Malásia aprova lei que condena pessoas que propagarem ‘fake news’
Projeto de lei aprovado estabelece multas de até 500 mil ringgit (US$ 123 mil) e um máximo de seis anos de prisão
A Malásia aprovou nesta segunda-feira uma lei contra “fake news” que poderá prender infratores por até seis anos, ignorando críticos que dizem que o objetivo real da medida é conter a liberdade de expressão antes da próxima eleição no país. O governo do primeiro-ministro Najib Razak garantiu uma maioria simples no parlamento para aprovar o projeto de lei Anti-fake news, que estabelece multas de até 500 mil ringgit (US$ 123 mil) e um máximo de seis anos de prisão. O projeto de lei original havia proposto uma prisão de até 10 anos para os infratores.
Segundo autoridades do governo, a lei não afetaria a liberdade de expressão e os casos sob ela seriam tratados por meio de um processo judicial independente.
— Esta lei tem como objetivo proteger o público da disseminação de notícias falsas, ao mesmo tempo em que permite a liberdade de expressão conforme previsto pela Constituição — disse a ministra Azalina Othman Said ao parlamento.
A lei define “fake news” (ou “notícias falsas”) como “notícias, informações, dados e relatórios que são parcial ou totalmente falsos” e inclui, além de textos, recursos visuais e gravações de áudio. A legislação cobre publicações digitais e mídias sociais e será aplicado a criminosos que espalham maliciosamente notícias falsas dentro e fora da Malásia, incluindo estrangeiros se um cidadão malaio for afetados.
Cooptado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, o termo “fake news” tornou-se rapidamente parte do repertório padrão de líderes em países autoritários para descrever relatos da mídia que fossem críticos a eles. O relator especial da ONU sobre liberdade de opinião e expressão, David Kaye, pediu na segunda-feira que o governo não apresse a legislação através do parlamento.
“Peço ao governo que reconsidere o projeto de lei e abra-o para o escrutínio público regular e genuíno antes de tomar novas medidas”, disse David Kaye em um post no Twitter.
Outros países do sudeste da Ásia, incluindo Cingapura e Filipinas, também estão considerando formas de lidar com notícias falsas, mas ativistas de direitos humanos temem que leis contra ela possam ser usadas para sufocar a liberdade de expressão. A Malásia está entre os primeiros países a discutir uma lei contra as “fake news”. A Alemanha aprovou um plano no ano passado para multar as redes de mídia social se elas não removessem postagens que propagassem discursos de ódio.
A Malásia já tem um arsenal de leis, incluindo uma Lei de Sedição da era colonial, que tem sido usada para reprimir notícias e posts de mídia social desfavoráveis ao governo. Reportagens jornalísticas e postagens de mídia social sobre um escândalo multibilionário no fundo estatal 1Malaysia Development Berhad (1MDB) perseguiram o primeiro-ministro Najib, que enfrenta sem dúvida sua mais dura competição em uma eleição geral neste ano, que poderia ser convocada em dias.
Najib negou qualquer irregularidade relacionada a perdas no fundo estatal. Um vice-ministro foi citado na mídia no mês passado dizendo que qualquer notícia sobre o 1MDB não verificada pelo governo era “falsa”.
Lim Kit Siang, um parlamentar de oposição do Partido da Ação Democrática, descreveu o projeto como uma “lei para salvar Najib do escândalo 1MDB”, o que, segundo ele, criminalizaria notícias sobre o caso. Especialistas demonstram preocupação com a medida:
— Isso terá um grande impacto nos cidadãos e na liberdade de expresão. A lei, essencialmente, permite que o estado defina o que é verdadeiro e o que é falso. Isso é um cenário bastante amedrontador — afirmou Syahredzan Johan, um advogado especialista em liberdades civis em Kuala Lampur.
Já James Gomez, diretor da Anistia Internacional na região, afirmou em um comunicado que “a vaga definição de ‘notícias falsas’, combinada com severas punições e prisões arbitrárias da polícia, mostra que essa medida não é nada mais que uma tentativa de proteger o governo de críticas pacíficas”
A Malásia é uma monarquia constitucional com um parlamento eleito, e o Islã é consagrado na constituição como a religião oficial do povo malaio — muçulmanos são cerca de 60% da população e os cidadãos estão sujeitos a algumas penalidades baseadas em interpretações da lei islâmica. As consideráveis minorias étnicas chinesas e de língua tâmil do país são tratadas diferentemente sob a lei, mas a nova lei de notícias falsas se aplica a todos igualmente.