Entidades criticam participação de Bolsonaro em ato pró-ditadura; goianos comentam
Ainda que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenha defendido a democracia em entrevista nesta segunda-feira…
Ainda que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenha defendido a democracia em entrevista nesta segunda-feira (20), a participação dele em uma manifestação que pedia o fechamento do Congresso e o retorno do Ato Institucional nº5 continua a gerar preocupação. A goiana Maria José Braga, presidente da Federação Nacional dos Jornalista (Fenaj), afirma que Bolsonaro não está à altura do cargo e espera que as demais autoridades democráticas coloquem freio nesta postura.
O Sindicato dos Docentes das Universidades Federais de Goiás (Adufg-Sindicato) manifestou repúdio por meio de nota: “É inadmissível que um chefe de Estado participe de uma manifestação que, dentre outros propósitos absurdos, peça a intervenção das forças militares contra os demais poderes da República”.
Para Adufg, “Bolsonaro mostrou, mais uma vez, que não respeita a democracia e a Constituição Federal. Também comprovou, assim como em outras ocasiões, que não está à altura do cargo que ocupa”.
No domingo, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) já tinha se manifestado. “São inadmissíveis as iniciativas e os atos de apoio à ruptura democrática, à intervenção militar e os atos institucionais que atentem contra as liberdades. Atos que contrariem o Estado Democrático devem ser reprimidos conforme os rigores da Lei e com a responsabilização de todos os envolvidos”, disse a OAB.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), que foi criticado por Bolsonaro e atacado pelos manifestantes (com gritos de “Fora Maia”), disse no Twitter: “O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo. É mais trabalhoso, mas venceremos. Em nome da Câmara dos Deputados, repudio todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição.”
Quem também se posicionou, foi a Frente Nacional de Prefeitos. “O presidente da República, Jair Bolsonaro, em mais um despropósito, participou de manifestação que bradava pelo fechamento do Congresso Nacional”, disse em nota divulgada nesta segunda. “É lastimável que em meio a milhares de velórios trágicos e rápidos, o iminente colapso do sistema de saúde e a incerteza diante da pandemia que apavora, o Brasil siga esse torpe caminho, siga nessa encruzilhada.”
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, chegou a escrever no Twitter que é “assustador ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Defender a Constituição e as instituições democráticas faz parte do meu papel e do meu dever”.
Outro discurso
Nesta segunda-feira, enquanto falava com jornalistas, Bolsonaro voltou a criticar a imprensa, que noticiou sua participação na manifestação de domingo. “Estado de S. Paulo e Folha de S.Paulo, a mesma manchete. Combinados. ‘Não queremos negociar’, vírgula, e depois não fala nada do que eu falei? Tentando levar a opinião pública para o lado de que eu quero o retrocesso? O pessoal geralmente conspira para chegar ao poder. Eu já estou no poder. Eu já sou o presidente da República”, declarou.
Antes disso, ele ainda reafirmou que não falou nada contra qualquer poder. “Muito pelo contrário. Queremos voltar ao trabalho, o povo quer isso. Estavam lá saudando o Exército brasileiro. É isso, mais nada. Fora isso é invencionice, tentativa de incendiar a nação que ainda está dentro da normalidade”, justificou.
Vale citar que, em meio a muitas tosses, o presidente discursou para o público no domingo, em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília. Sob gritos de “Mito”, “AI-5”, “Fora Maia”, ele disse: “Vocês estão aqui porque acreditam no Brasil. Nós não queremos negociar nada. Nós queremos é ação pelo Brasil. O que tinha de velho ficou para trás. Temos um novo Brasil pela frente. Todos, sem exceção, tem que ser patriotas. Acabou a patifaria.”
Ataques
A presidente da Fenaj, Maria José Braga afirma que, no domingo, foram registrados agressões a jornalistas no Ceará, Distrito Federal e Rio Grande do Sul, durante as manifestações. Na ocasião, a Fenaj emitiu notas de repúdio, ao mesmo tempo em que condenava as manifestações contra a democracia brasileira e a volta da ditadura militar. “O que demonstra, notadamente, desconhecimento da história.”
Para ela, o presidente, ao participar deste tipo de evento, reiteradamente mostra que não está a altura do cargo. “Age como não deve agir um chefe de Estado. No momento, em que o mundo todo está assustado e os chefes de Estado pedem que os cidadãos tomem todas às medidas sanitárias e sociais para evitar a propagação do coronavírus, o presidente faz exatamente o contrário”, lamenta. “Contraria todas as autoridades sanitárias do mundo, inclusive do seu próprio ministério.”
Sobre os ataques e críticas aos jornalistas feitos na entrevista desta segunda-feira, ela afirma que o método de Bolsonaro é o mesmo. “Ele dá declarações absurdas, demonstrando desprezo pela democracia e, após a repercussão negativa volta atrás e ataca alguém. Normalmente a imprensa. Como se fosse a responsável por suas palavras que de fato causam a repercussão.”
Maria José afirma, ainda, que a entidade se preocupa imensamente com seus profissionais, apesar das atitudes do gestor não mais causarem espanto. “A Fenaj, mesmo antes da eleição, já chamava a atenção do então candidato que, em várias ocasiões, fez discursos antidemocráticos com apologia à violência, o que repetiu nesses cerca de 1 ano e quatro meses de governo. Então, pedimos que a sociedade repudie esse comportamento e que as demais autoridades cumpram o seu papel e coloquem um freio”, conclui.
AI-5
Destaca-se que o AI-5 foi um ato institucional instaurado na ditadura militar (1964-1985), que enrijecia o regime e retirava uma série de direitos dos cidadãos.
O quinto ato institucional, decretado em 1968 pelo governo militar (durante a ditadura militar), autorizava, por exemplo, ao presidente da República, sem apreciação judicial, a decretar o recesso do Congresso Nacional; intervir nos estados e municípios; cassar mandatos parlamentares; suspender, por dez anos, os direitos políticos de qualquer cidadão; etc. Ele foi emitido em 13 de dezembro daquele ano pelo presidente Costa e Silva.