Bolsonaro e Lula têm as maiores rejeições para líderes da corrida eleitoral desde 1989
Em meados de anos eleitorais, um dado além das intenções de voto dos pré-candidatos é…
Em meados de anos eleitorais, um dado além das intenções de voto dos pré-candidatos é fundamental para medir os ventos que sopram sobre a opinião pública: a rejeição. Neste ano, a menos de cinco meses do primeiro turno, os patamares de quem diz “não votar de jeito nenhum” nos postulantes só se igualam aos de agosto de 1989, ano em que o país voltou a ter eleições diretas após a ditadura militar.
Levantamento do GLOBO a partir do banco de dados do Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop/Unicamp), Datafolha, Ibope e Ipec revela que, pela primeira vez, um dos dois pré-candidatos mais bem colocados na preferência popular, o presidente Jair Bolsonaro (PL), ultrapassa a barreira dos 50% de rejeição em meados do ano eleitoral.
Os dados mostram também que o ex-presidente Lula (PT), pré-candidato ao Planalto, atingiu, em março de 2022, 37% de rejeição na pesquisa mais recente do Datafolha, passando a ex-presidente Dilma Rousseff, que detinha o recorde da sigla em período semelhante da fase pré-eleitoral. Lula está em patamar numericamente superior aos 34% de agosto de 2018, quando estava preso em Curitiba.
Apesar de níveis que, em outras eleições, seriam proibitivos, a rejeição a Bolsonaro não anula sua competitividade. Do mesmo modo, ainda que em patamares menos elevados, a reprovação a Lula também não significa alto risco de derrota.
Resultados diferentes
Um dos fatores mais relevantes para essa coincidência entre rejeição e intenção de voto é que ambos são extremamente conhecidos pela população e estabeleceram o cenário inédito, desde a redemocratização, de um presidente tentando a reeleição contra um ex-presidente. Apesar de os entrevistados responderem que não votariam “de jeito nenhum” em certo candidato, no dia a dia da opinião pública há possibilidades, sim, de votar no seu rejeitado.
— As rejeições não são estáticas e vão mudando ao longo da campanha para mais ou menos, em função das informações que eleitores recebem e dos fatos que ocorrem. O candidato terá o amor e o ódio, depende da eficácia da campanha — explica Márcia Cavallari, CEO do Ipec, empresa fundada por ex-executivos do Ibope, acrescentando. — Além disso, existe outra forma de medir rejeição, a que investiga o potencial de voto.
A técnica citada por Márcia geralmente é incluída na parte final dos questionários. Após perguntas sobre intenção de voto, o profissional do instituto acrescenta questões individuais sobre cada político. O raciocínio de quem responde passa a ser diferente, uma vez que ele avalia um por um em vez de todos simultaneamente.
— Ao responder um por um, o entrevistado não está buscando ser coerente com ele mesmo, a avaliação é sobre cada político. Esses dados são importantes. Por exemplo, conseguimos cruzar os votos que chamamos de preferenciais, quando mais de um candidato é escolhido no “com certeza votaria”, e os exclusivos, dos respondentes que só escolheram um político para votar sem dúvidas — diz Márcia.
Diretor do Cesop/Unicamp, o cientista político Oswaldo do Amaral explica que rejeição e identificação são duas variáveis que caminham juntas e espelham tanto exposição quanto o próprio protagonismo de cada político na vida pública. Em um cenário de eleição com rejeição alta, portanto, a avaliação sobre o atual governo será de fundamental importância.
— A rejeição a Bolsonaro não é apenas sobre ele, mas embute a avaliação de seu governo. O resultado acima de 50%, que é muito alto, impediria eleição, mas isso pode mudar porque a avaliação do governo também pode ser diferente. Por outro lado, a rejeição a Lula deve aumentar também, com reativação de uma série de elementos como corrupção, antipetismo e agenda de costumes.
Os dados de meados de 2010 mostram a diferença entre consolidação de voto e rejeição. Em agosto daquele ano, o percentual de pessoas que diziam não saber quem rejeitar foi o mais alto da série analisada (14%). Em 2018 e 2022, por exemplo, esse índice cai para 4% e 1%, respectivamente, reflexo da radicalização do debate político.
As pesquisas qualitativas, por outro lado, já mostram um fenômeno que pode embaralhar os dados sobre rejeição. Especializado nessa técnica, Renato Dorgan, do Instituto Travessia, tem notado um movimento pendular de eleitores que oscilam entre Lula e Bolsonaro:
— No Acre, entrevistei uma senhora evangélica, de 55 anos, apoiadora de Lula. Após ler declaração dele sobre “direito” ao aborto, mudou para Bolsonaro. Um eleitor bolsonarista de Manaus, de 35 anos, disse ter sido militante do presidente, mas, após perder a mãe, a tia e um irmão por Covid, afirmou não conseguir mais defendê-lo. Apesar de ter xingando Lula por dez anos, agora votará nele.
Ulysses ‘herdou’ Sarney
Na retomada do voto direto para presidente, em 1989, o ex-presidente da Câmara Ulysses Guimarães (PMDB) foi o recordista de rejeição em agosto daquele ano. O cientista político Carlos Melo, professor do Insper, afirma que Ulysses pagou um preço naquela disputa por ser associado ao governo do então presidente, José Sarney, também do PMDB. O país vivia, na época, um cenário de hiperinflação com recessão. Diferentemente de Bolsonaro hoje, Ulysses, apesar da rejeição, beirava 3% das intenções de voto.