Candidatos a prefeitura possuem propostas genéricas contra o racismo
Embora tenham entrado no discurso de campanha após o assassinato de João Alberto Silveira Freitas…
Embora tenham entrado no discurso de campanha após o assassinato de João Alberto Silveira Freitas na última quinta-feira (19), projetos para o combate ao racismo são pouco ou nada citados nos planos de governo de candidatos que disputam o segundo turno em Rio, São Paulo, Porto Alegre e Recife. Procurados pelo GLOBO, os postulantes às prefeituras apresentaram propostas mais detalhadas, que incluem a criação de pastas de igualdade racial, implementação de cotas e capacitação de guardas municipais para coibir o racismo.
No Rio, o atual prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) não cita em seu plano de governo nenhuma ação exclusivamente dedicada a mitigar o racismo. Já seu oponente, o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM), propõe ações genéricas de conscientização para a cidadania em escolas e espaços coletivos, com o objetivo de “melhorar o respeito do carioca pelo próximo e pelo patrimônio público — incluindo também, o combate ao racismo”.
No único trecho que menciona discriminação racial, o programa de Crivella defende “uma gestão técnica e profissional de toda máquina pública, livre de interesses partidários ou de qualquer influência ou discriminação por gênero, raça, idade, credo ou opção sexual”. Questionado pelo GLOBO, Crivella apenas reiterou que uma das pautas do seu governo é levar serviços às populações mais pobres, e disse que cabe aos governantes “dar o exemplo”.
— Eu vivi dez anos na África e sei bem os horrores do racismo. Nosso governo tem se pautado principalmente por levar os serviços às populações mais pobres, que são na sua grande maioria, negros — afirmou.
Termo de compromisso
Paes, que leu um documento de compromissos no Instituto de Pesquisa e Memórias Pretos Novos na sexta, em data que marca o Dia Nacional da Consciência Negra, defendeu o papel do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro (Comdedine) e ações como facilitação de crédito para empreendedores negros e fomento de feiras de moda e estética negra.
— Não podemos fazer um governo que simplesmente diga: “Não sou racista”. Temos que ser antirracistas. Temos a questão das cotas, as políticas afirmativas na própria administração pública, que é algo muito importante — afirmou.
Em Porto Alegre, onde João Alberto morreu na última quinta em decorrência de agressões feitas por dois seguranças de uma unidade do supermercado Carrefour, os candidatos à prefeitura Manuela D’Ávila (PCdoB) e Sebastião Melo (MDB) repudiaram o episódio e citaram propostas de combate ao racismo.
O plano de governo de Manuela, divulgado antes do assassinato de João Alberto, dá destaque ao combate à discriminação racial, com propostas divididas em três frentes. A primeira, chamada “Vidas negras importam”, trata de mobilizar a gestão para garantir direitos às pessoas negras. A segunda promete a elaboração do que foi batizado de Plano Municipal de Promoção de Igualdade Racial. A terceira frente, mais objetiva, visa a capacitar servidores para assegurar políticas de promoção da igualdade racial. Para Manuela, projetos voltados para educação e enfrentamento à desigualdade se misturam ao combate ao racismo estrutural.
— A ideia é que o serviço público se adapte para ser parceiro da luta antirracista e que todos sejam atores e construtores do enfrentamento ao racismo. Várias outras políticas de outras áreas também têm impacto no enfrentamento real ao racismo estrutural — afirmou.
Apesar de não fazer nenhuma referência ao enfrentamento ao racismo em seu plano de governo, Sebastião Melo citou ao GLOBO propostas como uma coordenadoria na prefeitura para tratar de denúncias e ações de acolhimento a vítimas de racismo. Melo também propôs intervenção num espaço onde fica uma feira livre da Cidade Baixa, bairro boêmio da capital gaúcha.
— Se eleito, vou abrir um concurso de arquitetura para transformar aquela área, que é conhecida como Largo Zumbi dos Palmares, num equipamento público que seja um símbolo da luta dos povos negros — afirmou.
Em Recife, os planos de governo de João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT) falam em medidas voltadas à promoção de igualdade racial, mas sem detalhar ações.
Procurado, Campos listou, via assessoria, propostas específicas, como uma política de cotas no programa Embarque Digital, voltado à capacitação de jovens para o mercado de tecnologia, e prometeu ampliar medidas em vigor na capital pernambucana, como o monitoramento da Guarda Civil Municipal por meio do Grupo de Trabalho de Racismo Institucional.
Marília Arraes encaminhou à reportagem um documento com medidas específicas, disponível em seu site oficial. A petista defende, entre outros pontos, recriar a Diretoria de Igualdade Racial, responsável por coordenar ações relacionadas ao tema em todas as secretarias municipais. O documento fala ainda em transformar em núcleo permanente o que hoje é um grupo de trabalho temporário sobre políticas educacionais para as relações étnico-raciais e propõe linhas de crédito da prefeitura para apoiar empreendedores e produtores negros.
Em São Paulo, o plano de governo do prefeito Bruno Covas (PSDB) só traz duas menções ao tema. Numa delas, cita uma medida tomada em sua administração: a reinauguração de dois Centros de Referência da Igualdade Racial, dedicados ao atendimento de casos de discriminação. O plano também cita o combate ao racismo e “a todas as formas de preconceito”.
Capacitação de pessoal
A plataforma de Guilherme Boulos (PSOL) inclui dez propostas de combate ao racismo na cidade. Uma das ações fala em capacitar guardas municipais para inibir a violência contra mulher, combater o racismo e a LGBTfobia. O texto fala ainda em criar um Fundo Municipal de Políticas de Combate ao Racismo, com um percentual fixo do orçamento municipal.
Procurada, a campanha de Covas listou outros compromissos, como o de priorizar a contratação de fornecedores que cumpram integralmente a Lei de Cotas e fazer mais seis novos Centros de Referência de Promoção da Igualdade Racial. Em agenda de campanha ontem, Boulos defendeu o ensino de história africana e cultura afro-brasileira na rede municipal e a recriação da Secretaria de Igualdade Racial.