Kaio Jorge se torna decisivo no Santos após repaginar jogo e hábitos
Esquadrão santista enfrenta o Boca Juniors na semifinal da Copa Libertadores da América
A imagem do técnico Cuca lançando-se de joelhos no gramado da Vila Belmiro nos minutos finais da vitória por 4 a 1 contra o Grêmio, no último dia 16 de dezembro, foi uma das mais lembradas da partida que assegurou a classificação do Santos às semifinais da Copa Libertadores.
A construção do feito passou, principalmente, pelos pés de Kaio Jorge, 18. Responsável por três dos cinco gols marcados pelo Santos nos dois confrontos contra os gaúchos, o jovem tornou-se um trunfo do técnico para o ataque santista.
Nesta quarta (6), no primeiro jogo das semis, ele terá seu maior teste em La Bombonera, diante do Boca Juniors, às 19h15 (Fox Sports transmite). A partida de volta, na Vila Belmiro, está marcada para a semana seguinte.
Para brilhar, Kaio Jorge teve que se reinventar durante a pandemia de Covid-19. Apenas dois dias depois da paralisação das atividades do Santos devido ao crescimento de casos de coronavírus no Brasil, em 17 de março, o jogador procurou o médico Eduardo Rauen, nutrólogo que atende a vários atletas de elite, entre eles o atacante Gabigol.
“Ele chegou para mim com 15,2% de gordura, e propusemos um desafio: treinar todos os dias e comer o que ele nunca havia comido. No primeiro mês, perdeu 4,2 kg de gordura, caindo para 10%. Víamos um jogador talentoso, mas que só hoje chamamos realmente de atleta”, diz Rauen à reportagem.
A composição física do atacante mudou profundamente nos últimos meses. Ele diminuiu para 8,6% a gordura corporal até a última medição, em novembro, perdeu 5,2 kg de peso total e ganhou 2,3 kg de massa muscular.
“Hoje, a composição física dele beira a perfeição. É um jogador com só 8% de gordura e extremamente forte. Teve ganhos de velocidade, resistência e não quer parar. Só saiu da dieta no Natal”, relata o nutrólogo.
Segundo Rauen, Kaio tinha ainda uma “alimentação de criança”, não comia nenhum tipo de salada, legumes ou frutas. Também não dispensava doces, especialmente paçoca.
Para ajudá-lo, a mãe, Atena Karina, se dispôs a fazer a dieta junto com o filho. Além de adotar horários regrados de alimentação, ele também passou a tomar suplementação e fazer trabalho extra com o preparador físico Sérgio Peres, em uma academia em Santos.
“No meu caso, os cuidados com o Kaio se restringem somente aos membros superiores. Para a posição em que joga, ele precisa muito do corpo. Fazemos um trabalho de prevenção de lesões, sem atrapalhar em nada o que já desenvolve com o clube. Ele é extremamente dedicado, diria que como poucos até. Qualquer folga que tem quer usar para fazer trabalhos”, conta Peres.
O jogador cresceu badalado no Santos. Chegou ao clube com 10 anos, aprovado em teste após impressionar os avaliadores em apenas cinco minutos, com poucos toques na bola.
Com 15, em janeiro de 2018, se tornou o jogador mais novo do clube a marcar um gol na Copa São Paulo, superando Neymar, em partida contra o Aliança-CE.
Apesar do status atual, ele só assumiu a titularidade de vez com a chegada de Cuca, em agosto. Antes disso, demorou a se firmar no time principal. Foi promovido em 2018 pelo próprio treinador, na sua passagem anterior pelo clube, e ficou quase todo o ano de 2019 esquecido por Jorge Sampaoli.
Também pesou na evolução uma mudança de mentalidade, a partir de um conselho de encorajamento que recebeu de Guilherme Dalla Déa, seu técnico nas categorias sub-15 e sub-17 da seleção brasileira, para uma conversa decisiva com Sampaoli.
“Eu falei para ele: Kaio, você bateu um pênalti na semifinal do Paulista com 16 anos, joga alguns minutos e está bom? Você precisa conversar com o seu treinador, sair da zona de conforto. Mesmo que seja na base, preciso que jogue para que eu possa convocá-lo”, disse Dalla Déa.
A conversa surtiu efeito. O jogador passou a ser utilizado pelo clube em jogos do sub-20 e do sub-23 e ganhou a convocação para o Mundial Sub-17, competição que saiu como campeão e principal goleador da seleção, com cinco gols.”
O Mundial deu muita confiança para ele. Desenvolveu uma inteligência tática e uma maturidade incrível de execuções sobre o que fazer dentro de campo. Sempre foi muito profissional, isso é mérito dele, mas hoje o vejo como um jogador pronto”, afirma o treinador.
“Ele tem muitos movimentos parecidos com o do Ricardo Oliveira [ex-atacante do Santos, hoje no Coritiba]. Mostra movimentos que só quem conhece muito faz.”
Kaio Jorge ocupava com o técnico Jesualdo Ferreira (treinador do time até agosto) a condição de homem da última bola, posicionado constantemente na área e limitado a um espaço mais restrito de campo.
No Paulista, com o técnico português, jogou sete partidas, quatro como titular, não fez gols nem deu assistências.
Com Cuca, se tornou mais móvel e passou a participar da construção das jogadas de contra-ataque pelo meio e pelos lados, além de auxiliar na marcação.
“Ele é importantíssimo. É jovem, não pode ficar lá na frente de costas. Assim o jogo não vai aparecer. Tem sido muito competitivo”, disse o treinador em outubro.
Sob o comando dele, o atacante elevou sua média de gols, passes, desarmes e bolas recuperadas durante uma partida. Ainda tem baixo desempenho em duelos aéreos vencidos. Na Libertadores, conseguiu sucesso em apenas 27% das bolas disputadas no alto, de acordo com números do Sofascore.
Com seus cinco gols, é um dos principais goleadores da competição sul-americana, atrás apenas de Fidel Martínez (oito), do Barcelona (EQU), Borré (River) e Salvio (Boca), ambos com seis.
BOCA JUNIORS
Andrada; Jara, Lisandro López, Izquierdoz, Frank Fabra; Capaldo, Diego González, Villa, Salvio; Tevez, Soldano. T.: Miguel Ángel Russo
SANTOS
John; Pará, Lucas Veríssimo, Luan Peres, Felipe Jonatan; Alison, Sandry, Diego Pituca; Marinho, Kaio Jorge, Soteldo. T.: Cuca
Estádio: La Bombonera, em Buenos Aires (ARG)
Horário: 19h15 desta quarta-feira
Juiz: Roberto Tobar (CHI)