Réus do caso Martha Cozac são inocentados
Júri não atribuiu a autoria dos assassinatos de Martha Maria Cozac e o sobrinho dela, de 10 anos, Henrique Talone, aos réus Frederico da Rocha Talone e Alessandri da Rocha Almeida
Frederico da Rocha Talone e Alessandri da Rocha Almeida, acusados dos assassinatos de Martha Maria Cozac e do sobrinho dela, de 10 anos, Henrique Talone, ocorridos em 6 de outubro de 1996, foram absolvidos em julgamento nesta quarta-feira (8/6). A decisão foi divulgada pelo juiz Eduardo Pio Mascarenha da Silva após mais de 33 horas de audiência no 1º Tribunal do Júri de Goiânia.
Às 16h30, o juiz leu a decisão dos jurados. “Face, pois, à decisão soberana do júri, ficam os acusados já qualificados absolvidos das imputações quelhes foram feitas”, frisou na sentença.
Sete pessoas, cinco homens e duas mulheres formaram o conselho de sentença que, na primeira série de quesitos, relativa à vítima Martha Cozac, reconheceu a materialidade delitiva e sua consequência letalidade, não atribuindo a autoria do fato ao réu Frederico.
De forma igual, na segunda série de quesitos, dessa vez referente à vítima Henrique, apesar de reconheceram a materialidade, também não atribuíram a autoria do fato a Frederico. Além disso, os jurados não responsabilizaram Frederico nem Alessandri pelo crime de furto.
O julgamento
O julgamento teve início às 8h40 desta terça-feira (7), no 1º Tribunal do Júri da comarca de Goiânia. Ao todo, 21 testemunhas foram arroladas para serem ouvidas pela acusação e defesa. Pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), atuaram os promotores Paulo Ferreira dos Santos, Giuliano da Silva Lima e Paulo Eduardo Penna Prada. Os defensores foram Paulo Maria Teles Antunes, Ricardo Ribeiro Teles, Ricardo Silva Naves e Thales José Jayme.
Na manhã do primeiro dia, foram ouvidas sete testemunhas arroladas pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO) e a irmã da vítima, Cáthia Cozac, como informante, ou seja, ela não presta compromisso de dizer a verdade, devido ao parentesco com a vítima. Ela afirmou que pressentiu que alguma coisa havia acontecido com a irmã. “A gente não acredita como que uma pessoa havia morrido naquelas condições. Nem bandido merece morrer daquele jeito. Ela e uma criança. Foi muito triste dar a notícia para minha mãe”, contou chorando.
A costureira Célia Pereira Pires disse que trabalhou na confecção por oito anos e que estava presente no dia em que os corpos foram descobertos na empresa. Ela respondeu por dez minutos as perguntas da acusação e defesa, além de falar da rotina de trabalho de Martha na empresa.
Após o intervalo dado pelo magistrado, Iron da Rocha Lima Neto foi o primeiro a ser ouvido. Em seguida foi a vez do professor de jiu-jitsu Rafael Coelho Brito na academia em que Frederico foi aluno. Ele disse que na época do crime, o acusado já era aluno, mas não confirmou se ele estava na academia na hora do crime. “Eu não tenho condição de saber se ele estava na academia ou não”.
Também aluno da academia, Alberto de Castro Brito afirmou que conheceu Frederico porque também praticava jiu-jitsu. “Dentro da academia o ambiente era pelo esporte, não havia incentivo à violência”, disse, ao ser indagado pela defesa de como era o ambiente dentro do local. Ao final, ele afirmou que o Frederico era uma pessoa tranquila.
“Seu filho morreu, seu burro”
A tarde foi marcada pelo depoimento de mais de duas horas de Alonso de Souza Pinheiro, pai de Henrique Talone. Na condição de informante, ele discorreu sobre a notícia do falecimento do filho. Segundo ele, Elcione Maria da Rocha Talone, mãe de Frederico, ligou e disse que o filho dele havia morrido. “Ela me disse assim: Seu filho morreu, seu burro”.
Segundo ele, ao ficar sabendo do crime, ele foi ao até a sede da confecção de Martha Cozac e constatou que o local estava totalmente abandonado e garantiu que Elcione havia lavado o local do crime e não deixou ninguém entrar no quarto. “A porta do quarto onde eles estavam teve de ser arrombada porque estava trancada. No local do fato você não via nenhum vestígio. A Martha foi executada em cima da cama e os edredons foram lavados por Elcione”, relatou.
Devido a essas declarações, ele foi debatido pela defesa o que causou “mal-estar” entre acusação e os defensores , tendo o juiz que pedir ordem no 1° Tribunal do Júri. Familiares das vítimas e dos réus se manifestaram no plenário. “A próxima manifestação que houver, o oficial irá retirar a pessoa do local”, reiterou o magistrado aos presentes.
Elcione Maria da Rocha Talone, mãe de Frederico da Rocha Talone e tia de Alessandri da Rocha Almeida, declarou durante seu depoimento que tem certeza de que o filho e o sobrinho não tiveram participação no crime de Martha Cozac e do sobrinho Henrique Talone, de 10 anos. Ela nega qualquer envolvimento dos acusados no crime: “Nunca fariam isso”.
Segundo ela, Martha era uma pessoa “muito descuida” em relação à casa e dormia com a porta aberta. A testemunha negou que chamou Alonso, o pai de Henrique de burro. “Não é verdade que eu chamei ele de burro. Eu liguei para o Alonso e jamais o agredi, pelo contrário, não tinha razão para chamá-lo de burro”, disse.
