OMS pede reação equilibrada à nova variante da Covid-19
Entidade diz que países que relatarem casos da nova cepa não devem ser penalizados
A Organização Mundial de Saúde (OMS) pediu uma reação global equilibrada à variante ômicron do coronavírus, dizendo que os países que relatarem casos da nova cepa não devem ser penalizados, enquanto os cientistas da África do Sul por trás de sua descoberta se preparam para enviar amostras para laboratórios do mundo todo.
A descoberta de uma nova variante do coronavírus, com alto grau de mutações, em Botsuana no início deste mês alarmou as autoridades mundiais de saúde, pois ela parece ser a causa de um aumento de casos na África do Sul. A chamada variante ômicron exibe características preliminares que sugerem que ela é capaz de reinfectar pacientes e evitar as vacinas. Ainda não se sabe se ela agrava os sintomas.
Diversos países impuseram severas restrições de viagens à região sul da África. A Suíça também restringiu as viagens com origem em Israel, Hong Kong e Bélgica, onde dois casos da variante foram confirmados. As Bolsas caíram na sexta-feira (26) enquanto investidores debatiam a possibilidade de que grande parte do progresso alcançado na recuperação da pandemia possa se perder.
“Alguns países estão relatando essa informação e não queremos que eles sejam ainda mais estigmatizados”, disse Maria Van Kerkhove, chefe técnica da Covid-19 na OMS, ao Financial Times. “Precisa haver um equilíbrio na resposta.”
Perguntada se as proibições de viagens se justificam, Van Kerkhove disse que os países devem aumentar a vigilância para essa variante e outras, aumentar a capacidade de testes e fazer “sequenciamento inteligente” que seja “mais representativo geograficamente, cobrindo mais países, e testar estrategicamente, não apenas em quantidade, mas em locais estratégicos”.
“Precisamos que as pessoas tenham uma abordagem comedida do risco”, disse ela. “A delta ainda está circulando pelo mundo e matando pessoas em todo o mundo. Não podemos esquecer quantas pessoas estão infectadas com a delta.”
Van Kerkhove disse que se o acesso global às vacinas tivesse sido mais equitativo “estaríamos em uma situação epidemiológica e econômica muito diferente em todo o mundo. Teríamos os pobres e vulneráveis protegidos, menos mortes”.
A OMS adotou na sexta a medida incomum de dizer que a variante ômicron causa “preocupação”, saltando a etapa intermediária de “interesse”. A medida tem implicações práticas limitadas, mas funciona como um sinal para o mundo de que a questão é séria.
Cientistas do grupo técnico assessor da OMS sobre evolução vacinal tinham discutido se a designariam como “variante de interesse” primeiro, mas decidiu dar a designação mais alta depois de concordar que respostas lentas em momentos chaves anteriores da pandemia foram desastrosas, segundo pessoas familiarizadas com a discussão.
Tulio de Oliveira, um dos cientistas por trás da descoberta da ômicron e chefe do Centro para Resposta Epidêmica e Inovação da África do Sul, disse que o país foi “penalizado com isolamento vacinal, proibição de viagens e discriminação desde a descoberta da variante beta, e agora da ômicron”.
“Se isso continuar, corremos o risco de que muitos países parem de relatar novas variantes e o mundo se arrisque a voltar à etapa inicial da pandemia”, disse ele ao FT.
Oliveira disse que recebeu pedidos dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos, da Coalizão para Inovações e Preparo para Epidemias, da Agência de Segurança em Saúde do Reino Unido e dos laboratórios Porton Down para compartilhar amostras de vírus.
“Faremos o mesmo que fizemos com a beta –isto é, enviar amostras de vírus para as principais agências de biossegurança do mundo.”
“Sempre fomos muito colaborativos com todas as principais agências de segurança do mundo para que as questões chaves possam ser respondidas o mais rápido possível”, afirmou ele. “Não enviamos amostras para empresas privadas, mas trabalhamos por meio de nosso governo com outras organizações governamentais de biossegurança do mundo.”
Van Kerkhove explicou que a ômicron parece exibir a chamada “vantagem de crescimento”, pois a medida usada para detectá-la –a falta de um gene nos testes PCR– é cada vez mais presente nos casos que surgem.Ela não quis dar uma estimativa total dos casos detectados.
A cientista disse que não se sabe onde a variante se originou, mas que uma das hipóteses em consideração sugere que ela pode ter vindo de um paciente imunocomprometido infectado que não conseguiu se livrar totalmente do vírus e em quem o vírus se replicou durante um período de tempo significativo.
Van Kerkhove salientou que a OMS não quer que as pessoas entrem em pânico, e que “já há acordos de compartilhamento pelos quais o vírus pode ser compartilhado, por isso os cientistas podem colaborar em tempo real” para estudar o efeito das vacinas e reações imunes. Os resultados são esperados para três a quatro semanas no mínimo, disse ela.
Van Kerkhove disse que este “poderá ser” um momento dezembro de 2019/ janeiro de 2020, quando o mundo soube pela primeira vez do surto de coronavírus em Wuhan, na China. “A África do Sul a apresentou [à OMS] esta semana. Nós agimos depressa”, disse ela. “Sem arrependimento.”