morreu depois que um policial branco ficou ajoelhado sobre seu pescoço por mais de oito minutos, durante uma abordagem em Minneapolis, nos Estados Unidos. Suas últimas palavras foram “eu não consigo respirar”.
Abordagem em São Paulo
No dia 14, a reportagem do UOL já havia mostrado um vídeo em que o mesmo motoboy, antes de ser derrubado no chão, gritava “eu não consigo respirar!” enquanto um policial o enforcava. Uma viatura da PM, de número M-23116, estava estacionada em frente à abordagem e foi flagrada na gravação pelos próprios motoboys.
O motociclista que gravou a cena disse à reportagem que viu a abordagem. “Tudo começou com o protesto dos motoboys, eles estavam passando na Avenida Rebouças e vários estavam com a placa tampada. Quando passou o comboio de motos e os batedores da polícia, ele [motoboy que aparece no vídeo] jogou a moto na calçada. Uma viatura parou e os policiais já desceram extremamente agressivos”, contou o rapaz, que pediu para não ser identificado.”Os policiais já desceram enforcando ele, e ele começou a gritar ‘socorro!’.”
Segundo a SSP (Secretaria da Segurança Pública), a abordagem ocorreu depois de PMs terem visto o rapaz com a moto em cima da calçada e com a placa encoberta. Ele participava de um protesto de motoboys, que cobram melhores condições de trabalho. Segundo a pasta, “o motociclista ofereceu resistência, sendo contido”.
O motoboy foi levado pelos PMs até o 14º DP (Distrito Policial), em Pinheiros. No local, a moto foi apreendida e a Polícia Civil requisitou exames de corpo de delito aos policiais e ao motoqueiro. Segundo a PM, o rapaz estava com a carteira de habilitação vencida desde 2019.
Todas as imagens foram enviadas à Corregedoria da PM, que vai analisar o conteúdo. Na tarde de hoje, o governador João Doria (PSDB) afirmou não ser conivente com violência policial. “Não compactuamos com nenhum tipo de violência de ordem policial, portanto não há nenhum temor de amanhã viermos a ser avaliados por estimular aquilo que nós não estimulamos”, disse.
Ao observar as imagens, o advogado Ariel de Castro Alves, conselheiro do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), afirmou que “foi uma abordagem abusiva, excessiva, foi utilizada a força de forma desnecessária”. “O rapaz aparenta não ter cometido nenhum crime, e estaria ali discutindo com os policiais, que já partem para a violência”, afirma.
Por meio de nota, a PM disse que após a denúncia do motociclista na Corregedoria, apura se houve excesso na abordagem. “Foi registrado um termo circunstanciado de resistência no 14º DP e a motocicleta foi apreendida administrativamente. A autoridade policial solicitou exames de corpo de delito aos policiais e ao rapaz, e encaminhou o caso ao Juizado Especial Criminal (Jecrim).”
Protestos dos motociclistas
A manifestação de ontem foi parte de uma série de protestos dos motociclistas que trabalham para aplicativos de entrega. Eles pedem melhores condições de trabalho, aumento do valor das entregas, fim das punições e bloqueios por parte dos aplicativos, contratação de seguro de vida e acidente para os trabalhadores, além de licença remunerada para os entregadores contaminados pela covid-19.
O sindicato relata que foi recebido pelo presidente da Câmara dos Vereadores de São Paulo —atualmente quem cumpre a função é Eduardo Tuma (PSDB)— para discutir o PL 578/2019, que trata da regulamentação da categoria e dos apps. A Câmara ainda discute o PL 130/2019, que pode obrigar o uso de placa vermelha a entregadores na cidade.
De acordo com o SindimotoSP, estava marcada para as 16h uma conciliação entre os motoboys entregadores e os aplicativos de entrega, com intermediação do (TRT) Tribunal Regional do Trabalho.
Investigação produzida pelo UOL aponta que uma manobra jurídica feita pela PM de São Paulo está travando investigações contra policiais militares envolvidos em mortes.