Veja tudo que se sabe sobre o caso do homem que matou o ex-sogro, em Goiânia
Rapaz é investigado por matar o ex-sogro com um tiro na cabeça, em uma farmácia da capital
A Polícia Civil prendeu, na noite desta quarta-feira (29), o ex-servidor público Felipe Gabriel Jardim Gonçalves, de 26 anos. Desde segunda (27), ele estava sendo procurado por matar o ex-sogro, João do Rosário Leão, de 63 anos, com um tiro na cabeça, em Goiânia. O caso ganhou grande repercussão em Goiânia pela violência com que o suspeito agiu antes e durante o crime.
O Mais Goiás reuniu todas as informações, confirmadas pela Polícia Civil, Polícia Militar, Tribunal de Justiça de Goiás ou por familiares da vítima. Confira abaixo:
Homem que matou o ex-sogro tem histórico de violência
Conforme consta no sistema TJ-GO, Felipe responde a três processos de ameaças e crimes contra a mulher no sistema judiciário goiano. Um deles, em janeiro de 2021, é referente a uma mulher com quem ele se relacionava, que conseguiu medidas protetivas contra ele baseadas na Lei Maria da Penha.
Informações da Polícia Militar (PM) apontam que esse pedido aconteceu porque Felipe agrediu a mulher após uma festa, por uma crise de ciúmes.
Ao Mais Goiás, a PM ainda detalhou um longo histórico de delitos que tiveram boletim de ocorrência registrados contra o suspeito, de 2017 até o ano presente. Entre as ocorrências, estão casos de disparo de arma de fogo em via pública, acidentes de trânsito e até mesmo uma adulteração de veiculo automotor.
Todo esse histórico não impediu que Felipe se tornasse por um tempo soldado do Serviço de Interesse Militar Voluntario (Simve) da Polícia Militar. Ou mesmo, que o rapaz tivesse uma arma registrada em seu nome para a prática de tiro esportivo, na modalidade Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador (CAC). Vale dizer, que essa modalidade não permite a circulação com a arma de fogo.
O histórico também não atrapalhou que, pouco tempo antes de cometer o crime, Felipe tivesse sido nomeado gerente de sinalização da Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM) de Goiânia.
Depois que matou o ex-sogro, ele acabou sendo exonerado do cargo público.
Abusos psicológicos e ameaças durante namoro com filha da vítima
Durante cerca de 1 ano, Felipe teve um relacionamento sério com Kênnia Yanka. A mulher é filha de João do Rosário, que foi assassinado na última segunda (27). O relacionamento foi marcado por abusos psicológicos e ameaças da parte de Felipe.
À reportagem, ela explicou que, inicialmente, o investigado se apresentava como ‘uma pessoa maravilhosa’ e do bem. Sendo assim, nunca passou pela cabeça de ninguém que ele pudesse cometer tal crime contra a família. Entretanto, com o passar dos meses, o homem começou a apresentar comportamentos cada vez mais agressivos e abusivos com Kênnia.
Segundo ela, o ex-namorado a xingava, ameaçava e agredia. “No início se mostrou uma pessoa maravilhosa, mas depois foi se mostrando um monstro, abusivo. Ele me batia, colocava arma na minha cabeça e ameaçava, que se eu largasse ele iria matar toda minha família”, diz a mulher.
Ainda de acordo com Kênnia, sua mãe havia pedido para ela terminar o namoro com Felipe em algumas ocasiões, após saber o histórico de violência do rapaz. No entanto, a jovem tinha medo de por fim a relação, por não saber como Felipe reagiria.
Felipe prometeu matar família da namorada 15 dias antes do crime
Cerca de 15 dias antes do assassinato do pai, Kênnia Yanka gravou o até então namorado. Na ocasião, o Felipe afirma que irá matar todo mundo que ‘mexer com ele’, inclusive, o filho de Kênnia, que tem apenas 4 anos de idade e é fruto de outra relação
“Pode me denunciar, pode vir me matar que eu vou matar todo mundo antes disso. Eu mato todo mundo. Não estou nem aí. É melhor cada um no seu canto, sem mexer com ninguém, porque se mexer comigo um fio, eu mato seu filho, eu mato todo mundo. Eu tô ficando doido”, diz o suspeito sem saber que estava sendo gravado, enquanto a mulher chora.
