‘Varíola dos macacos deve ser levada mais a sério’, alerta principal autoridade de saúde dos EUA
Anthony Fauci diz que é preciso agir como se a doença tivesse a capacidade de se espalhar muito mais amplamente do que está se espalhando agora
À medida que os casos de varíola dos macacos continuam a aumentar nos Estados Unidos, a principal autoridade de saúde do país, Anthony Fauci, alerta que o surto precisa ser tratado de maneira mais rigorosa.
— Isso é algo que definitivamente precisamos levar a sério. Ainda não sabemos o escopo e o potencial disso, mas temos que agir como se tivesse a capacidade de se espalhar muito mais amplamente do que está se espalhando agora — disse ontem, à rede de TV americana CNN, Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos e principal conselheiro médico do presidente americano, Joe Biden.
A varíola dos macacos foi detectada na maior parte dos EUA, com exceção de alguns estados, de acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC). Os estados com mais casos incluem Nova York, Califórnia, Illinois e Flórida. Dados mais recentes mostram que o CDC rastreou pelo menos 1.814 casos prováveis ou confirmados nos EUA, até sexta-feira. Fauci disse a Laura Coates, da CNN, que esses números são “muito provavelmente resultados de subnotificação”.
— Sempre que você tem o surgimento de algo assim, você provavelmente está sempre olhando para o que pode ser – pode ser, não sabemos – a ponta do iceberg, então essa é a razão pela qual temos que testar de uma maneira muito, muito mais vigorosa — disse Fauci.
As lesões geralmente se concentram nos braços e nas pernas, mas no surto mais recente, elas estão aparecendo com mais frequência na área genital e perianal, o que levantou algumas preocupações de que as lesões da varíola dos macacos possam ser confundidas com doenças sexualmente transmissíveis.
O vírus se espalha por contato próximo – incluindo contato físico direto com lesões, bem como “secreções respiratórias” compartilhadas por meio de interação face a face. Tocar em objetos que foram contaminados por lesões ou fluidos de varíola também pode arriscar a propagação. E embora a varíola não seja uma DST, tem se espalhado principalmente entre homens que fazem sexo com homens.
No sábado, Fauci disse que mais testes serão feitos com cinco laboratórios de testes comerciais on-line, e ele espera que até 700 mil vacinas sejam distribuídas até o final de julho.
— Porque você quer proteger as pessoas em risco, não apenas as pessoas que podem ter tido uma exposição, mas também as pessoas vulneráveis, pelo fato de estarem em situação de risco, que precisam ser vacinadas —observou.
Os EUA mais que triplicaram suas doses de vacina contra a varíola desde a semana passada, de acordo com o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA. Mas essa oferta continua aquém do que é necessário para ajudar a controlar a disseminação. A busca pela vacina supera a oferta do país, segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).
— Ainda não temos todas as vacinas que gostaríamos neste momento— afirmou Rochelle Walensky, diretora do CDC.
Quando a crise de oferta diminuirá, não se sabe. O governo federal americano disponibilizou outras 131 mil doses para estados e outras jurisdições na sexta-feira. Mas o escopo do surto permanece incerto, em parte porque os testes de diagnóstico têm sido lentos e limitados.
Mais de 11 mil casos da doença já foram identificados em 65 países, incluindo o Brasil, principalmente em homens que fazem sexo com homens. Nos EUA, quase 1.500 casos foram identificados, e o número deve aumentar nas próximas semanas, disse Walensky.
A varíola dos macacos não é considerada uma infecção sexualmente transmissível, uma vez que são limitadas ainda as evidências de que o agente causador da doença estaria presente no sêmen ou em fluidos vaginais. No entanto, a infecção pode ocorrer no momento da relação sexual, já que a via mais comum de transmissão é o contato direto e prolongado com a pessoa contaminada pelas lesões na pele e vias respiratórias.
Para a epidemiologista e especialista em varicela da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, Anne Rimoin, o mundo está perdendo a luta contra o tempo.
— Nossa janela de oportunidade para controlar a doença está se fechando rapidamente. Provavelmente há muito mais casos por aí do que estamos cientes.
O Departamento de Saúde e Serviços Humanos americano encomendou mais 2,5 milhões de doses da vacina, conhecida como Jynneos, na sexta-feira, mas essas doses não devem chegar até o próximo ano. Outras 2,5 milhões de doses encomendadas anteriormente devem começar a chegar no final de 2022, disseram autoridades.
— É como dizer que temos um caminhão-tanque de água chegando na próxima semana, quando o incêndio está acontecendo hoje — disse Gregg Gonsalves, epidemiologista da Escola de Saúde Pública de Yale.
A disseminação tem levado países a adotarem medidas para proteger aqueles considerados de “maior risco” para a doença, inclusive por meio da distribuição de vacinas. Embora a OMS não recomende uma campanha de imunização em massa, a organização reconhece os benefícios da vacina para pessoas mais expostas ao vírus.
É o caso do Reino Unido, que desde maio imuniza profissionais da saúde e pessoas que tiveram contato com alguém infectado. Os especialistas explicam que devido ao longo período de incubação do vírus monkeypox – tempo entre a contaminação e o surgimento de sintomas –, que pode chegar a três semanas, a vacina nesse caso é eficaz pois pode atenuar a replicação do patógeno no organismo durante esse período.
No Brasil, nesta semana, o Ministério da Saúde decidiu finalizar a sala de situação criada para monitorar a disseminação da varíola dos macacos no país. A pasta afirma, no entanto, que continuará acompanhando o cenário da doença no Brasil. Até o momento, 228 casos da enfermidade foram registrados, um aumento de 185% na última semana.
Segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, o Brasil não tem doses armazenadas nem produção nacional, caso seja necessária uma estratégia de imunização.