Aliciamento

Trabalhadores em condições análogas à escravidão são resgatados em Aparecida de Goiânia

Aliciador trouxe 20 homens do Nordeste com a promessa de dar a eles trabalho digno, mas acordo não foi cumprido quando eles chegaram na cidade

Auditores Fiscais do Trabalho da Superintendência do Ministério do Trabalho em Goiás apresentaram à imprensa na tarde desta quinta-feira (6) o caso de 20 trabalhadores flagrados em situação análoga à escravidão. Eles trabalhavam na construção de um condomínio residencial na chácara São Pedro, em Aparecida de Goiânia.

Os trabalhadores foram encontrados na obra no dia 20 de março, após a Superintendência do Ministério do Trabalho em Goiás receber uma denúncia sobre a situação desses empregados, explica a auditora fiscal, Sharena Andrade. No local, os fiscais encontraram diversos homens trabalhando legalmente no acabamento do prédio, mas 20 deles estavam em situação análoga a escravidão. “Eles foram aliciados de cidades onde não há oportunidade de trabalho, onde a miséria impera, e foram trazidos com a promessa de receber alojamento e alimentação por conta, além do salário. Mas isso não aconteceu quando eles chegaram aqui”, relata a servidora.

Segundo Sharena, o aliciador trouxe trabalhadores do Piauí, Bahia e Ceará entre os meses de dezembro e fevereiro para Aparecida de Goiânia com a promessa de dar a eles moradia, alimentação e um salário de R$ 250 por cada apartamento finalizado. “Mas chegando aqui eles não receberam moradia, nem alimentação e tiveram que se virar. Eles receberam apenas o primeiro aluguel, depois a alimentação foi fornecida por um tempo e descontada, então eles ficavam devendo aquele valor referente a alimentação, e os próximos alugueis eram por conta deles”, ressalta a auditora.

Os salários também estavam atrasados e os trabalhadores começaram a contrair dívidas para comprar alimentos e gás de cozinha. Eles ainda viviam, conta Sharena, em alojamentos com péssimas condições de higiene e segurança. “Eles trabalham com trabalho braçal por longas horas a fio, carregando saco de gesso nas costas, e aí chegavam em casa e não tinha chuveiro: eles tomavam banho em uma canequinha. Eles dormiam em colchões esfarrapados. Tinha outro alojamento que eles usavam uma água de um poço, uma água ruim e eles usavam para tudo: para beber, tomar banho, cozinhar.”

Após o flagrante, os trabalhadores foram encaminhados para um hotel, onde permanecem até hoje. Agora, a Superintendência do Ministério do Trabalho em Goiás está negociando a rescisão do contrato dos empregados com a empresa e associações responsáveis pela obra. “Está muito difícil fazer o levantamento de todo esse dinheiro porque as verbas rescisórias desses trabalhadores ficaram em torno de R$ 150 mil”, avalia a auditora.

Dinheiro Público

A obra do Residencial Sebastião Vieira, em Aparecida de Goiânia, é financiada pelo Minha Casa Minha Vida (MCMV) e três associações sem fins lucrativos respondem pela gestão da construção. Um dos problemas encontrados pelos auditores é que os responsáveis por essas associações são pessoas carentes, também beneficiárias do programa do governo federal. “Nós não conseguimos encontrar ninguém com capacidade financeira até agora para bancar [a rescisão dos trabalhadores]”, explica Sharena.  “Isso é algo que, inclusive, depois de finalizar a nossa parte, nós vamos entregar um relatório para o Ministério Público Federal para investigar a utilização do dinheiro público nisso”, acrescentou.

Além das associações, uma empresa terceirizada, que contratou os trabalhadores, também responderá pelo desrespeito as leis trabalhistas. Contudo, o proprietário dela também não tem condições de arcar com a rescisão. “O dono da empresa terceirizada é uma pessoa muito simples. Em depoimento ele disse que o aliciador chegou e propôs uma parceria: ele traria os trabalhadores e o dono da empresa assinaria a carteira, emprestaria o CNPJ”.

Hoje os trabalhadores receberam parte das verbas da rescisão contratual e a outra parte ainda será negociada entre as partes. Eles também receberão uma guia de seguro desemprego específico para trabalhadores que foram encontrados em condição análoga à escravidão e devem voltar para a terra natal deles em breve.