Com jabuti, licença-prêmio para magistrados é aprovada com reestruturação do Judiciário
Bastante criticada por entidades e pela sociedade, medida foi embutida no PL por líder tucano na casa legislativa. Proposta agora segue para eventual sanção de José Eliton (PSDB)
Proposta polêmica descartada pelo próprio Judiciário em julho, a licença-prêmio para magistrados, criticada por entidades da sociedade civil organizada, como a Ordem dos Advogado do Brasil (OAB-GO), foi aprovada às escondidas, em segunda votação, nesta terça-feira (27), na Assembleia Legislativa (Alego). A iniciativa foi incluída, em forma de emenda jabuti, no bojo do Projeto de Lei 4816/2018, que define a reestruturação – com criação de novas varas e cargos – daquele poder. Agora, aprovado por unanimidade, o dispositivo segue para sanção do governador José Eliton (PSDB).
O responsável pela inclusão da emenda, líder do governo na casa, deputado Francisco Oliveira, não foi encontrado para comentar a medida e também a origem dos recursos que serão utilizados para cumprir o compromisso, caso a sanção seja concretizada. A matéria recebeu o aditivo ainda na Comissão Mista, após ser apresentada por desembargadores ao parlamentar governista, o que sugere, ao menos, a existência de um sinal favorável de Eliton em relação ao conteúdo.
Por outro lado, após a aprovação, Francisco revelou à comunicação da Alego a sua justificativa. “Eu acolhi o entendimento do Judiciário. Essa casa trabalha com muita transparência e tranquilidade. O projeto é do Judiciário, que tem interesse na formatação do seu quadro de trabalho. Eles têm um orçamento próprio, recurso próprio, é um outro Poder. E tudo foi feito com muita transparência, não tem nada de anormal (sic)”.
“Derrubada”
A apresentação emergencial do aditivo, todavia, pode ser encarada como uma nova tentativa de aprovar a medida sem que críticas fossem desferidas ao Legislativo. Não seria a primeira vez, já que a ideia inicial era aprovar a licença-prêmio durante o recesso parlamentar, em julho, quando o PL, que recebeu inúmeras críticas, foi retirado da Alego pelo próprio Judiciário.
Para o presidente do Sindicato dos Advogados do Estado de Goiás (Saeg), Alexandre Ramos Caiado, a intenção com o jabuti era clara. “É um dispositivo muito utilizado pela cúpula do Legislativo quando se pretende passar uma matéria que não seria bem vista pela sociedade ou ou bem aceita pela própria casa, pois acaba evitando o debate e causando a sua aprovação”.
A esperança, segundo ele, é de que a aprovação seja derrubada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o qual recebeu da Saeg, um procedimento de controle administrativo contra a proposta ainda em julho. “Não podemos admitir que, para que a magistratura tenha sua licença, a advocacia e a sociedade sejam prejudicadas. A licença foi anunciada juntamente com a reestruturação do Judiciário, que para isso reduzirá o horário de atendimento nos tribunais para meio-expediente. Não admitiremos de forma alguma, acreditamos que o procedimento no CNJ será eficaz”.
Apesar da declarada “transparência”, OAB – em nota – afirma ter recebido a notícia da inclusão e posterior aprovação do jabuti “com surpresa”. No entanto, a entidade reforça que aguarda publicação do PL para comentar o caso. O Mais Goiás também tentou, sem sucesso, contato com o Sindicato dos Servidores e Serventuários da Justiça do Estado de Goiás (SindJustiça).
“Equiparação de direitos”
Ao fazer coro com Francisco em favor discurso de transparência, o presidente da Alego, José Vitti, também do PSDB, é evasivo. “É um projeto do Judiciário. É uma prerrogativa da Lei Orgânica deles. Se houve acordo com o líder e com as bancadas e foi votado, se cumpriu o rito. Não podemos interferir. Cabe ao Executivo ter o veto ou não, mas acredito que não faltou transparência”.
Para ele, entretanto, “não há nada de esquisito” na inclusão da emenda. “Houve um acerto entre Executivo e Judiciário, respeitando a harmonia entre os poderes, e o líder [Francisco] apresentou o aditivo dentro do rito. Se é imoral ou não, quem tem que responder isso são os magistrados, o PL é deles”.
Ainda na visão de Vitti, o que ocorreu foi uma “equiparação de direitos”. “Servidores do Ministério Público têm [licença-prêmio] e os do Legislativo e Executivo também. Apenas o Judiciário que não. Está se fazendo uma equiparação de direitos, atendendo o princípio da isonomia”.
Conforme expôs o presidente à própria Alego, ainda, não há “nada de jabuti”, e quem discordar pode “procurar a Justiça”. “A casa tem sua autonomia e os deputados, suas prerrogativas. Se alguém se sentiu ofendido e acha que teve qualquer vício na tramitação do projeto, que procure a própria Justiça para resolver essas questões. Aqui não houve qualquer tipo de tratativa às escusas”.
“Desvios”
Também em defesa da aprovação, o deputado Paulo César Martins (MDB), disse que o recurso para arcar com as despesas provenientes da eventual sanção já existe. “, O pagamento retroativo da licença foi removido da proposta. Precisamos é mudar o tom: o recurso existe, não pode é Executivo desviar ele”, afirmou, em referência às dificuldades enfrentadas pelo estado no repasse de dinheiro às Organizações Sociais (OSs) da Saúde. “O dinheiro estava lá, mas foi desviado. Isso é uma vergonha”, completa.
Respostas
O Mais Goiás questionou o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) sobre a “imoralidade” da emenda, mas o foi informado de que “o Poder Judiciário não vai se manifestar até que o projeto seja sancionado pelo Executivo”. Defensora da proposta, a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego), que travou com os advogados uma disputa em defesa da licença, sublinhou preferir manter o silencio até a eventual sanção do projeto.
Reforma
Entre as adequações previstas com no PL estão mudança de nomenclatura de unidades, acréscimo de quatro comarcas, extinção de cargos efetivos para adequação orçamentária e financeira e criação de três cargos em comissão. O judiciário justifica que a medida consolida anexos de leis já vigentes, criando estruturas permanentes para Turmas Recursais de Juizados Especiais do Estado.