Partido pró-Putin deve vencer eleição parlamentar na Rússia, apontam preliminares
Com 33% das urnas apuradas, Rússia Unida tem 45% dos votos, mas perde espaço
Como esperado, o partido Rússia Unida, que apoia o presidente Vladimir Putin, caminha para garantir uma vitória na eleição parlamentar de três dias no país que se encerrou neste domingo (19), apesar de ter perdido espaço em relação ao pleito anterior.
Segundo a Comissão Eleitoral Central, com 33% das urnas apuradas, o partido de sustentação do Kremlin tem 45% dos votos, mesmo resultado apontado pela boca de urna realizada pelo Insomar e publicada pela agência de notícias RIA.
Ainda de acordo com os resultados oficiais, o Partido Comunista figura em segundo lugar, com 22% dos votos, seguido pelo nacionalista LDPR (9%). Ambas as siglas comumente apoiam o Kremlin em votações-chave.
Desde sexta (17), os russos foram às urnas para eleger os 450 novos deputados da Duma, a Câmara baixa do Parlamento —que hoje tem 336 de suas cadeiras pertencentes ao Rússia Unida. Houve também eleições legislativas locais.
Lá fora
Mesmo vitorioso, o partido pró-Putin perdeu espaço em relação à última eleição parlamentar, em 2016, quando obteve 54% dos votos. Sua popularidade vem diminuindo nos últimos anos devido a uma queda no padrão de vida e também após o movimento contrário ao Kremlin voltar a ganhar tração, embora este não possua organização eleitoral ou partidária.
Um dos principais nomes da oposição, Alexei Navalni foi envenenado e, depois de voltar de tratamento na Alemanha, foi preso e condenado por violar uma condicional ao deixar o país em coma. O caso levou os russos às ruas de forma maciça neste ano, mas a crescente repressão policial acabou por desestruturar a resistência.
A fundação de Navalni, que segue detido em uma cadeia próxima de Moscou, já havia sido alvo da repressão do Kremlin ao ser considerada agente estrangeiro, estando sujeita a inspeções fiscais e multas incapacitantes, baseadas na suposição de que recebem dinheiro estrangeiro —o que é verdade em muitos casos— para difamar o Estado —o que é discutível.
Enfrentam a mesma situação todas as ONGs e veículos independentes de imprensa, num país em que a mídia é quase toda estatal. A organização do opositor, no entanto, também passou a ser rotulada de extremista, o que levou ao menos cinco de suas lideranças principais serem barradas do pleito.
Esse sufocamento gerou críticas da oposição, que classificou o pleito como uma farsa. O Kremlin nega realizar uma repressão política e diz que os indivíduos são processados por infringir a lei. O próprio Putin disse que Navalni apenas responde à Justiça, ignorando o alinhamento das cortes.
Para contornar o impedimento de participar da eleição, a equipe de Navalni vinha trabalhando desde 2018 numa tática chamada “voto inteligente”: apoiar qualquer um que não seja do Rússia Unida para ter chances em determinada região.
Na última semana, o grupo do opositor nomeou 1.234 candidatos em todo o país —a maioria comunista— para serem objeto do voto inteligente, cuja campanha online chegou a ser alvo de tentativa de bloqueios por parte das autoridades.
Google, Apple e Telegram também limitaram parte dos acessos à campanha de voto inteligente, gerando acusações de ativistas de que as empresas cederam à pressão do governo. “Um dia, vamos viver em uma Rússia onde será possível votar em bons candidatos com diferentes plataformas políticas”, escreveu no Telegram Leonid Volkov, aliado de Navalni, antes do fechamento das urnas neste domingo.
Além da repressão no período anterior às eleições, o grupo de monitoramento eleitoral Golos (voz, ou voto, em russo) apontou várias violações como ameaças contra observadores e votos fraudulentos, com registros circulando nas redes sociais de cidadãos filmados depositando pacotes de cédulas em uma urna.
A Comissão Eleitoral Central, por sua vez, confirmou ter registrado casos de votos fraudulentos em oito regiões, mas que esses resultados seriam anulados.
Partido pró-Putin segue na liderança mesmo tendo perdido força
As controvérsias, porém, não foram suficientes para tirar o Rússia Unida da liderança. O partido deve usar a vitória, mesmo que mais magra, como uma prova do amplo suporte de Putin, que está no poder como presidente ou primeiro-ministro desde 1999 e ainda é uma figura popular para muitos russos que o veem como um defensor do orgulho nacional e contra iniciativas do Ocidente.
Anatoli, aposentado que mora em Moscou e não quis fornecer seu sobrenome, disse à agência de notícias Reuters ter votado no Rússia Unida por se orgulhar dos esforços do presidente para restaurar o que vê como legítimo status de potência mundial do país.
“Países como EUA e Reino Unido mais ou menos nos respeitam agora como eles respeitavam a União Soviética nos anos 1960 e 1970”, opinou. “Os anglo-saxões entendem apenas a linguagem da força.”
Já quem se opõe à sigla, como Roman Malakhov, que votou no Partido Comunista, diz que o Rússia Unida “não fez nada de bom”. Houve também uma certa apatia, com uma participação de cerca de 47% dos eleitores —o voto não é obrigatório. “Não vejo sentido em votar”, disse à Reuters uma cabeleireira em Moscou que se identificou como Irina. “Já foi tudo decidido por nós.”
Ainda que seja um presidente autocrático, paradoxalmente Putin precisa do apoio popular para manter seu esquema de poder. Suas manobras têm um verniz legalista, e o presidente sempre jogou dentro da Constituição. Quando resolveu mudá-la em 2020 para abrir o caminho e tentar ficar no poder até 2036, o fez com um plebiscito —alvo também de acusações de fraude.