*Alerta: esse vídeo pode causar gatilho emocional, por conter palavrões e mensagens de ódio
Discussão no sábado (25)
Também de acordo com a ex-namorada de Felipe, no último sábado (25), a família havia chegado em casa depois de ter passado por duas festas juninas. Felipe queria ir embora para a casa dele, mas a namorada e o sogro pediram para que ele dormisse lá porque estava bêbado.
A situação causou uma discussão bastante violenta, onde Felipe apontou uma arma para o sogro e para Kênnia e atira para cima. Toda a situação aconteceu na casa de João do Rosário e foi registrada por câmeras de segurança. “Ele começou a gritar comigo e meu pai falou: ‘você não gritar com ela não’. Ele já pegou a arma e atirou para cima. Na mesma hora já apontou para o meu pai. Eu entrei na frente e ele ficou com a arma na minha cara”, relata Kênnia.
Vale citar, que esse foi o dia em que o pai de Kênnia viu pela primeira vez o Felipe sendo agressivo e apontando a arma para a filha. Foi depois disso que João do Rosário procurou a polícia. Esse fato teria sido o motivo de ele ter cometido o crime, segundo a Polícia Civil.
Defesa aponta outra versão da briga
O advogado de defesa do rapaz, Júlio de Brito, aponta uma outra versão para a discussão de sábado (25). Segundo ele, Felipe realmente esteve na festa junina com Kênnia e sua família. Porém, precisava ir embora para trabalhar. A situação, no entanto, teria causado uma briga entre o casal, já que na visão da defesa, Kênnia seria “possessiva e desequilibrada” e estava com ciúmes que o rapaz a deixasse na festa.
Durante a discussão, João do Rosário teria defendido a filha e dado um tapa em Felipe. Depois, pegou a chave do carro dele e escondido. Quando Felipe já havia chamado um uber, Kênnia o teria chamado para pegar a chave de volta, na casa da família dela. Lá teria acontecido uma nova briga, pois a jovem teria mudado de ideia e desistido de entregar o objeto.
Vazamento de informações
Depois que Felipe apontou a arma para o rosto do sogro e de Kênnia, os dois terminaram o namoro. Durante a manhã de domingo (26), João do Rosário foi até a delegacia e denunciou o rapaz por disparar a arma para o alto e também por ameaça.
Kênnia afirma que o pai tinha um plano de se preparar para qualquer represália de Felipe, quando a denúncia chegasse ao conhecimento dele dias depois. João do Rosário era um policial civil aposentado e conhecia o processo das denúncias. Porém, não houve tempo para que a vítima se protegesse, pois o rapaz descobriu sobre a denúncia no dia seguinte.
O delegado do caso, Rhaniel Almeida, afirma que Felipe tem um amigo que é soldado do 42º Batalhão da PM. Este homem lhe fornecia acesso contínuo ao sistema de boletins de ocorrência das polícias goianas. Na segunda-feira (27), o soldado da PM contou à Felipe da denúncia do ex-sogro.
Em depoimento, o amigo de Felipe alegou que não sabia do que se tratava a ocorrência. Isso porque Felipe tinha dito que estava estudando para concurso da PM e queria saber se havia algum registro contra ele que pudesse prejudicá-lo.
Por conta dessa infração, o soldado pode responder por violação de sigilo funcional.
Tentativa de suicídio
O advogado de defesa de Felipe alega que toda a situação da briga com a família de Kênnia causou ao cliente muito estresse e um provável surto psicótico. Uma das provas disso, é que o rapaz teria tentado suicídio no domingo (26).
“Pelo que eu tive conhecimento, ele estava em um surto psicológico (sic). Não sei se ele é inimputável ou não. Somente uma junta médica nomeada pelo tribunal vai poder decidir isso. Eu não posso te afirmar se ele estava ou não [em surto]. Provavelmente, uma junta médica poderá te afirmar isso. Mas, pelo que eu ouvi nos áudios, que estão na mídia, ele aparentemente estava”, afirma Júlio.
