EPIDEMIA DE VIOLÊNCIA

Violência: EUA registraram 309 ataques com mais de quatro vítimas em 2022

Incidentes ocorreram em escolas, hospitais, mercados e sistemas de transporte ao redor do país

Cena de um dos ataques que aconteceram nos Estados Unidos em 2022 (Foto: Reprodução)

ataque a tiros em um desfile do Dia da Independência dos EUA, no estado de Illinois, deixando seis mortos e dezenas de feridos, foi o caso mais recente do que especialistas chamam de “epidemia” vivida pelo país. Segundo dados da ONG Gun Violence Archive, que cataloga casos de violência com armas de fogo, ocorreram, em 2022, 309 ataques que resultaram em quatro ou mais mortos ou feridos, número similar ao registrado no mesmo período em 2021 (327) e maior do que em 2020 (256).

Como nos anos anteriores, escolas foram cenário de ataques brutais contra estudantes, professores e funcionários. Em Uvalde, no Texas, no dia 30 de junho, um homem de 18 anos entrou, sem qualquer resistência, na Escola Primária Robb, deixando 21 mortos, incluindo 19 crianças, e 18 feridos. O ataque foi o mais violento registrado em 2022 e, repetindo um roteiro conhecido pelos americanos, foi realizado com o fuzil de assalto AR-15, uma arma de guerra, legalmente vendida ao público, presente em dezenas de ataques nas últimas décadas.

Nem mesmo hospitais estiveram livres da violência com armas de fogo: no dia 1º de junho, um homem invadiu o Hospital Saint Francis, em Tulsa, no Oklahoma, e deixou quatro mortos — mais uma vez, usando uma AR-15 e uma pistola semiautomática, compradas de forma legal em lojas. Segundo as investigações, o homem havia sido submetido a uma cirurgia nas costas, e culpava os médicos pelas dores que não cessavam. O atirador cometeu suicídio, de acordo com os oficiais envolvidos.

Três dias depois, três pessoas foram mortas em um tiroteio na South Street, uma das ruas mais movimentadas da vida noturna da Filadélfia. Antes do ataque, testemunhas afirmaram que dois homens estavam caminhando pela multidão mostrando suas armas de fogo, o que provocou um princípio de tumulto. Mais tarde, os dois teriam se envolvido em uma briga, e disparos começaram a ser feitos diante dos bares e restaurantes que estavam lotados naquele momento. Segundo os investigadores, ao menos cinco armas foram disparadas naquela noite.

Terrorismo doméstico

Algumas ações também foram ligadas a supremacistas brancos: no dia 14 de maio, um homem entrou atirando em um supermercado na cidade de Buffalo, no estado de Nova York, deixando 10 mortos e três feridos. A ação chegou a ser parcialmente transmitida na plataforma Twitch, antes de ser derrubada.

O atirador, que foi capturado com vida, se considera um supremacista branco, e escreveu um manifesto de cerca de 200 páginas defendendo ideias sem conexão com a realidade presentes em fóruns extremistas, como a teoria racista da “Grande Substituição”, além de pregar a violência contra negros, latinos e asiáticos. Caso seja condenado, pode receber a pena de prisão perpétua.

Um incidente que não deixou mortos, mas que foi investigado como ato de terrorismo doméstico, ocorreu no dia 12 de junho, quando um homem detonou bombas de gás em um vagão do metrô de Nova York, antes de realizar disparos contra os passageiros. Dez pessoas foram baleadas, e outras 19 precisaram de atendimento médico por causa de ferimentos sofridos na fuga ou por intoxicação por terem inalado fumaça.

Após uma intensa operação de busca, o atirador foi encontrado — segundo a polícia, ele havia sido preso 12 vezes no passado, e frequentemente publicava vídeos pregando ações violentas contra determinados setores da sociedade, como judeus, gays e hispânicos. Se condenado, poderá receber a pena de prisão perpétua.

A sequência de ataques intensificou um debate antigo nos EUA, que sempre ganha força após um massacre: ferramentas para o controle do acesso a armas de fogo, e uma proposta para banir a venda de armas como os fuzis AR-15 à população civil.

Logo após o incidente em Uvalde, ganhou força no Congresso uma proposta com novas regras para as armas, a primeira do tipo em 28 anos. A pressão do público fez com que o texto vencesse resistências entre os republicanos, e acabou aprovada no dia 24 de junho.

Contudo, como apontam especialistas e como reconhece o próprio governo de Joe Biden, o plano ficou bem aquém do que queria o presidente. A começar pela proposta para banir os rifles de assalto, que ficou fora do texto — esse tipo de armamento chegou a ser proibido por uma lei de 1994, que expirou dez anos depois e jamais foi renovada.

Boa parte dessa pressão para manter nas lojas uma arma que só é usada em conflitos armados se deve à força do lobby armamentista no Congresso, que despeja milhões de dólares todos os anos. Muitos congressistas, incluindo democratas, também temem a rejeição dos eleitores a ações mais amplas de controle, citando uma suposta violação à Segunda Emenda da Constituição, que trata do direito ao porte de arma.

Na prática, a medida aprovada em maio, embora deixe os rifles de assalto de fora, estabelece maiores exigências de compradores com menos de 21 anos, destina US$ 15 bilhões a programas de saúde mental e de segurança em escolas, veta a venda de armamentos a pessoas acusadas de agressão em relacionamentos, dentre outras ações.

Hoje, estima-se que haja mais de 393 milhões de armas de fogo nas mãos dos americanos.