Como a estridência dos ‘Barões da Pisadinha’ revolucionou o forró no Brasil
Barões da Pisadinha ocupam o oitavo lugar entre os mais ouvidos do Spotify e são os quintos mais acessados do YouTube no Brasil
O primeiro disco dos Barões da Pisadinha não foi lançado exatamente pela banda. “Não foi nem a gente que subiu, alguém botou no YouTube. Quando a gente foi ver, foi uma surpresa. Estava lá, depois de coisa de 15 dias, mais de 1 milhão de visualizações”, conta o vocalista, Rodrigo Barão.
O álbum, um disco promocional com as primeiras gravações de Rodrigo ao lado de Felipe Barão, saiu há pouco mais de um ano e já trazia alguns dos primeiros hits da banda. Mas também punha em evidência nacional a nova cara de uma sonoridade derivada do forró que existe há pelo 15 anos -a pisadinha.
“Também não foi nem a gente que deu esse nome, foi o pessoal nas redes sociais. Antes, era os Barões do Forró. A mudança foi quando subiram o nosso disco. Gostamos e mudamos.”
A ascensão dos Barões da Pisadinha, que deixaram de ser desconhecidos para figurar entre os artistas mais ouvidos do país, foi rápida. Quando Neymar apareceu ouvindo o hit “Tá Rocheda” em Paris, no fim do ano passado, a dupla já era sucesso no Nordeste e começava a conquistar outras regiões do país.
De lá pra cá, eles só cresceram. Hoje, ocupam o oitavo lugar entre os mais ouvidos do Spotify e são os quintos mais acessados do YouTube no Brasil, com oito vídeos no Top 100 da plataforma. “Tá Rocheda” está há meses entre as mais tocadas do Spotify, enquanto outras músicas do grupo também frequentam a lista.
Isso sem contar o sucesso no Sua Música, plataforma gratuita de streaming de música que é a casa preferida de artistas de forró, brega e outros ritmos.
Mas a história de Rodrigo e Felipe Barão é de reinvenção a partir das necessidades. Felipe, que toca teclado no grupo, foi baterista e guitarrista antes de se encontrar nas teclas. “Ganhava mais dinheiro quando era Carnaval ou São João. O resto do ano era mais pingado”, ele diz.
Já aceito na cena de forró da região da cidade de Heliópolis, no interior da Bahia, Felipe começou a tocar teclado depois de ouvir um conselho da mãe. Até hoje, ele usa o mesmo Yamaha que comprou na época, em vez de gastar o dinheiro com uma guitarra.
A mudança não impactou só a vida de Felipe, mas foi a base para a estética dos Barões da Pisadinha. “A pisadinha não é nada mais do que um xote só que com uma caixa de samba. É um som de teclado, só que com o timbre médio agudo. É simples, não é complicado. Antes, a gente trabalhava com arranjos muito complexos, de difícil execução, mas o povo não entendia muito aquilo. Quando começamos a ser mais objetivos, foi quando caiu no gosto da galera, que abraçou essa sonoridade.”
A pisadinha já existe desde 2004, conhecida pelas mãos de um artista baiano chamado Nelson Nascimento, mas com pouca entrada em outras regiões. “As festas que a gente mais ia já eram de pisadinha”, diz Rodrigo. “Sou de 1993, então isso é de 2000 e poucos para frente. É o que a gente mais curte aqui.”
No começo dos anos 2000, o forró vivia o auge de sua fase eletrônica, ou estilizada, com nomes como Mastruz com Leite, Aviões do Forró, Limão com Mel, Cavaleiros do Forró, Saia Rodada e Calcinha Preta, entre muitos outros. Além de ter uma linguagem mais urbana, esses grupos acrescentaram elementos eletrônicos ao ritmo e, no auge, faziam shows com bandas numerosas e produções robustas.
“Entre 2000 e 2005, as bandas de forró eram quase uma orquestra”, diz Felipe. “O povo parava na frente do palco para olhar. Tinha bailarinas, coreografias, aquelas aberturas com temas. Hoje, o público não se importa mais com essa coisa de banda. Quer ouvir a música direto no paredão. Teve essa evolução. Tanto que as próprias bandas que faziam isso hoje aderiram ao esquema de paredão,” diz o membro do Barões da Pisadinha.
Quando começou, há cerca de cinco anos, a dupla ainda tinha uma estética mais parecida com a do forró eletrônico. Foi só mais tarde que eles decidiram investir na pisadinha -a princípio, uma ideia de Rodrigo. A mudança foi calculada para atingir o público dos paredões, as estruturas de caixas de som que animam as festas em muitas partes do país.
No interior da Bahia, diz Felipe, as festas com paredão acontecem em encontros em cidades diferentes. “Eles anunciam o encontro, reúnem todos os paredões da região, conjugam um no outro e começam a botar aquelas músicas, com aquele som ensurdecedor.”
O “piseiro”, alcunha informal do estilo dos Barões da Pisadinha, também é o nome do espaço dado para dançar a pisadinha. As danças são parecidas com as de forró tradicional, mas um passinho individual que remete ao arrocha foi popularizado pelo influencer Orlandinho, de Salgueiro, em Pernambuco, e também virou febre no estilo.
Atualmente, os paredões no Nordeste costumam tocar bregafunk e pisadinha, além do sertanejo, do funk e até do reggae. A ideia de levar uma sonoridade de forró adequada a esse tipo de aparelhagem guiou a dupla na criação da estética dos Barões da Pisadinha.
A caixa, instrumento de batida seca e mais aguda, que geralmente é o mais reconhecível de uma bateria, ganhou um novo timbre, virando uma espécie de “caixa sônica”.
“Passamos três meses tentando achar o timbre, a mixagem do som. Nossa intenção para pegar o público do paredão era focar os médios, por causa do som. No paredão, eles não buscam tanto o grave. Se você olhar realmente, o que deixa em destaque é a caixa com o médio, que faz aquele som.”
Toda essa estética da pisadinha já é difundida por outros artistas -entre eles Anderson e o Véi da Pisadinha, do hit “Solinho Agressivo”, Zé Vaqueiro, Biu do Piseiro e Vitor Fernandes-, entrou no repertório de gigantes do forró, como Wesley Safadão, Raí Saia Rodada, e até de sertanejos como Mano Walter.
Mas o apelo dos Barões da Pisadinha, que hoje são contratados de uma grande gravadora, fazem participação em programas de TV e gravam DVDs para plateias lotadas no Sudeste, é inédito.
O conjunto Barões da Pisadinha Divulgação O conjunto Barões da Pisadinha **** Nas letras, o grupo trata da cultura do interior e suas músicas mais famosas falam de romances, traições e decepções amorosas. “De um ano a dois anos pra cá, falam muito mais de uma cultura de matuto, de interiorzão, não se fala mais de ter carrão, lancha. Hoje, é mais focado no pessoal da roça”, diz Felipe.
“E a gente também gosta de uma farrinha, né? Quando a gente ia em festa de paredão e estava tomando umazinha, a gente observava as músicas que tocavam legal, que faziam dançar, para incluir no repertório.”
Segundo Rodrigo, isso faz com que a pisadinha consiga competir por espaço com o sertanejo, o gênero mais ouvido do país. “Estamos entrando em lugares que só o sertanejo entrava. Hoje, um pen drive [de música] que tem sertanejo também tem que ter uma pisadinha. Mais -se tiver um funk, tem que ter uma pisadinha. Com samba também, com o reggae também.”
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