Prisão

Entenda as suspeitas sobre Flávio Bolsonaro e o ex-assessor Fabrício Queiroz

Uma das principais dores de cabeça do presidente Jair Bolsonaro desde a sua eleição, as…

Uma das principais dores de cabeça do presidente Jair Bolsonaro desde a sua eleição, as suspeitas contra seu filho Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o amigo e ex-policial militar Fabrício Queiroz ganharam um novo capítulo neste quinta-feira (18).

O policial militar aposentado Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio e amigo do presidente, foi preso em Atibaia, no interior de São Paulo, em uma operação conjunta da Polícia Civil e do Ministério Público de São Paulo.

A suspeita do Ministério Público é que Queiroz operava no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio um esquema de “rachadinha“, em que funcionários são coagidos a devolver parte de seus salários. O filho de Bolsonaro foi deputado estadual de fevereiro de 2003 a janeiro de 2019.

A Promotoria acredita ainda que Flávio lavou cerca de R$ 2,3 milhões obtidos no esquema por meio de uma loja de chocolates e de negociações de imóveis.

Veja a seguir perguntas e respostas para entender o caso.

Como começou a investigação?
Na Operação Furna da Onça, da Lava Jato do Rio, que abordava o pagamento de propina a deputados estaduais pelo ex-governador Sérgio Cabral. Relatório do Coaf, órgão de inteligência financeira, feito no âmbito dessa investigação mencionava movimentações financeiras atípicas dos assessores dos deputados estaduais, incluindo Fabrício Queiroz, ex-PM que até 2018 foi funcionário comissionado de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio.

Em janeiro de 2018, o MP-RJ recebeu dados dessa operação e abriu investigações. Flávio foi deputado estadual de 2003 a 2019.

Quais os indícios encontrados pela Promotoria?
A Promotoria realizou em dezembro operação que teve como alvo Flávio, Queiroz e outros ex-assessores do gabinete, por meio de mandados de busca e apreensão.

Segundo o MP-RJ, Flávio lavou até R$ 2,3 milhões com transações imobiliárias e sua loja de chocolates, mantida em um shopping no Rio. Para a Promotoria, a origem desses recursos é o esquema de “rachadinha” no antigo gabinete de Flávio, operado por Queiroz.

O que é “rachadinha”?
Nesse tipo de esquema, os funcionários dos gabinetes são coagidos a devolver parte de seus salários.

Quais crimes a Polícia Federal descartou?
A PF concluiu não haver indícios de que o senador tenha cometido os crimes de lavagem de dinheiro e de falsidade ideológica. A polícia investigava uma queixa-crime baseada na evolução patrimonial de Flávio e mirou negociações de imóveis pelo senador.

O resultado não coincide com os elementos encontrados pelo MP-RJ. Para a promotoria, Flávio lavou até R$ 2,3 milhões com transações imobiliárias em sua loja de chocolates, mantida em um shopping no Rio. A origem desses recursos seria o esquema de “rachadinha” no antigo gabinete de Flávio, operado por Queiroz.

A Polícia Federal tem apurações em aberto sobre Flávio?
Tinha, mas já foi concluída. A PF apurou suspeita de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral por Flávio Bolsonaro. A investigação tem como origem uma queixa-crime baseada na evolução patrimonial de Flávio e mirou negociações de imóveis pelo senador.

O que a investigação da PF concluiu?
A PF não encontrou irregularidades nas negociações de imóveis avaliadas. O MP-RJ, por outro lado, disse que há indícios de que Flávio usou transações imobiliárias para lavar dinheiro obtido com a “rachadinha”.

Quais são as suspeitas sobre Fabrício Queiroz?
Segundo relatório do Coaf, Fabrício Queiroz, que era policial militar e motorista do filho de Bolsonaro, movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017 —entraram em sua conta R$ 605 mil e saíram cerca de R$ 600 mil.

Além do valor, considerado incompatível com o patrimônio de Queiroz, chamaram a atenção dos investigadores o volume de saques (que chegaram a cinco num mesmo dia) e o fato de ele ter recebido repasses de oito funcionários do gabinete de Flávio.

Quais eram as origens e a destinação dos valores?
Chegaram à conta de Queiroz R$ 216 mil por meio de depósitos em dinheiro e R$ 160 mil em transferências vindas, em boa parte, de funcionários da Alerj.

Nathalia Queiroz, filha do policial militar e ex-assessora de Flávio na Alerj e de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados, depositou R$ 84 mil. O destino dos valores sacados também chamou a atenção do Coaf.

Quase metade do valor, R$ 324 mil, foi sacado de uma agência que fica na Assembleia do Rio. Em entrevista ao SBT, em dezembro, Queiroz atribuiu a movimentação a negócios particulares, como a compra e venda de automóveis.

Qual o elo da movimentação financeira com o presidente Jair Bolsonaro?
Entre as transações de Queiroz, está um cheque de R$ 24 mil para Michelle Bolsonaro, a atual primeira-dama. Em entrevistas após a divulgação do caso, Jair Bolsonaro disse que a primeira-dama recebeu o cheque porque o ex-assessor estava pagando parte de uma dívida de R$ 40 mil que tinha com ele.

