Crítica: Kidding (seriado) com Jim Carrey
As duas temporadas estão disponíveis para assistir no Globoplay
Perder alguém que se ama muito. Separar do amor de sua vida. Ser a imagem de sabedoria e auto-ajuda quando a própria vida está desmoronando. Tudo isso é um pequeno esboço do personagem Jeff Pickles, interpretado por Jim Carrey em “Kidding”, esta série fenomenal que marca o retorno da parceria entre Carrey e Michel Gondry, diretor responsável pelo melhor filme do ator chamado “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” – e cujas duas temporadas lançadas estão disponíveis no Globoplay.
Desde a década de 90, quando se consagrou astro definitivo ao lançar em um mesmo ano “Ace Ventura”, “O Máskara” e “Debi e Lóide” – três sucessos de bilheteria que se tornaram clássicos absolutos da comédia -, Jim Carrey tornou-se o ator mais bem pago de Hollywood e um dos ícones do humor mundial. De 1994 até o início do novo século, o ator variou entre comédias de sucesso que eram parte de sua identidade, mas também se enveredou em dramas elogiados como “O Show de Truman”, “O Mundo de Andy”, “Cine Majestic” e o já citado “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças“, se provando um ator dramático cheio de nuances e empatia.
Longe dos holofotes, Carrey está se dedicando nos últimos anos a uma nova arte: a pintura. Alguns problemas pessoais também o levaram a uma rotina menos frenética de trabalho no cinema, atuando em filmes pequenos e pouco expressivos como “Dark Crimes” e “Amores Canibais”, e apenas voltando aos grandes estúdios como o vilão de “Sonic – O Filme”. Retornar à TV em uma série no panteão de “Kidding” é uma oportunidade única não apenas para colocá-lo novamente em um personagem trágico, mas solidificar seu talento, e versatilidade, entre o drama e a comédia.
Na trama, Carrey é Jeff Pickles, apresentador de um programa televisivo infantil e figura inspiradora para crianças e adultos (algo na vibe de Fred Rogers). Porém, sua vida muda completamente quando sua família sofre uma perda drástica e seu mundo começa a desmoronar.
Como manter a sanidade e continuar inspirando pessoas quando você mesmo está passando por um momento obscuro? “Kidding” é uma abordagem profunda e sutilmente emocionante dos percalços da vida que muitas vezes nos acomete sem pedir licença. Gondry constrói aquela mescla incômoda – no bom sentido, quem conhece seus filmes sabe o que quero dizer – de humor e momentos dramáticos mas sem deixar de lado a emoção, o que contribui para nosso engajamento na história e na identificação com o protagonista. Há momentos lindos de pura poesia, e outros intimistas que fazem de Jeff um ser humano próximo do público, e naturalmente identificável.
Nada mais oportuno para Carrey do que interpretar um personagem em crise existencial, atingido por duros acontecimentos na vida pessoal e que precisa manter a imagem indelével de uma pessoa sempre feliz e cheia de palavras de sabedoria (um espelho claro da vida do ator). Sua atuação carrega alguns trejeitos típicos de sua persona – ainda que bem contidos -, e por ter tanto em comum com o personagem, Carrey entrega momentos emocionantes. Alguns, inclusive, as emoções eclodem como uma bomba e em outros, apenas o olhar já diz tudo o que precisamentos saber, e sentir, sobre Jeff.
Infelizmente, o show teve apenas duas temporadas, mas ambas com o mesmo nível de qualidade técnica e narrativa. Além de Carrey, o elenco de apoio é também excelente formado por atores veteranos como Frank Langella, Catherine Keener e Judy Greer.
Um estudo de personagem, mas, acima de tudo, um estudo sobre a vida e suas prioridades, “Kidding” é um programa memorável e inesquecível. Recomendado!
Kidding/EUA
Ano: 2018-2020
Número de temporadas: 02
Criado por: Dave Holstein
Com: Jim Carrey, Frank Langella, Catherine Keener, Judy Greer, Cole Allen…