PM foi responsável por 47,9% das mortes violentas de Trindade em 2021

Um levantamento feito pela Polícia Civil de Trindade revelou que a Polícia Militar (PM) foi responsável pela metade das mortes violentas ocorridas no município em 2021. O relatório calcula que a cidade teve um total de 48 homicídios registrados no ano passado. Desses, 23 ocorreram durante abordagens policiais, o que totaliza 47,9% dos casos. Além disso, 11 das vítimas foram atingidas por disparos feitos por policiais militares da 9ª Companhia Independente da PM (9ª CIPM).

O batalhão mencionado teve cinco PMs presos de forma preventiva nesta segunda-feira (21). Todos teriam envolvimento com a morte de Wilker Darckian Camargo, de 31 anos. A morte do homem causou comoção entre os moradores de Trindade e foi o que motivou o desenvolvimento do relatório, ao qual o jornal O Popular teve acesso.

Segundo a Polícia Civil, a pesquisa tinha o objetivo de reforçar o pedido de afastamento dos policiais das atividades nas ruas, bem como exigir a prisão dos mesmos.

Mortes violentas: entenda o caso de Wilker Darckian Camargo

O tenente A.C.G, o sargento W.A.O, o cabo E.C.C e os soldados J.V.M.S e J.W.L.R.M, são acusados de matar Wilker com três tiros. Segundo a denúncia, os policias já haviam rendido a vítima na casa dele quando efetuaram os disparos, no dia 10 de dezembro de 2021.

Um vídeo do momento da abordagem mostra Wilker desarmado e correndo para fora da casa. Nas imagens é possilv ver o momento em que o homem é rendido pelos policiais militares e levado de volta para a residência. Depois disso, testemunhas afirmam ter ouvido mais quatro disparos.

Uma perícia feita no local mostrou que só foram encontradas cápsulas das armas dos policiais, o que reforça que Wilker não reagiu a abordagem.

Um outro PM foi indiciado junto com o tenente por adulteração da placa do veículo usado para perseguir a vítima antes de alcança-la. O tenente também foi indiciado junto com mais outros três PMs por uma abordagem feita contra Wilker três dias antes, por abuso de autoridade.

O relatório chama atenção para o fato de que o tenente esteve envolvido em cinco ocorrências com mortes, assim como um dos soldados. Os outros três PMs presos aparecem em três abordagens fatais. Com exceção do tenente, os outros quatro integram uma mesma equipe. Nas investigações sobre a morte de Wilker, o tenente aparece como mentor, por ter coordenador e dado as ordens que resultaram no crime.

Relatório diz que afastamento temporário não é suficiente

O relatório tem 49 páginas e enfatiza que, sem a decisão da Justiça, a tendência é que o afastamento interno, feito a pedido da própria corporação, tende a ser temporário, o que não é suficiente e ainda coloca em risco outros cidadãos. “O afastamento é temporário e a tendência é que os indiciados voltem às ruas, matando outros suspeitos quando de suas abordagens policiais, quer por despreparo ou dolo”, diz o documento.

“Considerando o número de ações policiais (que resultaram em mortes) que envolvem os indiciados em um curto espaço de tempo, tendo eles agido por dolo ou culpa naqueles casos onde não atuamos na investigação, a ordem pública está ameaçada com eles patrulhando nossas ruas, afinal a missão da respeitada e honrada Polícia Militar é servir e proteger e, não, matar suspeitos, sendo eles bandidos ou não”, argumentou o delegado Carlos Douglas Pinto, que foi o responsável pelas investigações, em seu relatório final remetido à Justiça.

Para exemplificar seu argumento, o delegado citou o caso das mortes dos irmãos Kalebe e Victor de Paula Araújo,que também ocorreram durante uma abordagem policial em Trindade, mas em janeiro de 2020.

Justiça

O pedido da Polícia Civil foi acatado pela Justiça. A juíza Vivian Martins Melo Dutra afirmou na decisão que, pelo teor do relatório e da denúncia ofertada pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), a aplicação de “medidas cautelares diversas da prisão” seria “absolutamente insuficiente”.

Na denúncia, o MP cita que os policiais estão frequentemente em ocorrências onde há morte de civis. Este trecho foi grifado pela juíza em sua decisão.

A reportagem não localizou a defesa dos policiais. O que se sabe através dos depoimentos prestados e nos registros de ocorrência originais é que eles alegam que Wilker estava armado e teria atirado contra eles. Testemunhas negam ter visto a vítima armada e informam que ouviram quando ele avisou os PMs disso.

*Essa reportagem contou com informações apuradas pelo O Popular