China

China mira EUA ao reiterar apoio à Rússia durante a Guerra da Ucrânia

Cinco dias após reiterar sua oposição às pretensões americanas no Pacífico, a China deu mais…

Cinco dias após reiterar sua oposição às pretensões americanas no Pacífico, a China deu mais um passo no balé geopolítico da Guerra Fria 2.0 com uma ligação do líder Xi Jinping para seu maior aliado, o presidente russo, Vladimir Putin.

“A China quer continuar a apoiar a Rússia em questões relativas a seus interesses centrais e a grandes preocupações, como soberania e segurança”, disse ele a Putin. Em português: Pequim segue do lado de Moscou na Guerra da Ucrânia, ainda que isso não tenha sido divulgado pela mídia estatal dos dois países com todas as letras.

Não que fosse necessário. Desde o começo do conflito, os chineses buscaram uma posição de certo distanciamento, temendo os efeitos das sanções ocidentais sobre seus negócios -a China é uma grande parceira comercial russa, e empresas podem ser punidas por isso, embora o fluxo comercial só tenha aumentado após a guerra.

A chancelaria de Moscou relembrou o fato nesta quarta ao comentar a crise energética. “A oferta de energia está aumentando constantemente. A China sabe o que quer e não dá um tiro no pé, enquanto a oeste de Moscou eles dão um tiro na cabeça”, disse a porta-voz Maria Zakharova.

Xi se recusou a condenar a invasão de 24 de fevereiro, tanto em discursos como em votos nas Nações Unidas. Foi ameaçado por Biden para não ajudar Putin. Progressivamente, virou crítico vocal das sanções, ao mesmo tempo que defende de forma anódina uma solução pacífica para a crise -quem não o faz?

Nesta quarta, voltou a dizer isso a Putin, no único trecho que serviu de destaque para a maior parte da mídia ocidental. Para Xi, segundo a rede estatal CCTV, Moscou e Kiev devem encontrar uma “maneira responsável” de encerrar as hostilidades. Como o russo vê isso, finalizando a conquista de Lugansk na base da força bruta, é outra questão.

Segundo o Kremlin, foram discutidas maneiras de ampliar a cooperação econômica “tendo em conta a situação que se complicou devido às sanções”. O Departamento de Estado americano disse a jornalistas que a China está “do lado errado da história” e demonstrou preocupação.

Os chineses, cientes do crescente cansaço europeu com a guerra, encastelaram-se ao lado do aliado. Vinte dias antes do começo do conflito, Xi e Putin firmaram um acordo histórico de amizade, aprofundando uma relação multifacetada -que, se não é uma aliança militar com vistas à Terceira Guerra Mundial como muitos temem, abriga, sim, aspectos de defesa.

Mais importante, a Ucrânia serve de experimento prático para as intenções de Xi em sua periferia estratégica, a absorção de Taiwan à frente. A ilha, que Pequim considera sua, vive sob o temor de invasão por parte da ditadura comunista, e Biden reforçou a promessa de apoio militar a Taipé se isso ocorrer.

Essa possibilidade sempre foi o principal fator dissuasório de uma ação militar chinesa, que muitos consideram inevitável no médio prazo. Pequim tem testado com mais intensidade a defesa aérea taiwanesa com incursões e fez exercícios como advertência explícita aos EUA, em especial depois que o democrata visitou Japão e Coreia do Sul com discurso belicista, incluindo manobras com os russos.

Por outro lado, ao examinar a reação ocidental ao ataque a Kiev, Xi pôde refazer cálculos para a hipótese de se aventurar contra Taiwan -embora as realidades políticas e econômicas sejam muito diversas na Europa e na Ásia.

Com efeito, a conversa Xi-Putin ocorre cinco dias depois do primeiro encontro dos chefes de Defesa de China e EUA, às margens de uma conferência do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos em Singapura. Nele, Wei Fenghe e Lloyd Austin reafirmaram suas divergências, em especial sobre Taiwan. A reunião, segundo relatos, foi tensa.

Desde que a Guerra Fria 2.0 foi lançada pelos EUA em 2017, como resposta à maior assertividade de Xi desde que assumiu o poder, em 2012, chineses e americanos se estranham em todos os campos de disputa possíveis.

Mas o conflito acabou tornando-se quente primeiro com o velho protagonista da primeira edição da disputa, Moscou, o que obrigou os EUA a se desviarem de sua prioridade máxima na Ásia -mas não muito, como a formação de uma liga anti-Pequim e acordos militares na região provam.

Os russos, por sua vez, mantiveram o sangue frio ao comentar o estado das relações com os americanos nesta quarta. “Comunicação é essencial, e no futuro ainda teremos de nos comunicar”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.