Violência sexual

“Feliz de provar que estava falando a verdade”, diz mulher que denunciou Lehart

Há dez dias, o músico foi condenado a nove anos, sete meses e seis dias de prisão pelos crimes de estupro e cárcere privado

Rita de Cássia Corrêa, mulher que denunciou o músico Leandro Lehart, do grupo Art Popular

“Minha vida hoje é feita de dores psicológicas, físicas, de medicações”, disse Rita de Cássia Corrêa em depoimento ao programa Fantástico, exibido pela TV Globo neste domingo, 18. Ela acusou o cantor Leandro Lehart, um dos fundadores do grupo de pagode Art Popular, de estupro.

Há dez dias, o músico foi condenado a nove anos, sete meses e seis dias de prisão pelos crimes de estupro e cárcere privado. O artista afirma ser vítima de uma “grande injustiça”. Além de descrever as agressões sofridas, Rita contou como sua vida foi transformada após o episódio.

Segundo ela, eles se conheceram em 2017, quando ela mandou uma mensagem elogiando o trabalho de Leandro em uma rede social. Ele então a convidou para conhecer o estúdio que fica em sua casa, na zona norte de São Paulo. Eles tiveram alguns encontros nos quais houve relações sexuais consensuais, e o abuso, diz ela, em 2019.

Na ocasião, Leandro sugeriu que eles terminassem no banheiro, onde poderiam tomar banho. No cômodo, ela conta que o cantor passou a agir de forma agressiva, a imobilizou e o que se seguiu foi um “ato grotesco e escatológico de violência”, diz a reportagem do Fantástico, contra o qual ela se debateu e lutou. Depois, ela conta que Leandro a deixou trancada no banheiro, dizendo que só a deixaria sair quando ela “se acalmasse”, para que conversassem.

Rita afirma que sofreu humilhação e racismo. “Você acha que eu queria o que, um relacionamento? Por que você acha que eu gostaria de uma negrinha como você?”, relata ter ouvido. Leandro também teria dito para que ela não procurasse a polícia nem divulgasse o ocorrido: “(Disse) que com o dinheiro que ele tem, os advogados dele iam agir contra mim e eu ia sair como aproveitadora”.

Quando voltou para casa em um carro de aplicativo chamado por ele, Rita de Cássia desabou. “Fiquei muito tempo tentando me higienizar, tirar aquele cheiro horrível, aquele gosto”, disse. Desde então, ela convive com problemas psicológicos, foi diagnosticada com estresse pós-traumático e faz tratamento psiquiátrico.

Ela também perdeu o emprego como supervisora de bilheteria no Metrô de São Paulo e chegou a tentar suicídio: “Me joguei de um lance de escadas muito grande, ali no desespero. Querendo fugir de tudo que eu estava passando”, conta.

Seis meses depois do abuso, Leandro voltou a procurá-la. Ela relata que, quando expôs a ele todo o sofrimento pelo qual estava passando, ele tentou se redimir. “Se te humilhei sexualmente e você está nessa situação, eu assumo isso. Com muita vergonha mas assumo. Porque fiz isso com uma mulher, em troca do meu prazer. Fui egoísta”, diz uma mensagem de texto mostrada por Rita ao Fantástico.

O músico ajudou-a com pequenas quantias de dinheiro algumas vezes e, em 2020, registrou um boletim de ocorrência. No documento, parcialmente exibido pelo programa Balanço Geral, da Record TV, na última sexta-feira, 16, ele descreve que “percebeu certa fragilidade emocional por parte dela, tanto que ela lhe confessou mais de uma vez que tomava remédios e que estava deprimida”, momento em que ele teria decidido não se relacionar mais com ela.

Segundo Leandro, a decisão não teria sido bem aceita por ela, que “demonstrava desejos e fetiches”, e que ele teria tido que “concordar com devaneios e questões absolutamente íntimas para tranquilizar a inquietude dela”. O fundador do Art Popular ainda relatou que os pedidos de ajuda da vítima tinham caráter de extorsão e chantagem.

Denúncia

Foi só quando Rita encontrou uma rede de apoio que conseguiu forças para denunciar Leandro Lehart. Em 2021, após passar por atendimento no projeto Justiceiras, que busca orientar mulheres vítimas de violência, ela decidiu procurar a polícia.

O processo tramitou em segredo de justiça e, no dia 9, foi confirmada a condenação em primeira instância do cantor. “Eu fiquei muito feliz de poder provar que eu estava falando a verdade e que, nessa história, a vítima fui eu”, conta Rita.

Ela afirma querer incentivar que outras mulheres se sintam encorajadas para denunciar crimes e agressões sofridas, “sendo uma pessoa pública ou não”. Em meio a toda a exposição que se seguiu após a divulgação da sentença, ela afirma: “Quem tem que ter vergonha não sou eu, é ele”.

Como o processo ainda não transitou em julgado (ou seja, a defesa ainda pode apresentar recursos), Leandro poderá recorrer da sentença em liberdade. A ação corre em segredo de Justiça.

Em nota, a defesa do compositor informou não poder fazer maiores considerações quanto aos fatos. “De toda sorte, Leandro e seus advogados seguem confiantes no Poder Judiciário e que a verdade prevalecerá, com sua consequente absolvição”, diz o comunicado.