Olha quem voltou!

Crítica: Em ‘Symptoms’, Ashley Tisdale é vulnerável ao falar de amor e ansiedade

Neste disco, a artista explora a voz em tons mais confortáveis, mostra habilidades como letrista e se apresenta com som moderno

Após um hiato de dez anos, a eterna Sharpay de High School Musical, Ashley Tisdale, voltou ao mercado fonográfico. Lançado nesta sexta-feira (3), Symptoms é um disco que mostra a cantora em seu estado mais vulnerável e pessoal. As nove faixas falam sobre uma luta diária contra ansiedade e depressão, além das marcas deixadas por um grande amor.

Capa do disco ‘Symptoms’, de Ashley Tisdale (Foto: Divulgação)

Pela primeira vez, Tisdale que mostra quem realmente é enquanto artista. No primeiro disco, Headstrong (2007), ela tentou ser uma mega popstar; no segundo, Guilty Pleasure (2009), tentou ser uma rebelde (cantando versos como “quebrarei as correntes, tomarei o controle / mostrarei um novo lado de mim / me comportarei mal”).

Em Symptoms, entretanto, Ashley Tisdale é apenas… ela mesma. Em faixas bastante confessionais, ela se mostra confortável enquanto intérprete e também prova que tem uma boa habilidade enquanto letrista.

Tisdale co-escreveu todas as faixas do disco e cada linha delas parece ter saído de um diário, uma mensagem no zap ou uma carta de amor da artista.

Isso já era perceptível com o primeiro single deste novo trabalho, Voices In My Head. Nesta faixa, Tisdale canta: “As vozes na minha cabeça sempre tentam me destruir/ Quebrar minhas pernas e me mudar”.

No segundo single divulgado, Love Me & Let Me Go, a história é a mesma, mas com um tom mais obscuro: “Estou me sentindo apagada, me sentindo desligada / Quando quero falar, nada sai da minha boca / Estou acorrentada à minha mente”.

Foto: Divulgação

“Quero que as pessoas em casa sintam-se menos sozinhas nessa jornada”, disse Ashley Tisdale

Em mais de uma entrevista, Ashley Tisdale confirmou que este é um trabalho confessional e que foi tomando este tom organicamente. “Fiquei entrando e saindo de estúdio por quatro anos e sabia que, para eu voltar ao mercado fonográfico, tinha que ser algo importante pra mim”, disse a cantora em entrevista ao Access Live.

A primeira canção escrita foi Symptoms, literalmente sobre os sintomas que a cantora sentiu quando teve depressão e ansiedade. “Quero que as pessoas em casa sintam-se menos sozinhas nesta jornada [em direção à saúde mental]”, completa.

Ao final do disco, a sensação é a mesma de um abraço quentinho em uma longa noite de inverno. Feeling So Good finaliza o projeto, acalmando qualquer um que sofra com os sintomas citados. “Acordo toda manhã / E  o mundo todo abre-se para a tomada / Cara, que incrível”, canta. “Nuvens não duram para sempre, espere o Sol aparecer / O passado é só o passado / Uma vez que se foi, acabou / Não há como olhar para trás / Não há tempo para perder”, finaliza.

Aaah… o amor!

Boa parte das faixas de Symptoms também trazem uma visão particular da cantora sobre o amor. Muitas canções narram as marcas deixadas por uma forte paixão e também como lidar com um sentimento tão poderoso enquanto ainda luta contra a ansiedade e a depressão.

A canção que abre o disco é bem clara quanto a isso: “Mantenha distância / Cuidado, não chegue muito perto / Passei isso para o que veio antes de você / Eu o sufoquei”.

Há também algumas reflexões bem maduras sobre relacionamentos. Em 2007, ela estava gamada: “Se você quer o mundo, você o tem / Se você quer a garota, você a tem / Eu farei isso para você” (So Much For You, do disco Headstrong).

Em 2009, estava amargurada: “Tá tudo certo, tá tudo ok / Estou muito melhor sem você / Não te pedirei desculpas” (It’s Alright, It’s Ok, do disco Guilty Pleasure).

Agora o discurso é outro. Em True Romance pela primeira vez Tisdale trata o romance como uma mulher adulta. “Amor verdadeiro é feito de altos e baixos / O que conta é o aqui e o agora / Você me deixa louca, mas sabe que eu te amo”.

E, em Vibrations, ela canta sobre os pequenos momentos do dia a dia que fazem um relacionamento sólido. O discurso é quase ingênuo, porém verdadeiro: “No sofá em uma sexta à noite / Podemos tirar um tempinho pra gente / Esquentando comida tailandesa no micro-ondas / Abriremos uma garrafa de vinho / Eu e você ficaremos bêbados / Chapados nessa onda de boas vibrações”.

Certeza que Ashley Tisdale sabe cantar?

Quando ainda era um nome relevante na indústria fonográfica, lá em meados de 2006, Tisdale era criticada pela sua habilidade vocal. Por vezes a cantora foi taxada de “sem graça”, “sem voz” e “sem talento”. Mas a verdade é que os produtores da artista a colocaram em uma posição difícil com o tipo de música que ela deveria cantar.

À época, forçaram Tisdale a cantar faixas de musicais, faixas pop com notas muito altas (típicas de qualquer vocalista de projetos da Disney) ou um pop-rock angustiado e cru. Nenhum desses gêneros faz jus à voz que Ashley tem.

Tendo ciência disto, o problema foi corrigido em Symptoms. Para o disco, Tisdale teve o cuidado de trabalhar em cima de um indie-pop que bebe das fontes do tropical house (o mesmo usado por Selena Gomez nos últimos e que também tem valorizado a voz dela) e do trap (popularizado por Ariana Grande em Sweetener).

Mais confortável ao cantar, sobretudo ao vivo, Ashley agora parece uma artista mais autêntica, com mais presença de palco e, finalmente, feliz com o que faz.

https://www.youtube.com/watch?v=P4uqDHIOt5M

Symptoms é bom?

Para resumir a ópera: Symptoms é um bom álbum!

Assim como outros artistas da mesma safra de Tisdale que fizeram comebacks no último ano (Avril Lavigne, por exemplo), a cantora amadureceu. O hiato de 10 anos entre um disco e outro trouxe consigo um autoconhecimento essencial para qualquer artista que ainda almeja certo reconhecimento no mercado fonográfico após muitos anos de carreira.

Dificilmente uma das novas faixas de Ashley pegará o topo das paradas de sucesso, dominadas por artistas mais jovens como Ariana Grande, BTS e Shawn Mendes. E ela sabe disso. Portanto, apostou em algo mais conceitual, mais agradável aos ouvidos e menos comercial.

A cantora soube trabalhar com melodias confortáveis e que favorecem suas maiores qualidades. E, de quebra, ainda falou de forma didática, delicada e pertinente um assunto que ainda é evitado pela sociedade: a saúde mental.

Demorou, mas Sharpay Evans finalmente venceu em High School Musical.