Sophia Loren, aos 86 anos, fala sobre carreira e retorno à atuação com “Rosa e Momo”
Filme já está disponível na Netflix e pode render nova indicação ao Oscar de Melhor Atriz para Loren
Em entrevista ao IndieWire, Sophia Loren, atualmente com 86 anos, já coletou 10 Donatellos, 5 Globos de Ouro, 1 BAFTA, 1 Grammy e 3 Oscars – 2 por atuação e 1 pela carreira. Quando se mudou aos 17 anos para Roma, vindo de Nápoles, trabalhou com diretores de renome como Vittorio De Sica, Ettore Scola, Charlie Chaplin, Sidney Lumet e Martin Ritt. E atuou ao lado de lendas do cinema como Cary Grant (que abandonou para se casar com o produtor italiano Carlo Ponti), Marlon Brando, Richard Burton, Daniel Day-Lewis, e o seu favorito, Marcelo Mastroianni (com quem fez dezenas de filmes).
“Marcello era uma pessoa maravilhosa, um grande ator e o homem mais engraçado que já conheci em minha vida. Trabalhar com ele era lindo, maravilhoso. Ele tinha sempre piadas para contar e enquanto contava a piada, eu não sei o motivo, ele ficava tirando os sapatos e lambendo o dedo, rindo dele mesmo e de mim. Nós tínhamos uma maravilhosa amizade.”
Loren foi indicada pela primeira vez ao Oscar em 1962 pelo filme “Duas Mulheres” e outra em 1965 pela comédia “Matrimônio à Italiana”, e aceitou um Oscar Honorário pela carreira em 1991. Ano passado, retornou à atuação ao estrelar o drama indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme em Língua Estrangeira, “Rosa e Momo”, dirigido pelo próprio filho, Edoardo Ponti – que a trouxe para a tela depois de doze anos de hiato desde seu último trabalho no cinema. Sua última aparição foi no filme musical “Nine”, protagonizado por Daniel Day-Lewis.
“Rosa e Momo” acompanha uma sobrevivente do Holocausto chamada Madame Rosa (Sophia Loren), que cuida de algumas crianças sem lar e decide acolher um rapaz de 12 anos chamado Momo – que a assaltou recentemente. O drama é uma adaptação do livro francês escrito por Romain Gary, e que já foi levado ao cinema em 1977 com “Madame Rosa”, estrelado por Simone Signoret e ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro na época. Na nova versão, Ponti muda o cenário da França dos anos 70 para a Itália da atualidade, mas a história continua a mesma.
Apesar de ainda ficar bastante ansiosa quando aceita um novo papel, Loren está feliz por ter trabalhado ao lado do filho:
“Eu confio nele completamente… E eu estou absolutamente certa, ansiedade me dá força. Eu não estou fazendo algo comum. É impossível sentir coisas que você precisa sentir, de outro jeito, vai arruinar tudo. É uma grande coisa. E eu sei disso. Eu gosto de sofrer muito quando faço filmes.”
Em uma cena quando Madame Rosa congela, sem emoção, sem enxergar e ouvir nada, Ponti pediu à ela para subir ao telhado onde estava chovendo.
“Ele me falou para não se mover, e mais importante não piscar. A chuva foi muito difícil. ‘Ação!” E eu não pisquei. Eu estava quase cega. A cena foi longa, e toda aquela chuva. E eu ouço, ‘Corta!’, e nós terminamos. Eu desci e foi como se eu estivesse bêbada. Eu amei a cena. Foi bem dramática.”
A atriz veterana com mais de 100 filmes no currículo entende os desafios de trabalhar com atores não profissionais. Ela estava ansiosa para apoiar e atuar ao lado de Ibrahima Gueye, imigrante senegalês que conseguiu o papel de Momo numa seleção com mais de 300 crianças. O ator iniciante estava chateado por ter que ser tão mal com Loren, que ficou fã e passou a admirar. O diretor Ponti colocou os atores jovens morando na mesma casa que Loren para eles poderem se familiarizar.
“Ele era meu filho, meu bebê. Eu sabia que ele era inteligente e sensível. Cada vez que eu olhava para ele, ele ficava olhando para baixo. Se ele persistir, vai se tornar um bom ator. Todos precisam ser ajudados, não é uma profissão fácil de fazer na vida. Eles estavam morando com a gente quando estávamos filmando, saindo de manhã para trabalhar, só para ser gentil. Nós tínhamos uma piscina, nadávamos juntos, comíamos juntos, como se fosse família.”
Quando tinha 17 anos em Roma e trabalhou como figurante no filme “Quo Vadis”, estrelado por Elizabeth Taylor, Loren não sabia que se tornaria uma estrela de Hollywood. Ela vivia preocupada com sua próxima refeição, e voltar para casa segura para sua mãe solteira e irmã. A experiência da guerra em Nápoles lhe ajudou para o filme “Duas Mulheres”, no qual sem intenções, com ajuda de maquiagem, conseguiu o papel da mãe antes destinado para a atriz Anna Magnani – que recusou a proposta do diretor Vittorio De Sica.
“Foi assim que aconteceu, por acaso. Ele me pegou para ser protagonista, algo que nunca esperava, dois meses depois começamos a filmar.”
De Sica lhe deu lições de atuação que ajudaram bastante Loren:
“Simplicidade, autenticidade e ser verdadeira. Nós viemos de um lugar, Nápoles, e somos assim, as melhores pessoas do mundo. Nós gostamos de comer, de rir. Nós gostamos da vida.”
Foi assim em 1962 que Sophia Loren se tornou o primeiro ator (entre homens e mulheres) a ganhar um Oscar de atuação por um filme em língua estrangeira. Ela levou a estatueta de Melhor Atriz pelo trabalho com De Sica em “Duas Mulheres”. Ela não esperava ganhar e ficou em casa, festejando até receber um telefona com a notícia:
“Eu estava com medo, eu não esperava ganhar por um filme italiano.”
Depois de lançar sua carreira em Hollywood, Loren decidiu voltar para a Itália:
“Eu sou italiana. Eu queria voltar para casa, eu era tão jovem. Eu sentia falta de casa, das minhas coisas em casa, dos lugares que gostava, outros que adorava. E eu queria estar com minha mãe, minha irmã, minha família e meus amigos.”
“Rosa e Momo” já está disponível no catálogo da Netflix.