Se salve
Deveríamos nos dar a oportunidade da tentativa, da vergonha da exposição. Correr mais riscos. Ter menos medo da lágrima. Equilibrar mais a vida, se entregar menos ao trabalho. Ter a vida como mais protagonista da própria vida.
De mamando a caducando, estamos todos procurando encontrar um lugar confortável no mundo. Um lugar onde nos caiba, com nossas grandezas e defeitos exorbitantes. Com nossos medos infantis, com nossos problemas adultos e nossa fé de criança. Estamos todos na mesma estrada, e essa estrada é cheia de cacos de vidros deixados por nós e pelos outros. Porque você sabe, o tempo não pára para que nos consertemos. Estamos todos quebrados, tentando nos colarmos enquanto andamos. Enquanto corremos, pra não perdermos o trem, o ônibus, o trabalho, a estação e as oportunidades.
Passamos boa parte da vida nos recriminando por sermos como somos. Tentamos nos enquadrarmos na forma do aceitável. Da medida do corpo, da medida do sentimento, da medida da vida. Procuramos incansavelmente tribos para nos alocarmos. Para nos sentirmos menos estranhos e nos perdoarmos com mais rapidez, ironicamente, pela nossa pressa, pela nossa ânsia, e por não nos cabermos outros.
A verdade é que esperamos mais dos outros do que eles podem nos dar. Esperamos que apareça alguém que nos entenda e nos abrace com nossas falhas, estragos e defeitos. E a real mesmo, é que estamos pouco abertos para receber. Porque se relacionar dá trabalho, dá preguiça, mesmo sendo inevitável. Então ficamos nas margens, porque assim só molhamos os pés e nos poupamos da fadiga de nos verem desnudos e molhados da entrega que escancara nossa alma.
Esperamos muito dos outros, mas não deveríamos esperar. Deveríamos entrar nessa água e matar nosso ego, que por orgulho todos os dias assassina um pouco da nossa essência.
Deveríamos nos dar a oportunidade da tentativa, da vergonha da exposição. Correr mais riscos. Ter menos medo da lágrima. Equilibrar mais a vida, se entregar menos ao trabalho. Ter a vida como mais protagonista da própria vida.
Mas temos medo. Temos preguiça. E pra evitar fadiga, nos privamos do próprio oásis de ser o que se é.
Há um rio se afogando em nós. Não esperemos. Não deixemos secar.