Essa dívida não foi declarada no Imposto de Renda. O presidente afirmou ainda que os recursos foram para a conta de Michelle porque ele não tem “tempo de sair”.

Qual foi a movimentação total nas contas de Queiroz?
O relatório do Coaf que deu início ao caso abordava apenas um período entre 2016 e 2017. Reportagem do jornal O Globo, porém, afirma que, além dos R$ 1,2 milhão inicialmente revelados, passaram por sua conta corrente mais R$ 5,8 milhões nos dois exercícios anteriores, totalizando R$ 7 milhões.

Por que a movimentação financeira de Flávio Bolsonaro também veio a público?
Em meio à apuração do caso Queiroz, o Ministério Público do Rio solicitou ao Coaf novo relatório, desta vez sobre as contas de Flávio. A Promotoria pediu as informações em 14 de dezembro de 2018 e foi atendida no dia 17 —um dia antes de ele ter sido diplomado senador. O mandato de deputado estadual de Flávio terminou em 31 de janeiro e ele assumiu uma cadeira no Senado no dia seguinte.

O que foi revelado em relação a Flávio nesse relatório?
O Coaf apontou que o filho do presidente recebeu em sua conta bancária 48 depósitos, em dinheiro em junho e julho de 2017, sempre no valor de R$ 2.000, totalizando R$ 96 mil. De acordo com reportagem do Jornal Nacional sobre o caso, os depósitos foram feitos no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Alerj, e os remetentes não foram identificados.

O que disse o filho do presidente a respeito?
Em entrevistas, ele disse que recebeu dinheiro em espécie pela venda de um imóvel e que depositou R$ 2.000 por ser o limite no caixa eletrônico. O comprador do imóvel, o ex-atleta Fábio Guerra, confirmou que pagou em dinheiro vivo porque havia recebido em espécie valores da venda de um outro imóvel. A escritura da transação, porém, aponta uma divergência de datas e registra que o sinal foi pago meses antes.

Flávio nega ter praticado irregularidades e diz que é alvo de perseguição que visa atingir o governo de seu pai.

O que Queiroz fala sobre a movimentação?
Em entrevista ao SBT, em dezembro de 2018, Queiroz atribuiu a movimentação a negócios particulares, como a compra e venda de automóveis.

Em fevereiro de 2019, o ex-assessor adicionou outra explicação em petição ao Ministério Público. Afirmou que recolheu parte dos salários de funcionários do chefe para distribuir a outras pessoas para que trabalhassem pelo então deputado estadual, ainda que não formalmente empregadas.

O objetivo, segundo ele, era aumentar o número de assessores a fim de aproximar Flávio de sua base eleitoral. Na petição entregue à Promotoria, ele diz que o senador não tinha conhecimento da prática. Até o momento, contudo, Queiroz não informou quem eram os assessores informais do senador.

O que é o pagamento feito por Flávio de um título bancário de R$ 1 milhão?
Segundo a TV Globo, o Coaf, em seu relatório sobre as movimentações de Flávio Bolsonaro, identificou um pagamento de R$ 1.016.839 de um título bancário da Caixa Econômica, mas sem especificar a data e o favorecido. Em entrevista para a Record, o senador eleito afirmou que esse título se referia ao financiamento de um imóvel. Documentos registrados em cartório corroboram a versão do senador

Qual é o estágio atual dessa investigação?
A investigação foi retomada no início de dezembro de 2019 após o STF autorizar o uso de dados sigilosos repassados pelo Coaf. Liminar do ministro Dias Toffoli havia paralisado o procedimento sob o argumento de que as informações detalhadas podiam ferir regras constitucionais —tese derrotada no plenário.

Com a retomada, a Promotoria solicitou buscas e apreensões à Justiça para aprofundar as investigações.

Em abril, o Ministério Público já havia obtido a quebra de sigilo bancário e fiscal de 103 pessoas físicas e jurídicas, entre elas o próprio senador, Queiroz e outros ex-assessores. A investigação na parte criminal também chegou a ser paralisada em janeiro por ordem do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, após pedido da defesa de Flávio Bolsonaro.

A Promotoria sustentava que até agora investigava fatos, e não pessoas, e que o nome do filho do presidente não figurava formalmente como investigado no procedimento criminal. Ao fim do recesso do Judiciário, em 1º de fevereiro, o ministro Marco Aurélio Mello indeferiu o pedido —o que, na prática, manteve o caso no Rio de Janeiro.

A Promotoria no Rio também segue apurando o caso dele e de outros deputados na esfera cível (cujas punições são de perda de funções públicas ou ressarcimento de valores, entre outras)

O pacote anticrime sancionado por Bolsonaro pode ter consequências no caso Flávio?
Sim. O pacote criou a figura do “juiz de garantias”. Para criminalistas, isso pode limitar a atuação do juiz Flávio Itabaiana, responsável pelo caso e conhecido por ser “linha dura”. Isso porque, segundo a lei, ainda sem prazo para entrar em vigor, o magistrado irá atuar da fase de investigação até o recebimento da denúncia. A partir da ação penal, que inclui o interrogatório e o julgamento da causa, outro juiz assumirá o processo.

