Confira íntegra do depoimento de Bolsonaro à Polícia Federal
Bolsonaro falou sobre suposta interferência política na PF
O presidente Jair Bolsonaro prestou depoimento à Polícia Federal (PF) na noite da última quarta-feira (3), em Brasília. Ele foi ouvido no inquérito que apura a sua suposta interferência política no órgão, cujo objetivo seria o de blindar familiares e políticos próximos.
Confira íntegra do depoimento de Bolsonaro à PF:
1 – Por quais motivos pediu ao ex-ministro Sérgio Moro para que fosse trocado o Diretor-Geral da PF, Maurício Valeixo?
RESPOSTA: Que confirma que em meados de 2019 solicitou ao ex-ministro Sergio Moro a troca do diretor-geral da Polícia Federal, Valeixo, em razão da falta de interlocução que havia entre o presidente da República e o diretor da Polícia Federal; Que não havia qualquer insatisfação ou falta de confiança com o trabalho realizado pelo DPF Valeixo, apenas uma falha de interlocução; Que sugeriu ao ex-ministro Sergio Moro a nomeação do DPF Ramagem para a Direção-Geral; Que indicou o DPF Ramagem em razão da sua competência e confiança construída ao longo do trabalho de segurança pessoal do declarante durante a campanha eleitoral de 2018; Que ao indicar o DPF Ramagem ao ex-ministro Sergio Moro, este teria concordado com o presidente desde que ocorresse após a indicação do ex-ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal; Que conheceu o DPF Ramagem após o 1° turno quando ele assumiu a coordenação da segurança do então candidato Jair Bolsonaro: Que salvo engano os filhos do declarante também conheceram Ramagem somente quando ele assumiu a segurança do declarante; Que nunca teve como intenção, com a alteração da Direção Geral, obter informações privilegiadas de investigações sigilosas ou de interferir no trabalho de Polícia Judiciária ou obtenção diretamente de relatórios produzidos pela Polícia Federal.
2— Na reunião de ministros do dia 22/04/2020, o presidente fez a seguinte declaração. O que quis dizer quando disse “eu tenho a PF que não me dá informações”?
RESPOSTA: Que o declarante quis dizer que não obtinha informações de forma ágil e eficiente dos órgãos do Poder Executivo, assim como da própria Polícia Federal; Que quando disse “informações” se referia a relatórios de inteligência sobre fatos que necessitava para a tomada de decisões e nunca informações sigilosas sobre investigações.
3 – Conforme o ex-ministro Sérgio Moro, a motivação para a troca do DG/PF seria porque o presidente “precisava de pessoas de sua confiança, para que pudesse interagir, telefonar e obter relatórios de inteligência”. Confirma tais motivações?
RESPOSTA: Que, pelo seu entendimento, necessitava da mudança da Direção Geral da Polícia Federal, como dito, para maior interação; Que nunca obteve, de forma direta, relatórios de inteligência produzidos pela Polícia Federal; Que perguntado se possui acesso ao SISBIN, coordenado pela Abin, disse que não; Que muitas informações relevantes para a sua gestão chegavam primeiro através da imprensa, quando deveriam chegar ao seu conhecimento por meio do Serviço de Inteligência.
4 – Nas mensagens contidas no celular do ex-ministro Sérgio Moro, consta, em 23/04/2020, uma reportagem do site “O Antagonista”, intitulada “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas”, encaminhada pelo presidente ao ex-ministro, seguida da mensagem “Mais um motivo para a troca”. Por que reforçou a necessidade da troca do DG/PF com a reportagem?
RESPOSTA: Que desconfiava que havia vazamento de informações sigilosas de investigações no âmbito da Polícia Federal para o site “O Antagonista”, revista “Crusoé” e outros meios de imprensa.
5 – A troca do DG/PF seria motivada, também, por uma eventual falta de empenho da PF na investigação sobre a tentativa de assassinato contra o presidente durante a campanha de 2018? Se reuniu com o delegado responsável pela investigação?
