Wallace volta à seleção aliviado mentalmente, mas busca ponto final: ‘Última vez’
Wallace ressaltou que o retorno é uma ajuda para o momento de transição da seleção brasileira
O oposto Wallace anunciou no dia 14 de agosto do ano passado sua aposentadoria da seleção brasileira masculina de vôlei. Quando fez o comunicado, não imaginava que viajaria para a Europa um ano depois, com a missão de defender o Brasil em mais uma edição do Mundial. Aos 35 anos, o medalhista olímpico está de volta, mas, segundo ele, trata-se apenas de uma ajuda pontual em um momento de reformulação do time, sem qualquer pretensão de estar na Olimpíada de Paris ou de ser chamado para outras competições.
“Agora, acho que é a última vez mesmo”, afirmou o jogador em entrevista ao Estadão. A resolução de não servir mais o País nas quadras veio antes da derrota para a Argentina, na disputa pelo bronze dos Jogos de Tóquio, em disputa que marcou a primeira edição da Olimpíada sem medalha para a equipe masculina desde o sexto lugar de 2000, na Austrália. Wallace iniciou a disputa olímpica certo de que aquele seria seu último ciclo, pois estava cansado da rotina, desgastado mentalmente.
“Uns três anos antes, eu já vinha amadurecendo a ideia de que seria só mais esse ciclo de Tóquio. Eu preciso descansar, dar uma aliviada na parte física, mental e ficar mais com a família”, disse. “Cada ano que você vem para a seleção é muito puxado, cara. Você não para! Sai do clube para a seleção, da seleção para o clube. Não tenho dúvidas de que conseguiria servir a seleção. É uma opção mesmo, não por achar que eu esteja muito abaixo. É mais pela opção de ter longevidade na carreira. Para ter isso, preciso ter férias. Para ter férias, preciso deixar a seleção”, completou.
Aliviado física e mentalmente após lidar com muitas críticas desde a frustração no Japão, o oposto mantém a posição de ficar longe da seleção para ter mais tempo livre e prolongar a carreira, mas o momento de reformulação vivido pela equipe nacional o fez se colocar à disposição do técnico Renan Dal Zotto. Eliminado pelos Estados Unidos nas quartas de final da Liga das Nações, no início de julho, o Brasil ficou sem dois de seus principais opostos para o Mundial que será disputado na Eslovênia e na Polônia, a partir de 26 de agosto.
Alan, de 28 anos, passou por uma cirurgia depois de romper o tendão de Aquiles durante a Liga das Nações, e Franco, de 32, pediu dispensa para tratar uma lesão mais leve. Diante do cenário, Wallace já esperava que seu nome fosse cogitado para encorpar o elenco ao lado de opostos mais jovens, caso de Darlan, que é irmão de Alan e tem 20 anos, e Felipe Roque, de 25 A expectativa se cumpriu e ele foi procurado por Dal Zotto.
“Eu estava aguardando que ele fosse me ligar porque já não tinha muitos opostos. Eu pensei: ‘velho, só tem os meninos mais novos’ Quando o Alan se machucou, o Renan me mandou uma mensagem, perguntou como eu estava. Ele falou: ‘e aí, você acha que dá para ajudar? Eu falei: ‘já vou começar a malhar, treinar a parte física’. A única posição que eu dei é que precisava estar bem fisicamente e tecnicamente para voltar. Ele falou: ‘beleza, para mim já basta. Só de você tentar já vai ajudar bastante, lá na frente a gente vê o que acontece'”, disse o veterano.
PASSAGEM DE BASTÃO
Wallace acredita que nem mesmo um eventual título inédito do Mundial, campeonato do qual tem dois vices (2014 e 2018), deve fazê-lo mudar de ideia sobre continuar na seleção. “É muito pontual. Espero que não aconteça nenhum incidente. E se acontecer, Deus nos livre, tenho certeza que teremos outros opostos que darão conta do recado. Se eu for bem ou não, ganhar ou não, acho que minha passagem pela seleção já foi bem feita demais”.