Quem teve o sigilo quebrado? 
Em maio, foram alvo da medida judicial 94 pessoas e 9 empresas. Eles se dividem em quatro núcleos:

  • Flávio Bolsonaro, sua mulher e sua empresa
  • Familiares e pessoas ligadas a Fabrício Queiroz
  • Demais ex-assessores de Flávio Bolsonaro
  • Pessoas que fizeram transações imobiliárias com o senador e suas empresas

A quebra de sigilo compreende que período? 
A quebra de sigilo vai de 1º de janeiro de 2007 a 17 de outubro de 2018. Esse é o período em que Fabrício Queiroz esteve lotado no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj.

Quais os sigilos quebrados? 
Bancário (acesso aos extratos integrais de todas as contas bancárias dos alvos) e fiscal (declarações anuais de Imposto de Renda do período e outras comunicações à Receita Federal, como venda de imóveis). Também foram enviadas ao MP-RJ notas fiscais em nome de Flávio, Queiroz e outros sete investigados.

Quais os possíveis crimes apontados pelo MP-RJ?
Peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.

Quem mais pode ser envolvido na operação?
São vários os potenciais alvos. Queiroz, que teve o sigilo quebrado, indicou para o gabinete do então deputado duas parentes de um ex-PM acusado de comandar uma das milícias mais violentas da cidade. As duas estão na lista dos afetados pela decisão judicial.

Flávio, por sua vez, usou suas assessoras na Alerj para tocar a própria campanha ao Senado e estruturar o PSL do Rio de Janeiro. Elas também tiveram o sigilo quebrado.

Ex-assessores de Flávio que foram alvo da decisão passaram pelos gabinetes de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados e de Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) na Câmara Municipal do Rio no período que compreende a quebra do sigilo.

O que é o Coaf?
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras é um órgão de inteligência que atua contra a lavagem de dinheiro e, mais recentemente, o financiamento ao terrorismo. No novo governo, migrou do antigo Ministério da Fazenda para o Ministério da Justiça e, depois, para o Banco Central.

O que é movimentação financeira atípica?
As instituições financeiras são obrigadas a informar ao órgão todas as operações consideradas suspeitas, como repasses ou saques fracionados.

Há dezenas de critérios para uma movimentação ser enquadrada nesse perfil, como transações de quantias significativas por meio de conta até então pouco movimentada ou mudança repentina e injustificada na forma de movimentação de recursos. Movimentação atípica, porém, só se torna crime se a origem do dinheiro for ilícita.

As informações relatadas pelo Coaf equivalem a quebra de sigilo bancário?
Não. Os relatórios produzidos pelo Coaf sobre movimentações suspeitas não equivale à quebra de sigilo, que envolve dados muito mais detalhados e só pode ser obtido mediante autorização judicial.

Em dezembro, o Supremo Tribunal Federal decidiu em que Coaf e Receita Federal podem compartilhar dados sigilosos com polícia e Ministério Público sem necessidade de aval da Justiça.

QUESTÕES AINDA SEM RESPOSTA NO CASO QUEIROZ

  • Quem eram os assessores informais que Queiroz afirma ter remunerado com o salário de outros funcionários do gabinete de Flávio?
  • Por que o único assessor que prestou depoimento ao Ministério Público do Rio de Janeiro não confirmou esta versão de Queiroz?
  • Como Flávio desconhecia as atividades de um dos seus principais assessores por dez anos?
  • Por qual motivo Jair Bolsonaro emprestou dinheiro a alguém que costumava movimentar centenas de milhares de reais?
  • De que forma foi feito esse empréstimo pelo presidente e onde está o comprovante da transação?
  • Onde estão os comprovantes da venda e compra de carros alegadas por Queiroz?
  • Por que há divergência entre as datas do sinal descrita na escritura de permuta de imóveis com o atleta Fábio Guerra e as de depósito em espécie fracionado na conta de Flávio?

INCONSISTÊNCIAS NO PEDIDO DO MP-RJ

Pessoas não nomeadas por Flávio Bolsonaro – Há três casos de pessoas sem vínculo político com Flávio que foram alvo de quebra de sigilo. Elas estavam nomeadas no gabinete do político na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro quando o senador assumiu o cargo e, em seguida, as demitiu

Remuneração de Queiroz - Ao comparar gastos com vencimentos de Fabrício Queiroz, o Ministério Público considera apenas salário da Assembleia e ignora remuneração que ele recebe da Polícia Militar

Saques – Há erro na indicação do volume de saques feitos por Queiroz em dois dos três períodos apontados

Laranja potencial - Promotoria atribui ao gabinete de Flávio servidora da TV Alerj que acumulava cargo com outro emprego externo

Patrimônio – Ao falar sobre um negócio que envolve 12 salas comerciais, os promotores do Ministério Público do Rio escreveram que Flávio adquiriu os imóveis por mais de R$ 2,6 milhões, quando, na verdade, ele deteve apenas os direitos sobre os imóveis, que ainda não estavam quitados e continuaram sendo pagos em prestações por outra empresa que assumiu a dívida