FUTEBOL

De volta após paralisação, times podem jogar a cada 3,4 dias até fim de 2021

Atletas poderão cumprir uma maratona inédita: entrar em campo 145 vezes até o fim do ano que vem

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A reta final dos Estaduais e a volta do Brasileiro e dos torneios continentais conduzem os clubes a um desafio jamais visto — não só pelos estádios sem público e pelos protocolos de saúde. Ao praticamente emendar a temporada 2020 com a de 2021, atletas poderão cumprir uma maratona inédita: de agora até dezembro do ano que vem, entrar em campo a cada 3,4 dias — sem pausa para as festas de fim de ano.

A CBF ainda não divulgou a data de início da temporada de 2021. Mas ela terá que acabar em dezembro, de preferência no início do mês, para permitir descanso a jogadores, que tiveram férias coletivas em abril passado por causa da pandemia. Ainda não há definição sobre intervalo entre as temporadas.

Ocorre que as competições de 2020 só vão acabar em 24 de fevereiro de 2021. De lá até o primeiro domingo de dezembro, haverá 81 datas disponíveis, o que inclui todos os fins e meios de semana. Mas, pelo calendário brasileiro, uma equipe que não jogue Libertadores pode atingir 80 partidas: até 17 pelo Estadual, 38 no Brasileiro, 14 na Copa do Brasil e 11 na Sul-Americana. É raro, mas as datas precisam estar disponíveis. Ou seja, salvo uma mudança de formato em algum torneio, é palpável que os Estaduais de 2021 comecem em 28 de fevereiro, quatro dias após o fim da temporada anterior para dar conta do calendário. Um time que jogar a Libertadores pode atingir até 79 jogos caso sejam mantidas a Recopa Sul-Americana e a Supercopa do Brasil no calendário — times que jogam a Libertadores entram apenas nas oitavas de final da Copa do Brasil.

Somando os 80 jogos possíveis em 2021 com as até 65 datas que restam a cumprir de 2020, o calendário nacional pode obrigar um time a jogar até 145 vezes em pouco mais de 500 dias, com os clubes ainda correndo risco de perder atletas para as seleções, que disputam Eliminatórias e Copa América.

— O que deveria ter sido pensado é: que espetáculo queremos produzir? A qualidade vai ficar prejudicada. No futebol brasileiro, nada é discutido: jogadores, treinadores, ninguém é ouvido. E tomam decisões assim mesmo — diz o técnico do Botafogo, Paulo Autuori.

Descanso e alternativas

Por ora, entidades de classe são cautelosas. Quando aceitou a antecipação das férias para abril passado, a Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf) negociou com a CBF uma pausa de dez dias no fim do ano. Mas o calendário foi divulgado sem o descanso. Segundo Felipe Augusto Leite, presidente da Fenapaf, a ideia é ouvir sindicatos locais.

O mundo real do futebol brasileiro nem sempre permite posições radicais. Há quem tema que reduzir a quantidade de jogos resulte em queda de receitas de TV, fragilizando clubes e vitimando atletas, que já sofreram com a pandemia.

— Não dá para ser xiita. É hora de ser razoável e entender que há uma situação que afetou a todos. Não significa que não possamos rediscutir esta transição entre a temporada 2020 e 2021. Mas os times grandes podem colocar jovens ou times alternativos nos Estaduais de 2021. Isso, junto ao grande número de jogos, pode ampliar elencos e até criar emprego — diz Alfredo Sampaio, presidente do Sindicato de Jogadores do Rio.

Ajuda da ciência

Mas trabalhar com dois times não é tão simples.

— Serão tantos os jogadores usados, que talvez não sobre ninguém ‘fresco’ — alerta Ramon Menezes, técnico do Vasco, que chama atenção para a vida pessoal dos atletas:

— Emendar uma temporada na outra vai mexer na vida de muita gente. O atleta vai respirar o clube, será necessário entendimento da família, trabalho mental. Ao treinador, restará ter atenção à recuperação, talvez pensar em treinos (sem oponentes, apenas posicionamento), reuniões, vídeo…

A ciência tentará manter jogadores saudáveis.

— Não é só a quantidade de minutos que um atleta joga. Dois atletas com mesma minutagem podem ter desgaste e intensidade de jogo diferentes. Será necessário monitorar, processar rapidamente uma quantidade grande de informação, manter o diálogo com a comissão técnica para dosar cargas — afirma Juliano Spineti, fisiologista do Fluminense.

Desafios de logística

De fato, a tarefa é complexa. Treinadores se verão cobrados a entregar resultados e tentados a realizar treinos táticos. Mas haverá limitações impostas pelo físico.

— Vamos seguir para jogos sem preparação ideal. Cada partida vai mostrando situações e você vai tentando moldar o time, adaptar, sem ferir a ideia principal que se tentava construir — diz Autuori.

No Brasil, há ainda os longos deslocamentos. Além de elencos maiores, times com mais dinheiro terão a vantagem de fretar voos.

— A malha aérea está reduzida. Nem sempre será possível escolher voos diretos, por vezes será preciso viajar dois dias antes — diz o preparador físico do Flu, Marcos Seixas. — Hoje, 48 horas após uma partida, há times que treinam, outros recuperam jogadores. Imagino que todos terão que optar por recuperar.