Inflação

Sistemas bancários param na Venezuela com nova moeda

A Venezuela teve seus serviços bancários eletrônicos — imprescindíveis diante da escassez de papel moeda…

A Venezuela teve seus serviços bancários eletrônicos — imprescindíveis diante da escassez de papel moeda no país — paralisados este domingo enquanto todos os sistemas estão sendo adequados à implementação da nova moeda, o agora “bolívar soberano”. A reativação está prevista para esta segunda-feira, quando foi decretado feriado trabalhista para que a adequação de todas as plataformas financeiras do país seja feita. Partidos de oposição, contudo, convocaram greve geral de 24 horas no país para esta terça-feira.

A mudança no bolívar, que perde cinco zeros a partir desta segunda-feira, é a segunda em uma década. Na anterior, em 2008, no governo Hugo Chávez, caíram três zeros da moeda, quando surgiu o “bolívar forte”. A nova maxidesvalorização integra um pacote de medidas econômicas anunciado pelo governo venezuelano e que prevê ainda o aumento do salário mínimo em quase 3.500% a partir de 1º de setembro, novo sistema de câmbio financeiro, além do aumento dos preços dos combustíveis e dos impostos.

“O novo salário vai entrar em vigor a partir de 1º de setembro. Aqueles que estão pensando em uma loucura de remarcação de preços, cuidado”, disse Maduro, em transmissão ao vivo pelo Facebook.

Com as novas medidas, cada trabalhador ganhará 1,8 mil bolívares soberanos, o equivalente a 180 milhões de bolívares hoje, o que representa um peso para as empresas, que lutam para se manter em atividade diante dos rígidos controles de preços e câmbio.

A implementação do programa — que é visto como “inviável” por especialistas — coincide com graves tensões migratórias em consequência ao êxodo massivo de venezuelanos. As Nações Unidas (ONU) estimam que 2,3 milhões de pessoas deixaram o país para fugir da crise.

O Brasil vai enviar tropas para sua fronteira com a Venezuela depois que moradores da cidade de Pacaraima, perto da divisa com o país vizinho, queimaram acampamentos de venezuelanos no último sábado. A Venezuela pediu “proteção” a seus cidadãos.

Devido à incerteza pela entrada da nova moeda, parte do comércio fechou as portas no fim de semana em Caracas e em ouras cidades, após dias de compras intensas até onde a população podia aguentar em meio a uma hiperinflação que deve alcançar 1.000.000% este ano, segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Antes do aumento de preços, houve filas longas também nos postos de gasolina.

Indústria Petroleira em queda

Maduro, que enfrenta resistência popular, sustenta que a emissão das novas cédulas será o ponto de partida para uma “grande mudança”. A nota de maior valor será a de 500 bolívares, o equivalente a cerca de US$ 7 no mercado negro.

O presidente venezuelano anunciou que o governo vai assumir o aumento salarial, que deverá ser feito pelas pequenas e médias empresas, pelo prazo de 90 dias.

— É uma loucura — disse Henkel Garcia, diretor da consultoria Econométrica, neste domingo à AFP, ao considerando que o reajuste de salários vai implicar em novo aumento da oferta monetária, raiz da hiperinflação.

Com uma indústria petroleira desabando e sem financiamento internacional, o acesso a novos recursos parece inviável.

A produção de óleo bruto — fonte de 96% dos ingressos de recursos no país — registra tombo de 3,2 milhões de barris diários, em 2008, para 1,4 milhão, em julho último, enquanto o déficit fiscal supera 20% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados de consultorias privadas.

Além disso, a Venezuela e sua petroleira PDVSA se encontram em situação de calote parcial desde 2017, pela falta de pagamento de uma dívida externa no valor de US$ 150 milhões, enquanto os Estados Unidos restringiram suas sanções financeiras ao país.

— Se o déficit e a emissão desordenada de moeda (para cubri-lo) forem mantidos, a crise seguirá se agravando — destacou o economista Jean Paul Leidenz.

A nova emissão de cédulas acontece apenas 20 meses depois do governo ter lançado notas de altos valores, que acabaram diluídas pela inflação e pela acelerada desvalorização do bolívar.

Crise regional

As tensões causadas pela fuga em massa de venezuelanos para países sul-americanos vizinhos vêm se agravando. Além do incidente deste fim de semana em Roraima, no Brasil, o Equador deu início no sábado ao bloqueio da entrada de venezuelanos em suas fronteiras, exigindo passaporte, ao invés de apenas o documento de identidade.

O Peru adotou medida similar, o que faz a Colômbia teme milhares de venezuelanos fiquem retidos em seu território.

Diante do aumento dessas tensões, o secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, pediu que se “mantenham abertas as portas ao povo da Venezuela, vítima da pior crise humanitária já vista no continente”.

Em protesto ao plano econômico de Maduro, três dos principais partidos da oposição convocaram uma greve de 24 horas para esta terça-feira.

— É um primeiro passo — disse Andrés Velásquez, do partido Causa R, assegurando que o objetivo é unificar “o protesto social”.

Manifestações por direitos trabalhistas, contra a falta de alimentos, medicamentos e falhas nos serviços básicos de água e luz se multiplicam, com uma oposição dividida e enfraquecida.

Não está claro como os partidos que convocaram a greve articularam o movimento sem a participação de outros grupos de oposição.

O setor privado está operando abaixo de 30 da capacidade devido ao colapso da economia, enquanto o governo exerce um controle forte sobre os funcionários públicos.