Jogador do Sada Cruzeiro desde maio do ano passado, após passagem pela Turquia, o oposto viveu muitas alegrias pelo clube de Belo Horizonte na temporada 2021/2022. Foi campeão mineiro, da Supercopa, do Mundial de Clubes, do Sul-Americano e, por último, da Superliga, no início de maio deste ano. Então, pôde aproveitar o tão desejado descanso e a família.
Reapresentou-se ao Cruzeiro em 11 de julho e, duas semanas depois, dia 26, estava entre os convocados para o Mundial. Assim, nos primeiros dias de agosto, voltou à rotina com a seleção no CT de Saquarema, sentindo-se bem fisicamente, embora veja os mais jovens em melhores condições. “O Darlan salta demais, tem uma força absurda, e o Roque tem dois metros e lá vai porrada, espanca a bola. Não estou mais neste nível, não tem como. Não dá, não tem como comparar, principalmente a questão física com os meninos”.
EXPERIÊNCIA E FRUSTRAÇÕES
O jogador de 35 anos também destacou que ainda tem alguns aspectos técnicos e táticos para trabalhar até a estreia no Mundial, mas avalia que sua experiência será a principal contribuição, principalmente na relação com os atletas mais novos. Segundo ele, o desempenho oscilante visto na Liga das Nações e a eliminação nas quartas têm de servir de aprendizado. Além disso, considera a inconstância parte natural da reformulação.
“Assisti a alguns jogos. O Brasil não jogou mal. Saiu bem de algumas enrascadas, perdeu jogos que não eram esperados. Infelizmente, faz parte do processo. Ninguém quer ser eliminado nas quartas de final. Isso vai fazer e fez os caras amadurecerem Virou a página, agora é outra história, o time está com a cabeça boa. Eles vão começar a entender, aprender a lidar com as derrotas, as frustrações, as vitórias”, opinou.
Wallace já teve de lidar com um pouco de tudo isso ao longo da carreira, como no vice-campeonato Olímpico de 2012, que completou 10 anos no último dia 12. Os brasileiros perderam a final para a Rússia e receberam a prata com desânimo, mas hoje veem o resultado de outra forma. “Lembro até hoje, eu estava triste e meus amigos bem cabisbaixos. Estava com um misto de sentimentos: ‘caramba, eu tenho uma prata olímpica’, mas triste. Muitos ali não iriam disputar outra Olimpíada. Com o tempo, fui assimilando e engolindo a derrota”, lembrou.
O ouro veio na edição seguinte dos Jogos, no Rio, em 2016, quando Wallace foi o maior pontuador e eleito melhor oposto do campeonato. Depois da prata amarga, mas valorizada, e a medalha dourada conquistada em casa, ele aceitou bem a decepção em 2021, no Japão, e está sereno quanto à decisão tomada há um ano. Ao mesmo tempo, espera ajudar o Brasil, provavelmente pela última vez, a voltar a um pódio durante a disputa do Mundial. “Se fosse para colocar favorito, colocaria França e Polônia. O resto é bem nivelado, mas mundial é mundial, jogo é jogado e quem der mole é capaz de tomar. Não pode dar menos de 100%. Se não, meu amigo, você vai perder para qualquer um”, comentou.
MUNDIAL
A seleção brasileira estreia na sexta-feira, dia 26 de agosto, contra Cuba, em Ljubljana, na Eslovenia. Integrante do Grupo B, também enfrentará Japão e Catar na primeira fase. Após duas semanas de treinos em Saquarema, a delegação fez uma última atividade em Guarulhos na semana passada e viajou para a França, onde faz os ajustes finais da preparação.
Além do trio de opostos formado por Wallace, Darlan e Felipe Roque, o técnico Renan Dal Zotto levou para a Europa os levantadores Bruninho e Fernando Cachopa, os centrais Leo, Flávio e Leandro Aracaju, os ponteiros Lucarelli, Leal, Adriano e Rodriguinho, e os líberos Thales e Maique. Leo, que participou dos treinos em Saquarema e foi cortado para fechar a lista de 14 nomes, conforme determinado pelo regulamento, juntou-se novamente aos companheiros porque Lucão teve uma entorse no tornozelo direito no treino da última quarta-feira.