Sem liga, times formam blocos comerciais e podem faturar menos com Brasileirão; Globo negocia acordo
O contrato atual da Globo com os clubes se encerram em 2024
Os contratos dos clubes com o Grupo Globo pelos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro terminam em dezembro de 2024. A data coincide com o período em que as equipes querem colocar em vigor uma liga para gerir o torneio nacional. No entanto, divergências entre os times colocaram um freio nas negociações, criaram uma cisão e têm características para diminuir o faturamento com o torneio e adiar o desejo original de retirar da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) o poder sobre a competição.
O problema é que os clubes não se entendem quanto à divisão do valores para cada um. A Globo percebeu brecha para se candidatar a fim de continuar mandando no futebol brasileiro por mais três anos e apresentou uma oferta bilionária, mas talvez sem condições sozinha de fazer com que os clubes recebam mais pelos direitos de transmissão. Ela quer se juntar a um dos grupos que tentam organizar a liga, a Libra e a Liga Forte Futebol.
As negociações originais visavam a criação de uma única liga, que repassaria determinado percentual a um fundo de investimento ao longo de um certo prazo. Esse fundo captaria recursos para financiar a entidade, expandir a marca mundo afora e também vender os direitos de transmissão dos jogos, naming rights, placas de publicidade e outras iniciativas relacionadas à marca do Campeonato Brasileiro. Estimam arrecadar R$ 3,5 bilhões.
Uma liga única também ficaria responsável pelo estabelecimento de um calendário, tabela de jogos, definição e distribuição de horários e a redação de um regulamento, podendo estabelecer o fair play financeiro, com um teto orçamentários aos quais os clubes deveriam obedecer. Mas quando a partilha começou a ser desenhada, todos os clubes queriam ganhar mais dinheiro. O impasse se formou.
Com a divisão de times formada entre Libra e Liga Forte Futebol (veja abaixo suas composições), esses dois blocos ficariam restritos à venda dos direitos de transmissão, e a organização da competição continuaria a cargo da CBF, por ora. Dadas essas circunstâncias, as emissoras de televisão já começaram a se movimentar para apresentar aos dois grupos propostas para a exibição do Brasileirão a partir de 2025.
“O principal ativo de uma liga são os direitos de transmissão da competição, que, quando negociados de forma coletiva, como ocorre na Europa, tendem a aumentar a arrecadação se comparados a venda individual ou em blocos. Em ligas maduras, a exploração de novas receitas não tem fronteiras. A liga espanhola, por exemplo, tem um braço de tecnologia voltada ao esporte. A MLS, nos EUA, tem uma subsidiária que explora e comercializa direitos comerciais de terceiros, prestando assessoria à federação americana de futebol”, diz Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito esportivo.
A Globo ofereceu composição de R$ 1,1 bilhão aos times da Libra pela transmissão dos jogos das equipes da Série A na TV aberta, fechada e mais R$ 900 milhões de pay-per-view. A Amazon apresentou a proposta em conjunto, a fim de ter um jogo exclusivo por rodada em seu streaming, o Prime Video. Os times da Liga Forte Futebol ainda não receberam uma proposta formal, mas ela deve chegar nas próximas semanas, em valores abaixo dos apresentados à Libra. O total esperado é de R$ 2 bilhões. Esse dinheiro seria apenas de uma emissora.
Atualmente, os clubes arrecadam R$ 2,1 bilhões em contratos de transmissão, de acordo com o site esportivo da emissora carioca. A Libra, em um formato ideal de 40 clubes, todos da série A e B, estima receber ao menos R$ 2,8 bilhões pela exibição dos jogos para estabelecer uma divisão equilibrada de receitas, com 45% da distribuição igualitária, 30% pelo desempenho e 25% pela audiência. A Forte Futebol defende modelo semelhante de divisão, mas sem garantias aos clubes de maior torcida, como Flamengo e Corinthians.