RESPOSTA: Que cobrou do ex-ministro Sergio Moro uma investigação mais célere e objetiva sobre o atentado que sofreu; Que não observou nenhum empenho do ex-ministro Sergio Moro em solucionar o assunto; Que houve uma apresentação do delegado responsável pela investigação do atentado com a presença do ex-ministro Sergio Moro; Que não fez nenhum tipo de pedido na direção da investigação ou qualquer outra interferência no andamento dos trabalhos.
6 – A troca do DG/PF seria motivada, também, por uma eventual falta de empenho da PF na investigação que visou esclarecer as declarações do porteiro do condomínio da residência do presidente, no Rio de Janeiro, o qual teria levantado falsas suspeitas do envolvimento do presidente no assassinato da vereadora Marielle Franco?
RESPOSTA: Que também cobrou do ex-ministro Sergio Moro um maior empenho na investigação sobre as declarações do porteiro do condomínio da sua residência no Rio de Janeiro; Que também não observou nenhum empenho ou preocupação do ex-ministro Sergio Moro em solucionar rapidamente o caso; Que soube pelo ex-ministro Sergio Moro que foi aberta uma investigação na Polícia Federal e que foi constatado um equívoco por parte do porteiro; Que também foi divulgado na impressa que o filho do declarante, Renan, teria namorado a filha do ex-policial militar acusado pelo assassinato da vereadora Marielle; Que posteriormente ficou esclarecido pelo próprio ex-ministro Sergio Moro que o ex-policial militar declarou que a sua filha nunca namorou o Renan, pois ela sempre morou nos Estados Unidos; Que esse esclarecimento veio à tona em razão dos insistentes pedidos do declarante para o ex-ministro Sergio Moro em solucionar rapidamente o caso; Que, portanto, não havia uma proatividade do ex-ministro Sergio Moro.
7 – Por quais motivos, em agosto de 2019, pediu ao ex-ministro Sérgio Moro para que fosse trocado o superintendente regional da PF no RJ? Sugeriu algum nome? Por quê? Qual o grau de amizade entre o presidente e o substituto? Havia a intenção de obter informações de investigações sigilosas presididas na SR/PF/RJ ou de interferência?
RESPOSTA: Que confirma que a partir de agosto de 2019 sugeriu ao ex-ministro Sergio Moro a troca do superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro; Que sugeriu a mudança porque o estado do Rio de Janeiro é muito complicado e entendia que necessitava de um dirigente da Polícia Federal local com maior liberdade de trabalho; Que não conheceu o então superintendente Ricardo Saadi; Que talvez o DPF Ricardo Saadi não tinha a completa independência para tomar as medidas necessárias para melhorar a gestão local; Que, no primeiro momento, não sugeriu nenhum nome ao ex-ministro Sergio Moro para assumir a Superintendência do Rio de Janeiro; Que posteriormente, em razão da resistência do ex-ministro Sergio Moro, sugeriu o nome de um delegado para a Superintendência do Rio de Janeiro; Que há uma vaga lembrança que esse nome seria o DPF Saraiva; Que não se lembra quem indicou o nome do DPF Saraiva ao declarante; Que no final de 2018 cogitou em indicar o DPF Saraiva como ministro do Meio Ambiente; Que não se lembra quem sugeriu o nome do DPF Saraiva; Que, da mesma forma, nunca buscou obter informações privilegiadas de investigações sigilosas em andamento na SR-PF-RJ ou de interferir, seja na gestão local ou em investigações em andamento.
8 – Conhecia o DPF Carlos Henrique Oliveira de Sousa, o qual sucedeu o DPF Ricardo Andrade Saadi como superintendente da SR/PF/RJ? Se reuniu com o DPF Carlos Henrique após a indicação para a gestão da SR/PF/RJ? Por quê? Qual o teor da conversa?
RESPOSTA: Que conheceu o DPF Carlos Henrique em uma reunião ocorrida no gabinete da Presidência quando ele foi indicado para assumir a Superintendência do Rio de Janeiro; Que o propósito dessa reunião foi para conhecê-lo melhor, ou seja, para que o novo superintendente de um dos estados mais importantes da federação fosse apresentado ao presidente da República.
