PM pede que assentamentos rurais sejam monitorados em Goiás, mas não explica motivo
Líderes de movimentos sociais enxergaram a solicitação com receio de que isso se torne uma ferramenta de opressão
A Polícia Militar de Goiás pediu, através de um despacho, que os assentamentos do estado fossem monitorados. Em um dos itens, o documento solicita a identificação de quais os vínculos políticos das pessoas que vivem nos assentamentos. Líderes de movimentos sociais enxergaram a solicitação com receio de que isso se torne uma ferramenta de opressão. Até o momento da publicação desta reportagem, a PM não explicou qual o motivo e objetivo do monitoramento.
“Na medida que o Estado começa a fazer mapeamento sem explicar os reais motivos, há o receio. Existe a perspectiva de talvez tentar enquadrar movimentos como organizações criminosas, isso já aconteceu em Goiás nos últimos cinco anos”, considera o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Goiás, Gilvan Rodrigues.
O despacho está assinado pela 2ª Seção do Estado Maior Estratégico da PM e está endereçado ao 4º Comando Regional (4º CRPM). O comando mencionado é responsável pela região da cidade de Goiás (Goiás Velho).
O que diz o documento?
O documento solicita que seja feito um relatório que detalhe sobre os assentamentos. No relatório devem conter temas que estão divididos em quatro itens. No primeiro deles, o despacho pede a localização e o mapeamento dos “assentamentos/acampamentos, bem como a denominação do movimento”. Ou seja, deseja saber onde estão os movimentos sociais e quais são eles. Todo esse mapeamento seria feito por meio de coordenadas geográficas.
“Está explícito que o mapeamento busca grupos que lutam por terra. Luta essa que é um direito constitucional”, defende Gilvan. Segundo ele, o pedido de mapeamento afronta a democracia.
Apesar do primeiro item já ser um motivo de alerta, os itens de maior preocupação dos líderes sociais são os outros três.
No item dois, o documento pede: “Identificar e qualificar as lideranças locais desses movimentos, bem como levantar o quantitativo de pessoas em cada assentamento/acabamento (quantidade de crianças, mulheres e faixa etária dos integrantes desses movimentos)”.
O terceiro item pede a identificação e qualificação sobre envolvimento com políticos “(Federal, Estadual, Municipal)”. Por fim, o último item pede um “histórico de invasões, conflitos, ou qualquer assunto de interesse da segurança pública da região da Unidade”.
Denúncias
Segundo Gilvan, o grupo já denunciou o documento à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC). Existe uma expectativa de que em breve a denúncia seja apresentada à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.
“Também estamos tentando agenda na Assembleia Legislativa e no Tribunal de Justiça, para levar a preocupação sobre o que está sendo feito e o que pode vir a acontecer”, considera o representante.
De acordo com o coordenador do MST de Goiás, o movimento notou a presença de agentes que se identificaram como representantes do Estado em pelo menos quatro municípios, em assentamentos na cidade de Goiás, Aruanã, Palmeiras e Santa Helena.
A denúncia sobre a presença de agentes do Estado em assentamentos não foi comentada pelo Governo de Goiás. O Governo também não respondeu sobre o teor do despacho da PM.
Repercussão
Nas redes sociais, João Pedro Stedile, coordenador nacional do MST, classificou o documento como a comprovação de “espionagem dos movimentos populares” por parte da PM. “Espero que providências sejam tomadas contra a violação do direito de livre organização”, escreveu o Stedile.
Vazou que a PM de Goiás faz espionagem dos movimentos populares. O comando da polícia sempre esteve a serviço do latifundio. Antes não usavam farda. Agora usam e são pagos pelo povo. Espero que providências sejam tomadas contra a violação do direito de livre organização! pic.twitter.com/1KSvGpNpyd
— João Pedro Stedile (@stedile_mst) November 22, 2021
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*A entrevista de Gilvan foi feita pelo O Popular
*Larissa Feitosa compõe programa de estágio do Mais Goiás sob supervisão de Hugo Oliveira.