Elcione frisou que era amiga de Martha e tinha Henrique como um filho. “Eu conheci a Martha quando eu me casei. Tudo que ela precisava era eu que socorria. Ela frequentava minha casa, dormia na cama dos meninos”, afirmou. Ela rebateu a declaração de Alonso que afirmou que Frederico trabalhou uns três meses na confecção de Martha.
Depoimento dos réus
Foi às 00h22, desta quarta-feira (8) que começou o interrogatório dos réus Frederico da Rocha Talone e Alessandri da Rocha Almeida, acusados de matar a empresária Martha Maria Cozac e o sobrinho dela, Frederico Talone, de 10 anos. Eles foram ouvidos após mais de 15 horas de depoimentos de testemunhas e informantes. O primeiro interrogado foi Frederico, que afirmou ao juiz que conhecia as vítimas e algumas testemunhas que prestaram depoimento hoje.
Segundo Frederico Talone, Martha Cozac foi até a casa dele e o convidou para trabalhar com ela. “Minha tia (Martha) foi lá em casa e me convidou para eu trabalhar com ela. Ela disse que estava sendo roubada e precisava de alguém de confiança para estar com ela”, relatou. Ele reiterou que trabalhou com ela exatos 27 dias e durante esse período tiveram uma “relação maravilhosa”.
“É possível que eles (Alonso e Valéria – pais de Henrique) querem responsabilizar um inocente porque tudo o que eles falaram aqui não é verdade. Eu não sou usuário de drogas”, disse. Ao ser questionado pela defesa sobre seus estudos ele emocionou e disse que teve de parar a faculdade porque foi apontado como assassino. Ao ser questionado sobre o que quer deixar para os filhos ele foi enfático ao dizer: “Honestidade, integridade e respeito”.
Após cerca de uma hora do interrogatório de Frederico, foi a vez do acusado Alessandri da Rocha Almeida ser interrogado e falou até as 3 horas. Antes de dar detalhes dos fatos, o réu garantiu que é inocente. Disse que desde que entrou na Policia Militar, a única vez que foi envolvido com processo na Justiça, foi pela operação Sexto Mandamento, que inclusive foi por causa desse processo da morte da Martha Cozac, mas, segundo ele, foi absolvido nessa ação penal. Ele afirmou que não conhecia a vítima. “Se eu tiver visto a Martha uma vez na vida é muito”, reforçou. Ele afirmou ainda que no dia do crime não estava em Goiânia.
Debates
Os trabalhos de debate foram iniciados pelo promotor Paulo Eduardo Penna Prado, que fez algumas explanações sobre a denúncia, mostrando os fatos de depoimentos que sustentaram as alegações finais do Ministério Público. Ele exibiu aos jurados fotos das vítimas anexadas aos autos e do local do crime, que segundo ele, confirmam a materialidade dos fatos.
Prado fez questão de destacar que o crime ocorreu de forma diferenciada. “A arramação que fizeram em Martha não é qualquer pessoa que faz”, insistiu.
Ainda pelo MPGO, o promotor Guiliano da Silva Lima destacou a impossibilidade de os representantes do MP terem a intenção de prender inocentes, assim como os magistrados de todos os graus. Ressaltou a importância de cada um dos envolvidos no trâmite processual e reiterou a veracidade das provas carreadas aos autos do processo.
Em seguida, o promotor de justiça Paulo Pereira dos Santos criticou a morosidade provocada pela excessiva quantidade de recursos permitidos pela lei. Falou também sobre a dificuldade de promover a Justiça quando os envolvidos são pessoas com grande poder aquisitivo e a facilidade de contratar profissionais capacitados para promover a sua defesa.
Em seguida, foi a vez da defesa. Paulo Teles iniciou os debates e insistiu na tese de negativa de autoria. Segundo ele, o guarda noturno não poderia conseguir identificar essas pessoas que supostamente teriamcometido o crime. Ainda de acordo com o defensor, na cena do crime foi encontrado um tíquete de uma lanchonete emitido às 18h30 no dia dos fatos. Ele afirmou que Frederico estava em São Luís de Montes Belos e Alessandri não se encontrava em Goiânia. “Quem teria cometido o crime se nenhum dos dois estaria em Goiânia?”, questionou aos jurados. E, em seguida respondeu: “Não cometeram o crime”.
Sobre o exame de DNA requisitado pela defesa e que foi negado pelo justiça, Paulo Teles garantiu que houve um erro. “O exame deveria ter sido feito não apenas para se descobrir os culpados, mas pelo menos para excluir os inocentes”, disse. Ele entregou aos jurados cópia do retrato falado que foi feito na época das investigações.
O advogado Ricardo Naves falou sobre a manipulação de provas e a conduta do delegado de polícia que conduziu o inquérito. Segundo ele, houve um duplo latrocínio e nãom duplo homicídio, lembrou que outros suspeitos apontados inicialmente não foram investigados pela Polícia Civil. Alegou contradições do inquérito policial e elaboração de relatório policial com vícios, que criou uma falsa esperança na família das vítimas, além de um grande embaraço para os acusados. Lembrou também que a defesa se desdobrou para apagar toda a campanha sórdida que foi feita contra os dois acusados.
O advogado Thales Jayme falou sobre a dificuldade de desmontar toda uma engrenagem montada durante 20 anos para incriminar os dois acusados, baseada no ódio e em intrigas. Argumentou que a acusação foi montada de forma “venenosa” e que não foi dada a eles o sentimento de indignação de terem sofrido uma “acusação tão impiedosa”, que desmoralizou a sua dignidade. Questionou a existência de provas concretas de que os dois acusados foram mesmo os autores do duplo homicídio, bem como a motivação para o cometimento dos crimes. Conclamou o corpo de jurados a usarem a consciência na hora de julgar os dois réus.
(Com informações do TJGO)