A defesa afirma que, pouco antes de tentar suicídio, Felipe enviou uma foto para a ex-namorada para mostrar a situação. Após ver a imagem, Kênnia teria ido até a casa do rapaz e implorado para que ele reatasse o namoro com ela. Porém, como Felipe teria negado e ela teria dito que o pai dela o mataria. Questionada, a defesa não apresentou nenhuma prova deste momento.
À reportagem, Kênnia confirmou ter recebido foto do ex-namorado, mas negou que tive ocorrido qualquer coisa depois disso. Ela ainda destacou que o sangue que aparece na foto é do dedo de Felipe, que ele havia cortado bêbado na festa junina quando tentava abrir uma lata de cerveja.
A mulher compartilhou com o Mais Goiás a foto que recebeu de Felipe no domingo (26). Na imagem, que mostra apenas um dos braços do rapaz, é possível ver marcas de sangue, mas nenhum corte no braço.
O crime
Felipe teria descoberto sobre a denúncia na manhã de segunda-feira (27). Pouco antes de cometer o crime, ele ligou para Kênnia e avisou que mataria o pai dela por isso. “Eu fui correndo atrás do meu pai, mas ele não atendia. Eu peguei o carro e fui para lá, só que o pneu furou e eu não consegui. Quando eu desci para pedir ajuda, ele ligou para dizer que matou meu pai e ia atrás de mim”, disse ela.
João do Rosário era um policial civil aposentado e tinha aberto uma farmácia em sociedade com o outro genro. Foi na drogaria que o crime aconteceu, na frente de uma das filhas do idoso. A mulher, inclusive, está gestante.
Câmeras de segurança da farmácia registraram o momento do crime. Felipe entra, surpreende o ex-sogro enquanto aponta uma arma. Ele atira na cabeça do idoso. Depois, salta sobre o balcão e atira novamente. Em seguida, foge. João do Rosário foi atingido no peito e na cabeça.
A vítima chegou a ser socorrida e levada em estado grave para o Hospital de Urgências de Goiás (Hugo), mas não resistiu e faleceu algumas horas depois.
Buscas
Policiais civis da Delegacia de Investigação de Homicídios (DIH) passaram por pelo menos quatro cidades de Goiás em busca de Felipe. As buscas se guiaram por denúncias anônimas. Além da capital, policiais foram a endereços em Piracanjuba, Cristianópolis e Aparecida.
A corporação tomou as devidas providências para inserir o nome de Felipe até mesmo no banco de dados de foragidos da Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal), para o caso de uma tentativa de fuga do país.
“A defesa nos procurou uma única vez para falar sobre a possibilidade de entregá-lo. Mas, como nada de concreto foi feito, nenhuma data, nada, nós continuamos com as nossas buscas em Goiânia e cidades do interior. Tudo leva a crer que ele não vai se entregar. Inclusive, vamos iniciar os trâmites para que esse mandado seja compartilhado com a Interpol, caso o suspeito tente sair do país”, enfatizou o delegado na época.
Prisão
Na noite desta quarta (29), a polícia localizou Felipe escondido em uma casa no Conjunto Riviera. Em entrevista coletiva à imprensa após a prisão do suspeito, o delegado Rhaniel Almeida disse que o rapaz foi capturado depois de 60 horas de buscas. A corporação recebeu uma informação de que ele estaria no setor informado e depois de uma busca por 30 endereços, ele foi localizado.
Além do suspeito, policiais também encontraram a arma usada no crime, uma pistola 9mm, e o veículo utilizado na fuga. O ex-funcionário público estava na companhia de pelo menos seis familiares, que ajudavam a escondê-lo.
“Quando a gente chegou e percebeu que ele estava lá, ele ficou tentando se esconder na cozinha. A gente conseguiu localizar ele lá, verbalizamos de maneira muito contundente e ele não esboçou reação”, afirmou o delegado.
Ainda de acordo com Rhaniel, o suspeito se mostrou “indignado” com a prisão, mas não falou nada sobre o crime até o momento. O delegado ressaltou que ele ainda será interrogado, mas que acredita que é possível que ele não tenha saído de Goiânia desde o crime.