Saúde mental de estudantes preocupa universidades goianas
Discentes se sentem desamparados e pedem ampliação de auxílio psicológico em diferentes instituições
Ansiedade e depressão estão entre os principais problemas enfrentados por estudantes que sofrem com transtornos mentais durante um curso de ensino superior. Especialistas explicam que a exigência por resultados acadêmicos, a necessidade de manter um emprego e a vida social pesam de maneiras diferentes na vida de cada pessoa.
Lucas George, de 21 anos, é estudante de Psicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG). Ele foi diagnosticado com ansiedade, transtorno bipolar e depressão e conta suas maiores dificuldades. “A ansiedade e a depressão dificultam muito minha vida acadêmica. Enquanto uma me tira toda a disposição e dificulta fazer qualquer coisa, a outra faz eu me sentir mal por não estar fazendo as coisas, porque sempre tem datas para cumprir e trabalhos para entregar. Tudo isso gera uma pressão enorme”, contou.
Lucas faz terapia no Programa Saudavelmente da UFG, um programa de assistência psicológica para estudantes e servidores da universidade. Há quase dois anos na faculdade, Lucas conta que só agora conseguiu a vaga. “A demanda é enorme, eles priorizam os casos que são mais graves para as terapias individuais. Já nas terapias em grupo é possível conseguir uma vaga com maior facilidade”, disse.
Apesar da dificuldade, o estudante conta que o Saudavelmente é o melhor programa gratuito que ele já conheceu. “Já fui em um projeto semelhante na PUC, mas percebi que que o principal foco deles era servir de estágio supervisionado para os alunos e não ajudar a população. A terapia durava apenas seis meses e eu acho esse tempo insuficiente para a maioria das pessoas que procuram ajuda”, contou.
De acordo com o estudante, outra coisa que dificulta muito é a carga horária do curso. “Um curso em período integral dificulta a permanência de alunos que, muitas vezes, precisam trabalhar pra ajudar em casa. A carga horária causa desgaste mental em todos os alunos, além da enorme quantidade de textos que somos cobrados a ler”, disse.
Gabriel Elias, de 19 anos, passa por problemas parecidos. Diagnosticado com transtorno bipolar e síndrome do pânico, o estudante se sente desamparado pelos professores. “As crises depressivas me fazem faltar muitas aulas e o pânico faz ser muito difícil pra mim estar na sala de aula. Às vezes tenho ataques e preciso sair correndo da sala e como tenho vergonha do problema não conto para os professores, que muitas vezes não entendem o que acontece e só me consideram um péssimo aluno”, contou.
Causa
Segundo a psicóloga da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Maria Aparecida Oliveira, o índice de adoecimento entre estudantes universitários sempre foi significativo, mas em função das políticas públicas das instituições para maior inclusão no ensino superior, esse adoecimento tomou dimensões maiores.
“As universidades acabam assumindo o déficit de aprendizagem dos ensinos fundamental e médio. Muitos estudantes de baixa renda têm bolsa integral, mas precisam pagar por moradia, alimentação e transporte. Além disso, precisam acumular trabalho com estudo, e ainda tem a exigência social. Tudo isso acaba gerando um processo de crescente ansiedade e consequente comprometimento da autoestima e do amor próprio, reincidentes reprovações e até à evasão”, disse.
A psicóloga afirma que o índice de adoecimento mental tem aumentado em nossa sociedade e a universidade é só um recorte, portanto já recebe estudantes adoecidos. O próprio ensino médio, explica a psicóloga, apresenta vários fatores que adoecem o jovem adolescente: alto nível de exigência, escolha profissional sem a devida orientação, pressão para estudar e passar no vestibular, tudo isso pode suscitar a ansiedade e transtornos de ansiedade ou transtorno de humor, principalmente no estudante mais vulnerável emocionalmente.
Problemas
Segundo a professora de Psicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Elisa Sanabio Heck, depressão, ansiedade e ataques de pânicos são os principais problemas enfrentados pelos alunos que sofrem com transtornos mentais na universidade. Ideações suicidas também têm sido bastante frequentes. “Apesar de estar na coordenação do curso há apenas um ano, observo, como professora, que os alunos têm relatado mais problemas relacionados à depressão, ansiedade, ataques de pânico”, contou a professora que também é coordenadora do curso de Psicologia da UFG.
De acordo com Elisa, é difícil dizer se esses problemas são causados por uma série de fatores ou por um fator específico, pois cada estudante é um caso único. “É possível, por exemplo, que no caso de um estudante, a ansiedade ocorra em função de um fator específico, como escrever um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) ou apresentar um seminário. No caso de outro estudante, a ansiedade pode ser um problema ocasionado por uma série de fatores, não só atuais como também históricos, como pressões familiares, cobranças rígidas feitas pelo próprio sujeito, mudanças produzidas pelo contexto universitário, dificuldades de lidar com metas a longo prazo, entre outros”, explicou.
Assistência
Para ajudar esses alunos, a professora da UFG explicou que em alguns casos, uma rede de suporte social, família e amigos, por exemplo, pode fazer a diferença. Entretanto, na maioria das vezes, é necessário buscar ajuda de um profissional da saúde, psicólogos e psiquiatras, mais especificamente. “Na UFG existe o Programa Saudavelmente, por exemplo. O aluno deve entrar em contato com o programa para agendar um contato inicial, entretanto a demanda é muito grande. Além disso, há atendimento psicológico gratuito também no Centro de Psicologia e no CEPEA (Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão do Adolescente), ambos ligados à Faculdade de Educação da UFG”, disse.
Maria Aparecida explicou que as universidades têm feito investimentos em programas de apoio a estes alunos, como atendimento psicológico individual e em grupos, palestras e oficinas. A PUC Goiás mantem vários Programas, como o Programa Qualidade de Vida Acadêmica, que oferece atendimento em orientação e apoio psicológico individual e em grupos, com encaminhamento à rede conveniada para atendimento em psicoterapia.
Além disso, existe o Programa de Orientação Acadêmica (PROA), o Programa de Acessibilidade, bem como cursos online gratuitos oferecidos pela Coordenação de Educação à Distância. “Estudos estão sendo desenvolvidos para o fortalecimento dos programas existentes e criação de uma rede de atendimentos que possa dar conta de acolher a todos os estudantes que necessitam de apoio para superar seus problemas”, afirmou a psicóloga.
*Juliana França é integrante do programa de estágio do convênio entre Ciee e Mais Goiás, sob orientação de Thaís Lobo