9 – Em abril de 2020 houve uma nova troca com a exoneração do DPF Carlos Henrique como SR/PF/RJ. Foi o presidente que sugeriu essa nova mudança?
RESPOSTA: Que não sugeriu a nova mudança na Superintendência no Rio de Janeiro, ocorrida em abril de 2020.
10 – Soube, através do ex-ministro Gustavo Bebianno, de alguma investigação sigilosa em curso na SR/PF/RJ (Operação Furna da Onça) que teria como alvo Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro? Como soube?
RESPOSTA: Que não soube previamente nada sobre a operação Furna da Onça, antes da sua deflagração; Que todo assunto sobre essa operação, ficou sabendo através da impressa; Que conheceu Paulo Marinho através de Gustavo Bebianno; Que também nunca Paulo Marinho repassou ao declarante informações que ele (Paulo Marinho) teria recebido de um delegado de Polícia Federal da SR-PF-RJ sobre a Operação Furna da Onça.
11- Na reunião de ministros do dia 22/04/2020, o presidente fez a seguinte declaração quando disse “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui!”, se referia a troca do SR/PF/RJ?
RESPOSTA: Que há um pequeno núcleo do GSI sediado no Rio de Janeiro, responsável pela segurança do declarante e de sua família; Que esse núcleo do GSI é formado por servidores lotados e alguns comissionados; Que achava que esse trabalho poderia ser melhorado, principalmente no acompanhamento do seu filho Carlos Bolsonaro, residente no Rio de Janeiro; Que portanto quando disse que queria trocar gente no Rio de Janeiro referia-se a sua segurança pessoal e da sua família.
12 – Por quais motivos pediu, em março de 2020, ao ex-ministro Sérgio Moro para que fosse trocada a superintendente Regional da PF em PE? Sugeriu algum nome? Por que essa pessoa? Qual o grau de amizade entre o presidente e o substituto? Havia a intenção de obter informações de investigações sigilosas presididas na SR/PF/PE e/ou interferência nos trabalhos de polícia judiciária?
RESPOSTA: Que confirma que sugeriu ao ex-ministro Sergio Moro a mudança da superintendente da PF de Pernambuco; Que sugeriu essa mudança em razão da baixa produtividade local e pelo fato da então superintendente ter, anteriormente, assumido o cargo de secretária estadual de Pernambuco, o que não daria a isenção necessária nos trabalhos locais; Que jamais sugeriu a mudança da gestão local com o intuito de obter informações sigilosas de investigações ou de interferência de trabalhos de Polícia Judiciária.
13 – 0 que entende por “interferência política” na PF? Interferiu na PF?
RESPOSTA: Que entende como interferência política pedidos políticos e não técnicos, de gestores de órgãos públicos com a intenção de haver influência política sobre os trabalhos desenvolvidos pelo órgão; Que jamais teve qualquer intenção de interferência política na Polícia Federal quando sugeriu ao ex-ministro Sergio Moro a alteração na gestão da Direção Geral ou em Superintendências Regionais; Que quando convidou o ex-ministro Sergio Moro, assim para todos os demais ministros, para fazer parte de sua equipe, concordou em “dar carta branca” para que cada um montasse sua equipe e os órgão vinculados com os nomes que entendessem, com poder de veto do declarante; Que tanto foi assim que o ex-ministro Sergio Moro trouxe para o seu ministério os profissionais que ele teve contato em Curitiba-PR; Que em determinado momento percebeu que o ex-ministro Sergio Moro estava administrando a pasta sem pensar no todo, sem alinhamento com os demais ministérios e o gabinete da Presidência; Que, por fim, gostaria de acrescentar que sempre respeitou e respeita a autonomia da Polícia Federal e que entende que mesmo com a alteração de dirigentes de unidades da PF não é possível interferir nas investigações em razão do sistema penal brasileiro e na cultura organizacional enraizada na instituição.
Perguntado se gostaria de acrescentaria algo, disse negativamente;
Passada a palavra aos advogados-gerais da União, não fizeram questionamentos;
Registra-se que uma cópia deste termo foi entregue aos advogados da União.
Nada mais havendo, este Termo de Declarações foi lido e, achado conforme, assinado pelos presentes.