No ano passado, o Palmeiras ganhou R$ 153 milhões da TV. O Flamengo embolsou R$ 256 milhões. A diferença de um para o outro foi de R$ 103 milhões. Com esse dinheiro a mais, o time do Rio pode ter um time mais forte. Os clubes não querem que essa diferença seja tão grande. É outro ponto da discussão.
“Uma liga envolve a transformação das marcas de cada um dos clubes, isoladas, em um conjunto de marcas relacionadas, gerando uma nova, que é a do produto ‘futebol brasileiro’, hoje, no resto do mundo, atribuída quase que exclusivamente à seleção. Uma liga trataria de melhor forma do calendário, dos horários dos jogos, de regulamentos dos torneios, relacionados aos atletas e suas relações com clubes, das especificações e usos dos estádios, de padronizações importantes para as transmissões, da forma como os ingressos serão disponibilizados e para quem, fazendo com que torcedores atribuam maior valor não somente aos jogos dos times para os quais torcem, mas para um conjunto de jogos, do qual o clube para o qual torce faz parte”, explica Thiago Freitas, COO da Roc Nation Sports no Brasil, empresa americana de entretenimento comandada pelo cantor Jay-Z.
Há outros players que podem aparecer na disputa pelos direitos de transmissão. Na TV aberta, o SBT tem investido pesado em torneios da Conmebol, como a Sul-Americana, e da Uefa, incluindo Champions League e fases derradeiras da Liga Europa e Liga Conferência. Procurada pelo Estadão, a emissora de Silvio Santos afirmou que “o SBT tem sempre o interesse em investir nos esportes, mas não comenta possíveis negociações.”
Clubes da Libra
Os times que fazem parte da Libra são: Atlético-MG, Bahia, Corinthians, Flamengo, Grêmio, Palmeiras, Red Bull Bragantino, Santos, São Paulo, Guarani, Ituano, Mirassol, Novorizontino, Ponte Preta, Sampaio Corrêa e Vitória.
Clubes da Liga Forte Futebol
Athletico Paranaense, América Mineiro, Coritiba, Cuiabá, Fluminense, Fortaleza, Goiás, Internacional, ABC, Atlético Goianiense, Avaí, Brusque, Chapecoense, Ceará, Criciúma, CRB, CSA, Figueirense, Juventude, Londrina, Náutico, Operário-PR, Sport, Vila Nova e Tombense. Vinculados a este bloco estão também Cruzeiro, Botafogo, Vasco e Coritiba, equipes que se tornaram SAFs e consolidaram o “Grupo União”.
Ronaldo Fenômeno defende criação de Liga e entendimento dos clubes
Em participação no podcast de Mano Brown, Ronaldo lamentou a situação dos clubes e a incapacidade de eles resolverem com clareza a criação da liga. Ele disse com todas as letras que o futebol brasileiro perde tempo e dinheiro com essa falta de organização.
Ronaldo defende o Cruzeiro nas negociações, mas diz que quer uma solução rapidamente para todos. Ele chegou a comentar que poderia organizar um grupo de clubes para fechar os direitos de transmissão dos próximos três anos a partir de 2025. Ronaldo entende que as ofertas já deveriam ter sido assinadas nesta temporada, para que haja tempo suficiente para que todos se preparem.
“São dois fundos de investimentos, querendo pagar bilhões, e os clubes não se entendem para pegar esse dinheiro. Não entra na minha cabeça a gente não se entender, profissionalizar o futebol e aumentar a receita da indústria do futebol”, afirmou Ronaldo.
Valores de 2022 e valores com a garantia da liga
Flamengo – R$ 256 milhões (2022) – R$ 275 milhões (com garantia da liga)
Corinthians – R$ 202 milhões (2022) – R$ 226 milhões (com garantia da liga)
Palmeiras – R$ 153 milhões (2022) – R$ 160 milhões (com garantia da liga)
São Paulo – R$ 133 milhões (2022) – R$ 151 milhões (com garantia da liga)
Santos – R$ 89 milhões (2022) – R$ 107 milhões (com garantia da liga)