Babenco confronta e elabora a própria morte em documentário feito por viúva
O filme "Babenco - Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou" é dirigido por Bárbara Paz
Diante de um câncer que o acompanhou por cerca de 30 anos, o diretor Hector Babenco (1946-2016) teve, na iminência da morte, a oportunidade de deixar uma espécie de filme-testamento sobre sua obra e sua vontade de viver.
O filme “Babenco – Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou“, dirigido por Bárbara Paz, viúva do diretor, foi debatido no último encontro do Ciclo de Cinema e Psicanálise, ocorrido nesta terça (25). O evento é organizado pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), em parceria com o Museu da Imagem e Som (MIS) e o jornal Folha de S.Paulo.
O filme traz cenas da dura realidade da doença, com falas de Babenco no hospital, mas também costura imagens de longas do diretor a momentos de sua vida. Desse mosaico, resulta a luta de Babenco contra a morte e um testemunho da vontade de viver -e produzir mais- do diretor.
“É uma luta contra o esquecimento, porque, quando esquecemos, a perda se dá por completo e pode haver um processo melancólico. Vemos o esforço inimaginável que Babenco faz para elaborar a própria morte”, diz Silvana Rea, psicanalista que participou do debate.
O crítico Inácio Araújo considerou admirável “a perpétua não aceitação da morte e a elaboração transformada em filme feita pelo diretor”.
Essa vontade de viver como mote de um filme sobre a doença fica evidente logo no trailer do documentário, em que o diretor balbucia a frase que compõe o título: “no dia da minha morte tem que ter um médico dizendo ‘morreu, mas o coração não quer parar'”.
Nascido na Argentina e naturalizado brasileiro, Babenco foi autor de filmes como “Pixote” (1980), “O Beijo da Mulher-Aranha” (1985), indicado ao Oscar de melhor filme naquele ano, e Carandiru (2003), entre outros.
O documentário, vencedor do prêmio de melhor documentário em uma mostra do Festival de Veneza em 2019, começou sendo dirigido por Babenco, que passou o bastão para Barbara Paz quando a doença começou a debilitá-lo a ponto de impedir seu trabalho.
A psicanalista Luciana Saddi, que mediou o debate, contou sobre quando escutou dele o relato sobre a doença. “Fiquei impressionada com a capacidade de Babenco de colocar isso em linguagem e contar em detalhes o que sentia”, disse.
“Neste documentário, ele coloca seu próprio corpo como espetáculo”, definiu Araújo. “E faz esse filme que nos faz partilhar as dores, as angústias e os momentos fugazes de felicidade que exprimem o prazer de viver que ele tem”, completou.
O Ciclo de Cinema e Psicanálise é promovido quinzenalmente pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, em parceria com a Folha e o MIS.
O próximo debate será no dia 8 de junho, às 20h, sobre o filme “A Pedra da Paciência”, de Atiq Rahimi. O filme ficará disponível no Mubi por um mês a partir do dia 1º de junho.