FICA 2016

Bossa nova, natureza e Jobim

Conversamos com Daniel Jobim sobre a abertura das Olimpíadas, ornitologia amadora e muito mais

Retornando à Cidade de Goiás após atuar como jurado na edição de 2015 do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (FICA), o músico Daniel Jobim, neto do lendário Tom Jobim, abriu um espaço na sua agenda apertada de eventos relacionados às Olimpíadas para se apresentar no Palácio Conde dos Arcos no centro da antiga capital goiana.

Ele acabou de fazer o maior show de sua vida: cantou Garota de Ipanema para Gisele Bündchen durante a abertura dos Jogos Olímpicos do Rio, ao vivo, para bilhões de pessoas ao redor do planeta: “Foi uma experiência maravilhosa, tanto eu quanto Gisele sabíamos que seria algo inesquecível. Fizemos dois ensaios. Achei tudo perfeito. A Gisele estava linda. Não fiquei nervoso. Eu tava sozinho, sem banda, só com o fone. Qualquer coisa que você errasse, respirou na hora errada, perdeu o tempo, ia aparecer pra trilhões de pessoas. Podia ter tado errado”.

Apaixonado pela natureza e por cinema, Daniel contou que já recebeu convites para compor trilhas de filmes e que tem até vontade, mas que acha que agora ainda não é o momento. Mas já teve um gostinho trabalhando ao lado do avô e do pai: “Meu avô fez várias músicas pra filmes, uma delas ele até me chamou pra ajudar a compor. Eu falei pra ele ‘não, você faz a música e eu só gravo’, mas ele disse ‘não, é fácil! Vem compor’ e aí a gente ia e gravava e no dia seguinte a gente tinha que fazer tudo de novo porque ele mudou a canção (risos), aí ele vinha todo sem graça e falava ‘eu mexi um pouco na canção’. Várias vezes já me convidaram pra fazer trilha, mas eu recusei. Eu prefiro fazer uma ou outra canção para um filme, acho que prefiro isso a fazer uma trilha. Não que eu não tenha vontade, um dia eu posso fazer, mas agora eu prefiro compor mais de devagar e fazer shows, meu caminho é mais cantar ao vivo e ter esse contato com o público”.

O músico disse que seu interesse pelo piano e pela música veio naturalmente e que ele realmente aprendeu todo com sua família: “Eu sempre tive uma curiosidade e gostava muito do trabalho do meu avô e do meu pai. Ninguém me forçou, sabe. Com 10, 11 anos, eu já comecei a tirar alguma música deles e meu avô até brincou ‘olha, existem outros compositores’ (risos). Eu componho uma coisa ou outra, não igual meu avô que levantava cedo todos os dias e começava a exercitar os clássicos. Ele compunha muito, centenas de canções. Eu faço muito menos, faço uma boa a cada vários anos (risos). É o que o povo chama de músico bissexto. Mas eu gosto muito das minhas músicas, são poucas, mas são boas”.

Sobre o FICA, Daniel acredita que é uma oportunidade única de conhecer não apenas sobre ecologia, mas sobre cinema no mundo todo, especialmente pelo fato de que é difícil ter acesso a estas produções fora do circuito de festivais: “É uma ótima experiência e a chance de ver filmes que depois você não vai ter acesso e que dão um ótimo panorama do mundo todo. Vou fazer o show esse ano com um repertório com temáticas mais ecológicas, com passarinhos, vou dar uma ênfase nelas. Pra mim, este festival é muito enriquecedor, com um tema importantíssimo”.

Sobre a importância da música da conscientização das pessoas sobre o meio ambiente, Daniel acredita que as canções são veículos poderosos: “A música é uma forma interessantíssima de passar uma mensagem. Pense no tema sobre o combate à fome na África, teve o We are the World, teve o furacão Katrina, um grupo de aristas se reúne com uma música nova… a música possui um papel importante”.

Ele acredita que as pessoas são muito desinteressadas nas temáticas ecológicas apesar dos problemas e das tragédias: “Eu fui em Mariana, sobrevoei lá de avião e está uma coisa horrível. O rio ainda está todo barrento, foi uma coisa muito triste. Espero que consigam pelo menos restaurar a cor da água do rio. Realmente precisamos falar mais disso. Por exemplo, ninguém fala sobre reflorestamento. Os rios estão todos sem suas matas e ninguém fala em reflorestar, as pessoas acham que é normal destruir o rio”.

Porém, ele não se considerada engajado; apenas cuida do sítio de sua bisavó, onde o avô compôs Águas de Março: “Nós reflorestamos, plantamos árvores, combatemos os incêndios, é um trabalho o ano todo. Não é um trabalho no mundo todo, só faço lá”.

Além disso, Daniel é um ornitólogo amador e adora conversar sobre aves e as observar: “Eu gosto muito de pássaros, sei todas as espécies, conheço penagem, pelo pio eu sei de qual que é, se é macho, se é fêmea, se tá com fome (risos). Esse interesse eu apprendi com meu avô, desde pequeno ele me levava pro parque da cidade, abraçar as árvores, era nossa diversão (risos). Ele também me emprestava o binóculo e me mostrava os pásssaros”.

Ele encerrou falando sobre o se repertório aberto para o show na cidade: “Trouxe várias canções, todas de temáticas ecológicas, meu avô sempre gostou muito da natureza, mas vou tocar o que o público pedir. Não troxe banda, é só eu. Estou fazendo muitos shows sozinhos e é bom, porque dá pra mudar na hora a harmonia, mudar a ordem das músicas. Acaba que nunca termino o show tocando exatamente da forma que estava planejado”.