UFG/Caos na Educação

Pesquisadora que desenvolveu nanopartícula para tratar overdose critica cortes em bolsas

Pesquisadora da Universidade Federal de Goiás (UFG) responsável por desenvolver um projeto de nanopartículas que…

Pesquisadora da Universidade Federal de Goiás (UFG) responsável por desenvolver um projeto de nanopartículas que podem tratar overdoses de cocaína, Eliana Martins Lima, aponta riscos para o futuro das pesquisas com os cortes de bolsas de pós-graduação da instituição. Decisão foi tomada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que suspendeu 60 bolsas distribuídas em cursos de pós-graduação depois que o governo federal anunciou bloqueios financeiros na ordem de 30% na Educação.

Em entrevista concedida ao Mais Goiás, na manhã desta sexta-feira (10), Eliana relatou que esta decisão causa um impacto muito grande na instituição e que as bolsas eram um incentivo àqueles que não conseguem arcar com o custo do estudo superior. “Essa notícia e sua repercussão deixaram muito claro para todos nós o quanto a sociedade não conhece e não reconhece a relevância social daquilo que nós, das universidades públicas, produzimos. As federais representam o maior patrimônio do país em relação à expansão do conhecimento”.

Para Eliana, as instituições públicas de ensino superior não são apenas replicadoras, mas contribuintes para a construção da história que os livros publicam. Pesquisadora há mais de 30 anos, ela revela que o corte foi o mais cruel já feito na rede publica de Educação. Toda linha de pesquisa, segundo a docente, é dependente da sustentabilidade das fontes de fomento do Governo, uma vez que os investimentos para pesquisas são altos e seus resultados são colhidos apenas em médio e longo prazos.

“Prejuízo incalculável”

Conforme expõe a pesquisadora, a decisão colocou a UFG em uma “corda bamba sem saber quando seremos derrubados dela”. “Quando cortamos a fonte de financiamento, impedimos um jovem de realizar pesquisas. Isso faz com que nós fiquemos parados no tempo. O que esse governo não entende é que um ano ou dois que as pesquisas ficam paradas refletem em 10, 20 anos de atraso em relação aos países que não pararam”, explica.

Para a docente, o prejuízo desse atraso é incalculável e, como consequência, o Brasil terá de importar tecnologia de outros países e pagar mais caro por coisas que poderiam ter sido produzidas aqui. “Perdemos ideias incríveis das mentes brilhantes de nossos estudantes”, declara.

De acordo com pró-reitor de pós-graduação da Universidade Federal de Goiás (UFG), Laerte Guimarães Ferreira, o corte pegou a todos de surpresa. “Muitas áreas foram atingidas com essa decisão, que afeta pesquisas que vão de ciências farmacêuticas ao agronegócio. Foram perdidas 42 bolsas de mestrado, 16 de doutorado e duas de pós-doutorado”, completa.

Congelamento de verba

A Universidade Federal de Goiás (UFG) informou, na quinta-feira (2), que teve R$ 32 milhões congelados pelo governo federal. A verba corresponde a 30% do orçamento da instituição para custeio e investimento. Segundo informações da UFG, após o bloqueio de R$ 7,4 bilhões no orçamento do Ministério da Educação (MEC), a Capes comunicou que vai congelar bolsas que estão ociosas em programas de pós-graduação. Além disso, a concessão de novas bolsas será gradativamente reduzida para todos os cursos que têm nota 3 e que se mantiverem com esse índice na próxima avaliação.

Os cortes nas universidades federais do país acontecem após as declarações do ministro da Educação Abraham Weintraub, em uma reportagem publicada pelo jornal Estado de S. Paulo. Do total do dinheiro bloqueado da UFG, R$ 27 milhões correspondem à verba de custeio, recurso utilizado na manutenção, como o pagamento de água, energia, alimentação e bolsa estudantil. Os R$ 5 milhões restantes seriam destinados ao investimento na instituição, para a construção de novos prédios ou compra de equipamentos.

“Esse corte nos deixou extremamente preocupados! Atualmente, cerca de 90% das pesquisas desenvolvidas no Brasil são feitas dentro das universidades por meio da pós-graduação. Falar de pesquisa é falar de pós-graduação e falar de pós-graduação é falar em pesquisa. Para que as pesquisas apresentem resultados, é necessário investimento, auxílio àqueles que desejam ingressar neste meio. Contudo, infelizmente, a expectativa é de que esses cortes continuem”, declara Eliana.

Para o recolhimento do corte, conforme Laerte, a Capes alegou que as bolsas estavam ociosas. Porém, como existe rotatividade de bolsas, aquelas que foram suspensas estavam disponíveis temporariamente e não ociosas. “Para eu conseguir comprometer um aluno com pesquisa é necessário subsídio para este estudo. Caso isso não exista, podemos perder pessoas competentes e interessados na pesquisa científica. Isso impactará diretamente na qualidade e na continuidade das pesquisas realizadas pela instituição”, argumenta ele.

Pioneirismo

Doutora em Nanotecnologia Farmacêutica pela Universidade de São Paulo (USP), Eliana Martins Lima estuda o tema há 25 anos e orientou a referida pesquisa contra os efeitos da cocaína, que teve início há dois anos. O estudo, desenvolvido também pela aluna Sarah Rodrigues Fernandes é pioneiro no mundo e apresentou um resultado positivo em cobaias. Já existem perspectivas de testes em seres humanos.

A pesquisa é desenvolvida Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da UFG e utiliza de nanotecnologia para desenvolver uma partícula. Assim que entra no organismo, ela captura cerca de 70% da droga presente na corrente sanguínea. “Os estudos e testes mostraram que esse percentual é capaz de reverter os sintomas típicos de uma overdose, como a hipertensão arterial, que levaria à morte por insuficiência cardíaca”, detalha Sarah.

A pesquisadora Sarah ressalta ainda o pouco tempo de reação do remédio. “A pressão arterial e os batimentos cardíacos começam a voltar ao normal em cerca de dois minutos após a administração da nanopartícula que desenvolvemos”, disse Sarah.

Em pessoas

Eliane afirmou também que a partícula está pronta para ser testada em seres humanos. “A nanopartícula está pronta para ser utilizada. A pesquisa foi feita no mais alto nível de detalhamento. Nosso papel, enquanto universidade, é formar pessoas altamente qualificadas. Para fazermos os testes em seres humanos, precisamos de uma parceria com a indústria farmacêutica”.