Chilenos pedem volta da pena de morte
Pedido dos parlamentares, que são da base aliada de Piñera, pega carona nos protestos de rua que vêm ocorrendo desde que uma bebê foi morta pelo próprio pai
Um grupo de deputados chilenos da UDI (União Democrática Independente, direita) entregou uma carta ao presidente eleito, Sebastián Piñera, em que pede a realização de um plebiscito para restituir a pena de morte no Chile depois que o centro-direitista assumir, em um mês.
Diz o texto assinado por Osvaldo Urrutia, Ignacio Urrutia, Celso Morales, Pedro Álvares Salamanca e Sergio Bobadilla: “Há pessoas que não merecem ser alimentadas e aprisionadas, porque o nulo respeito que têm pela vida não permite outra opção que a de pagar com sua própria vida pelos delitos atrozes que cometeram”.
O pedido dos parlamentares, que são da base aliada de Piñera, pega carona nos protestos de rua que vêm ocorrendo no sul do país e em Santiago desde que a pequena Sophia, 1 ano e 11 meses, foi assassinada por seu pai, Francisco Ríos Ríos.
Em prisão preventiva, ele responderá pelos crimes de parricídio e violência familiar. Porém, a pena máxima no Chile é de 40 anos.
A menina havia sido levada ainda com vida ao pronto-socorro de Puerto Montt, onde a família vivia, no último dia 25 de janeiro, pela mãe, que chegou aos prantos. Os médicos que trataram a criança relataram que ela tinha sinais de abuso sexual e de pancadas, além de fraturas.
O médico que comandou a equipe que atendeu a menina se mostrou chocado ao descrever o que viu à imprensa local: “Nem os piores filmes de terror podem deixar nas retinas do grupo dos que tentamos salvá-la naquela noite uma imagem tão forte”, disse Juan Eduardo Donoso. “Sou médico de emergência e somos obrigados a ter um coração de pedra diante de certas situações, mas esta foi demais”, acrescentou.
Os manifestantes que se identificam com a hashtag #LeySophia programam uma manifestação no próximo dia 16 de fevereiro, que irá da praça Itália, em Santiago, até diante do palácio de La Moneda, sede do governo chileno.
A ideia de pedir o retorno da pena de morte, abolida da Constituição em 2001, veio da juíza da Corte de Puerto Montt responsável pelo caso.
“Há tratados internacionais que dizem que não se pode ressuscitar a lei após ter sido revogada, salvo se existir uma disposição dentro do direito interno que permaneça vigente, e no caso do Chile, há, trata-se do Código de Justiça Militar, que permite a aplicação da pena de morte”, declarou Teresa Mora.
Nos 111 anos em que a pena de morte esteve vigente no Chile, 58 pessoas foram condenadas. A última foi um assassino em série, em 1985.
Para o analista político Patricio Navia, “sempre houve no Chile uma maioria da sociedade a favor da pena de morte em casos extremos”.
Porém, “esta teria um custo de imagem internacional muito alto, por isso não deve estar entre as prioridades de Piñera”. “Mas ele terá de responder de alguma forma ao clamor por justiça após esse horrendo assassinato”, declarou Navia à Folha.
Cenário político
O fato de Piñera ter se encaminhado para o centro durante a campanha eleitoral do ano passado, mas, no segundo turno, ter aceito o apoio de pinochetistas declarados, como José Antonio Kast, o coloca em uma posição desconfortável.
“A esquerda quer que ele aceite fazer plebiscitos sobre outras questões. Mas o preço a pagar por isso pode ser a pressão daqueles que querem o plebiscito pela pena de morte, em que esta sairia vencedora”, afirma Navia.
Entre os que se comoveram com o caso Sophia, porém, também estão os que são contra a pena de morte, mas pedem penas mais duras.
Uma das porta-vozes desse movimento, Silvana Tobar, afirmou que reinstituir a punição capital seria um “retrocesso”. Mas, por outro lado, “as pessoas estão cansadas de as leis não funcionarem e as penas não serem cumpridas”.
O que seu grupo pede é aumentar a pena máxima no Chile de 40 para 60 anos, sem possibilidades de redução por bom comportamento ou outro tipo de benefício.
“Em casos de abusos sexuais de menores, queremos propor a castração química”, afirma. Assinaturas para essa proposta estão sendo recolhidas, também para serem entregues a Piñera.